Médicos divergem sobre lesões no jovem português morto em Macau
Os médicos legistas responsáveis pelas duas autópsias realizadas a Luís Amorim, o jovem encontrado morto em Macau em 2007, ouvidos hoje em tribunal, têm leituras opostas sobre as lesões encontradas no corpo e a causa da morte.
© Lusa
Mundo Autópsia
Na terceira sessão do julgamento da ação interposta pelos pais contra o Governo de Macau por negligência na investigação da morte do seu filho, foram ouvidos Duarte Nuno Vieira, que à data era presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal, e os dois médicos legistas responsáveis pela autópsia do menor.
Luís Amorim tinha 17 anos quando foi encontrado, a 30 de setembro de 2007, debaixo da ponte Nobre de Carvalho, aparentemente sem vida. A polícia concluiu que se tratou de um suicídio, uma tese que a família rejeitou desde o início, tendo requisitado, em 2010, uma nova autópsia em Portugal, obrigando a uma exumação do corpo.
Os testemunhos dos médicos legistas foram essencialmente contraditórios: Duarte Nuno Vieira considera que não há qualquer lesão compatível com nenhum tipo de queda em altura e que os ferimentos indicam agressões com objetos contundentes; por seu lado, os dois médicos de Macau são taxativos ao afirmar que as lesões indicam queda e afastam cenários de agressão.
Na sessão foram exibidas várias fotografias do corpo do jovem onde eram visíveis diversas lesões, nomeadamente na testa, lábios, queixo, pescoço, braço, e perna. Algumas fotografias davam ainda a conhecer lesões internas, como ao fígado e rins.
"Este é o padrão de lesões de defesa, de um indivíduo que vai ser agredido e protege-se", disse o antigo presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal, dando o exemplo de um ferimento na perna, onde diz terem sido encontradas fibras das calças "viradas para dentro".
Para os médicos O Heng Wa e Wong Wai Kit, a lesão no braço foi causada de dentro para fora, por perfuração do osso que partiu ao embater no chão, e a da perna poderá ter sido causada por um embate com uma pedra no chão.
O especialista português foi perentório ao afirmar que "o quadro lesional na roupa, no corpo e nos ossos é muito mais compatível com agressões do que com queda", já que não se verificam as fraturas habituais nos vários cenários possíveis de queda. Além disso, acrescentou, os olhos, que ficariam protegidos num eventual embate, apresentavam sinais de terem sido alvo de murros.
Duarte Nuno Vieira salientou o que considera insuficiências no relatório de autópsia, incluindo a ausência de referência a algumas lesões (visíveis nas fotografias) ou de explicações deficientes e apontou, em particular, uma incongruência quanto à causa de morte.
O relatório aponta para a rutura da aorta como motivo principal, o que o especialista português questiona, já que também se verificou um edema cerebral significativo - o cérebro pesava 300 gramas mais do que o normal. Segundo Duarte Nuno Vieira, uma rutura da aorta provocaria uma morte imediata e encheria a caixa torácica de sangue, o que diz não se ter verificado. Tendo em conta que a formação de um edema implica "algum tempo de vida", a rutura só poderia ter acontecido após a formação do edema.
Para o médico, o edema foi resultado de traumatismos no crânio e, sendo que uma rutura na aorta pressupõe habitualmente um embate, este só podia ter acontecido após uma agressão, defendeu.
O especialista sugeriu, assim, a possibilidade de o jovem ter sido agredido e depois disso atirado de um veículo em movimento.
Já O Heng Wa, autor da autópsia de Macau, considerou que as lesões na face, que a deixaram "completamente achatada", eram demonstrativas de um embate frontal. "Não consigo ver feridas de agressões. Era muito difícil infligir uma lesão deste tamanho, é mais compatível com queda", disse.
Wong Wai Kit, responsável pela certidão de óbito, afirmou que a sua "conclusão última foi de suicídio", baseando-se nas informações da Judiciária e da autópsia. "Aquilo que vi não foi causado por um objeto contundente, ele não foi alvo de um ataque", defendeu.
Por fim, foi ouvida a médica que assistiu o jovem no hospital, Wong U Peng, que confirmou que o jovem não apresentava pulso ou respiração ao chegar mas que, ainda assim, foi submetido a reanimação.
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