Mpox. Novo desafio levanta "fantasmas" da Covid a subúrbios de Maputo
Na memória de Virgínia o impacto da Covid-19 ainda está vivo e, hoje, quando um novo desafio de saúde "desconhecido" ameaça África, o medo volta à cabeça de quem depende da rua para sobreviver nos subúrbios de Maputo.
© Lusa
Mundo mpox
"Tenho medo [do mpox], mas nós dependemos da rua. Estamos aqui. O que podemos fazer", questiona à Lusa Virgínia Tsucane, comerciante informal de 56 anos, sentada a poucos metros da Praça dos Combatentes, às portas do famoso mercado de Xiquelene, nos subúrbios da capital moçambicana, Maputo.
Virgínia Tsucane pouco sabe sobre a nova estirpe de mpox que levou a Organização Mundial da Saúde a declarar emergência de saúde pública de interesse internacional e cujo epicentro é a República Democrática do Congo (RDCongo), situada, como Moçambique, na África Austral.
"Nem sei se tem ou não cura", acrescenta a comerciante, poucos minutos antes de atender mais um cliente na sua banca improvisada para a venda de refrigerantes e amendoim no centro da azáfama de Xiquelene.
Embora sem casos positivos em Moçambique, em Maputo, o receio de um eventual surto cresce com as notícias sobre a propagação da doença, que já atingiu mais de dez países do continente, incluindo a África do Sul, a importante potência regional que faz fronteira com Moçambique.
O principal receio dos milhares de moçambicanos que, como Virgínia Tsucane dependem da rua para sobreviver, é um surto à escala da Covid-19, embora especialistas reiterem que o mpox não é a próxima pandemia.
"É preciso clarificar uma coisa, o mpox não é o próximo Covid-19", assegurava, em 04 de agosto, a diretora do Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças, Pamela Rendi-Wagner.
A 13 mil quilómetros de Bruxelas, nos subúrbios de Maputo, Virgínia Tsucane pouco sabe sobre isso. A única certeza que a comerciante, mãe de sete filhos, tem é a de que ficar em casa não é opção.
Como Virgínia Tsucane, Suares Albano, um cobrador de um furgão de transporte de passageiros de 31 anos, admite desconhecer detalhes sobre a doença, mas sabe que, em caso de um surto, terá de enfrentar o risco, estando na rua.
"Medo temos, mas o que mais podemos fazer? Teremos de circular e trabalhar (...). Comemos devido ao trabalho e sem trabalho nada vai andar", explica à Lusa o jovem cobrador, pendurado na porta do furgão, enquanto tenta convencer mais um passageiro no meio da agitação típica das manhãs de Xiquelene.
Para Vitorino Posse, um pintor de 56 anos, Moçambique não está preparado para um surto, mas, caso ocorra, as autoridades de saúde devem "arranjar uma maneira de proteger o povo".
"Nós não estamos preparados para esta doença (...). Não dá para se defender de um surto, mas, se chegar, é preciso arranjar uma maneira de defender o povo", frisou.
A solução é antecipar-se ao problema, defende à Lusa Francisco Elias, um vendedor de material de construção no mercado de Xiquelene. "O melhor é pedir as vacinas agora para todos nós", declarou.
São apelos que não foram ignorados pelas autoridades de saúde durante a definição do plano de resposta, mas, para já, o país não é elegível, já que a condição para obtenção das poucas vacinas que circulam no mundo é ter casos confirmados.
A monkeypox (mpox) é uma doença viral que se propaga dos animais para os seres humanos, mas que também pode ser transmitida entre seres humanos através do contacto físico, provocando febre, dores musculares e lesões cutâneas.
Até finais de agosto, mais de 22.800 casos tinham sido registados desde janeiro em 13 países africanos, incluindo a África do Sul, país vizinho de Moçambique.
Enquanto as vacinas não chegam, nos subúrbios de Maputo, entre as milhares de pessoas que dependem da rua para sobreviver, o medo continua um sentimento comum, alimentado, sobretudo, pelas imagens que circulam nos 'media' de pessoas com sintomas.
"Eu vi isso na televisão, é assustador o que doença faz com o corpo das pessoas. Mas, como foi durante a Covid-19, nós precisamos da rua para comer", conclui Virgínia Tsucane.
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