"Se for líder no CDS não apoiarei a recandidatura de Marcelo"
O candidato à liderança do CDS Abel Matos Santos é o entrevistado de hoje do Vozes ao Minuto.
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Política Abel Matos Santos
Abel Matos Santos, um dos cinco candidatos à liderança do CDS e porta-voz da corrente interna do partido Tendência Esperança em Movimento (TEM), quer tornar o CDS "a grande casa da direita" e "a partir daí reconquistar o centro".
Em entrevista ao Notícias ao Minuto, o psicólogo clínico e sexologista garante que se o partido não regressar aos seus valores tradicionais e reafirmar a sua identidade conservadora corre o risco de "desaparecer" ou de se tornar "irrelevante". "Este é o congresso do tudo ou nada", sublinhou.
Para que o "partido renasça", o conselheiro nacional considera que o próximo líder deve ser um "presidente a tempo inteiro" que, longe do Parlamento, logo após o 28.º congresso nacional - marcado para 25 e 26 de janeiro, em Aveiro - comece a trabalhar para as eleições autárquicas, percorrendo o país de Norte a Sul a "recuperar a militância" e a "valorizar as bases do partido".
O combate à pobreza, à desertificação do Interior, ao aborto, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, à eutanásia ou ao ensino da ideologia de género, são algumas das “principais linhas de ação” defendidas na moção 'Portugal TEM Esperança'.
Crítico da trajetória desenhada por Assunção Cristas e da candidatura de João Almeida "que não acrescenta uma vírgula ao partido", ao Notícias ao Minuto, o candidato natural de Coruche adianta ainda que se for eleito presidente do CDS estaria disponível para "dialogar com todos" e admitiria alianças com o Chega, com o PSD e acordos com o PS. Já um entendimento com o Iniciativa Liberal seria mais difícil "porque não é um partido que defenda, nem de perto nem de longe, os valores do CDS".
Sobre o mandato presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa, Abel Matos Santos considera que ficou "muito aquém" e que o Presidente da República "não defendeu aquilo que são os valores do CDS e deu um apoio muito evidente à esquerda".
Neste momento, considero que o partido precisa de um presidente que não esteja no Parlamento. Precisamos de um líder que esteja todos os dias no terreno, a viajar pelo país para recuperar a militânciaConsidera que o facto de não ter exercido nenhum cargo parlamentar prejudica a sua candidatura em comparação com outras?
Não, pelo contrário. Neste momento, considero que o partido precisa de um presidente que não esteja no Parlamento. Considerando que, atualmente, o CDS não tem malha autárquica, não tem rede de militância e que está praticamente destruído, precisamos de um líder que esteja todos os dias no terreno, a viajar pelo país para recuperar a militância. Entendo que o partido deve ser feito debaixo para cima e não ao contrário. Portanto, se o presidente estiver em São Bento não faz nem uma coisa nem outra bem.
A reconstrução do CDS irá merecer uma atenção indivisa de quem estiver à frente do partido. Ou seja, considero até ser uma vantagem que o próximo presidente não seja deputado, tal como, também penso ser essencial que haja uma relação de lealdade total entre o grupo parlamentar e a liderança que vier a ganhar em Aveiro. Por outro lado, no que diz respeito à minha candidatura, penso que a minha experiência de vida e profissional são pontos a favor.
Porquê?
Porque sou um português igual aos outros. Não sou político, mas tenho experiência de vida. Há outros candidatos que só têm experiência política, que estão a trabalhar no partido desde que entraram para a Juventude Popular. Não é melhor nem pior, é diferente. Mas acho que é importante que o próximo presidente tenha consciência dos problemas do dia a dia das pessoas, que seja um líder a tempo inteiro. Por isso, defendo que a minha experiência de vida e profissional é uma vantagem em relação a quem não a tem e viveu sempre, de algum modo, num ambiente protegido, numa bolha. O partido precisa de alguém com uma ligação muito forte à realidade das pessoas.
Para mim, este é o congresso do tudo ou nada, é o congresso no qual corremos o risco de que o partido desapareça ou que, pelo o contrário, renasçaNa sua opinião, a existência de cinco candidatos à liderança do CDS é um sinal de vitalidade ou de divisão no partido?
Acho que é um sinal de vitalidade. Mas também denoto que, na realidade, só existem duas visões para o futuro do partido, neste momento, e que vamos escolher uma neste congresso. Não nos podemos enganar, este congresso é decisivo. Para mim, este é o congresso do tudo ou nada, é o congresso no qual corremos o risco de que o partido desapareça ou que, pelo o contrário, renasça. É com esta responsabilidade e dimensão que encaro Aveiro.
Nos últimos tempos, o CDS parece que pede permissão para falar, tornou-se numa espécie de direita autorizada pela esquerda e conformou-se com esse lugar, perdendo a sua identidade e as suas bandeirasFoi esse sentido de responsabilidade que o levou a avançar momentos após Assunção Cristas ter anunciado a sua saída da liderança do partido, no final da noite eleitoral das eleições legislativas?
Fui o primeiro a avançar e estranhei quem só avançou muito depois. Estiveram durante algum tempo encolhidos, afirmando estar a refletir e a pensar sobre se se candidatavam à liderança. O que é que havia para refletir? Quem tem algum contributo para dar ao partido deve avançar. No congresso vamos ter de escolher entre a continuidade - que espelha, em particular, a candidatura de João Almeida - ou então uma nova forma de fazer política, com novos protagonistas que não têm vergonha de dizer que são de direita. Ou seja, aquilo que a esquerda fez, nos últimos 20 anos, em Portugal, e que nós deixámos de fazer. Nos últimos tempos, o CDS parece que pede permissão para falar, tornou-se numa espécie de direita autorizada pela esquerda e conformou-se com esse lugar, perdendo a sua identidade e as suas bandeiras. É para acabar com este CDS que me proponho, é com essa responsabilidade que quero levar o partido a defender de novo as suas causas e valores.
Portanto, considera que a candidatura de João Almeida levaria o partido à extinção?
Quando leio a moção de João Almeida fico absolutamente aterrado porque é mais do mesmo, é um caminho que não muda nem uma vírgula o que foi traçado até agora. O partido tem de perceber que os portugueses não darão nem mais um voto ao CDS se este se mantiver neste caminho. Quem quer uma candidatura de continuidade até pode ganhar no congresso mas não conseguirá mais de 4% nas urnas. Aliás, considero que obterá até menos porque, hoje, há outros partidos à direita e, portanto, é essencial que o CDS recupere e se refunde naquilo que são os seus valores doutrinários, não descurando o mundo rural, combatendo a pobreza, defendendo a vida e afirmando a sua vertente conservadora. Isto é fundamental para que o partido volte a ter interesse para os eleitores e para os portugueses.
Surpreendeu-o que alguns nomes de peso do partido não tenham avançado com uma candidatura?
Entendo que certas figuras do partido não tenham avançado. De qualquer forma, tenho pena. Bem sei que o CDS se encontra numa situação complicada, que está falido, que tem dívidas acima de um milhão de euros e que não tem deputados. Mas não podemos ser só de um partido quando este está em boas condições ou quando é vencedor. De facto, tenho pena que pessoas que podiam dar um contributo ao partido, tenham entendido não o fazer. Contudo, não quero também fazer juízos de valor sobre o que leva as pessoas a estarem mais dentro ou mais fora do partido. Há circunstâncias externas que as podem condicionar a avançar e seria injusto estar a julgá-las prematuramente.
Somos contra o aborto, contra a eutanásia, contra o Acordo Ortográfico e somos a favor de medidas que proporcionem mais segurança às pessoas, que promovam uma Europa de Estado ao invés de uma Europa FederalNão é o único candidato que defende que o partido deve assumir-se de direita. O que distingue a sua ideia de outras moções?
Por um lado, a coerência. O que apresento na minha candidatura são ideias que sempre defendi ou que tenho vindo a desenvolver nos últimos quatro anos. Já divulguei no passado, por diversas vezes, estas minhas convicções tanto dentro do partido, como na imprensa ou em artigos de opinião. Ou seja, o que acredito e defendo não é uma novidade para ninguém e é por isso que a minha candidatura mostra, desde já, coerência. Depois, a moção 'Portugal TEM Esperança' é também muito clara sobre os valores e propostas que sustenta. Não há equívocos, dúvidas ou ambiguidades. Somos contra o aborto, contra a eutanásia, contra o Acordo Ortográfico e somos a favor de medidas que proporcionem mais segurança às pessoas, que promovam uma Europa de Estado ao invés de uma Europa Federal, por exemplo. E é isso que diferencia a minha candidatura das que são mais do mesmo.
Considera-se o candidato mais à direita?
Acho que temos de reposicionar o CDS nas linhas da direita. A direita não é um papão. Temos de perceber de uma vez por todas o que é que é a direita em Portugal. Os valores da direita e do humanismo personalista são infinitamente melhores do que os valores da esquerda e do chevismo. Aliás, basta olhar para os regimes socialistas no mundo e ver o resultado que deram. Mas, respondendo à pergunta, acho que há candidatos que são mais ao centro do que eu - o que é legítimo e, aliás, está no próprio nome do partido [Centro Democrático Social] - mas, claramente, a minha candidatura quer colocar o CDS à direita e a partir daí reconquistar o centro. Tenho a certeza de que quem não se candidata a uma mudança, não concorda comigo, que quer posicionar o partido ao centro e torná-lo absolutamente desinteressante e sem nenhum 'sex appeal' para os eleitores.
Por falar no nome do partido, Filipe Lobo D'Ávila propõe deixar cair a sigla 'PP'. Como avalia esta proposta?
Acho que é irrelevante. Se é CDS-PP ou só CDS não é importante. O traje conta muito pouco. O que tem interesse é o interior, o sumo, o conteúdo, que é a parte que quero mudar. Preocupa-me mais a qualidade do partido do que a sua aparência.
Não temos dinheiro para alas pediátricas, mas temos para fazer festas da Web SummitLogo no início da sua moção explica que a principal razão da sua candidatura se deve ao facto de ser “mesmo preciso defender os valores e afirmar a identidade” do CDS. Que valores e que características identitárias se perderam?
Primeiro, considero que o combate à pobreza - que é uma oito linhas de ação da minha moção - é uma das causas que não temos priorizado e que está no ADN do CDS. Depois, o combate à desertificação do interior foi outra causa abandonada pelo partido. É preciso inverter certas tendências, temos de ter políticas para dar resposta a este problema e o Estado tem de ter uma ação muito ativa nesse sentido, designadamente, na construção das estruturas básicas, como os centros de saúde, tribunais, escolas, para as pessoas tenham o mínimo de condições. Depois temos a questão da Justiça e da corrupção. É muito importante que o CDS não largue estas matérias e que contribua para uma melhoria destas áreas.
A modernização do país a nível digital e o combate à má gestão dos recursos públicos, que é notória, são outras duas bandeiras que defendo e que têm escapado ao partido. Não temos dinheiro para alas pediátricas, mas temos para fazer festas da Web Summit. Os impostos excessivos, a má qualidade da rede escolar pública e o caos estabelecido no Serviço Nacional de Saúde, são outras frentes em que o CDS tem de dar um passo em frente.
Depois, considero, ao contrário da maioria dos meus adversários, que temos de combater o aborto de uma forma clara, fazer com que o Estado invista para que haja informação e responsabilização, para que as mulheres não tenham necessidade de abortar. Se as mulheres tiveram condições, perante uma gravidez indesejada podem escolher não recorrer ao aborto. O Estado tem de investir nisto, porque temos mais pessoas a morrer do que a nascer e, portanto, temos de apostar na vida. Temos de lutar por um Estado que cuide e que não mate. Depois, sobre a ideologia de género, o CDS não pode deixar que a escola passe a educar em vez de ensinar. Os valores sociais e morais devem ser veiculados pelas famílias aos seus filhos e não pela escola, que deve ser um centro de excelência de ensino e não um lugar de formatação de consciências.
A sua candidatura é a que traz de volta ao CDS o debate de mais causas fraturantes, que o partido já tinha arrumado e o seu eleitorado aceitado...
Não estão nada fechadas! Isto, não são causas fraturantes, são causas essenciais e trago-as novamente para a discussão política e pública por uma razão muito simples: Estas questões prendem-se com o modelo de sociedade que nós defendemos e o CDS tem de ter uma ideia clara do que quer. Eu defendo um modelo de sociedade positivo, saudável, no qual se defende a vida em vez da morte, no qual se protege a família como base da sociedade e não como algo a destruir.
As minhas visões sobre a questão do aborto, do casamento entre as pessoas do mesmo sexo, da adopção por pessoas homossexuais, não são um ataque contra ninguém. Por exemplo, na minha moção proponho devolver à união de facto a sua verdadeira razão de ser ou acabar com o divórcio unilateral, que não salvaguarda a parte mais vulnerável. Estas não são propostas para acabar com os divórcios nem com as relações entre pessoas do mesmo sexo. Estas medidas têm como objetivo criar uma sociedade devidamente organizada. Não posso enfiar a cabeça na areia e fazer de conta que não há problemas. A lei do aborto retira milhares de vidas por ano ao país e causa dramas terríveis nas pessoas. Nós estamos a falar de ajudar mulheres e de salvar crianças.
Contudo, em relação ao aborto, a sua moção propõe "revogar a admissibilidade da interrupção voluntária da gravidez fundada em mera vontade da gestante, exigindo-se sempre a existência de uma justa causa para o efeito"...
Não quero revogar a lei, quero melhorar as condições. Não estamos a falar de penalizar ou de criminalizar, estamos a falar de criar condições para que uma mulher, se engravidar de forma indesejada possa ter outras opções além do aborto. É só disto que estamos a falar. Eu trabalho na área da Saúde e vejo o que é que acontece às jovens que chegam ao hospital para abortar e a forma como são tratadas. Não concordo que os opositores de consciência sejam afastados destas pessoas, não vejo o tempo de reflexão a ser cumprido e deparo-me com mulheres a recorrerem ao aborto para receber o subsídio social de maternidade. É inaceitável, e até é uma ofensa para as mulheres que querem ter filhos e não conseguem. Ou seja, tem de se apostar na responsabilização e na informação. E depois, o Estado tem de dar condições para as pessoas que engravidam sem querer. Podem-me dizer que as mulheres são donas dos seus corpos e que fazem o que quiserem - não podemos contrariar isso, as pessoas farão sempre o que entenderem - mas, então, e a criança não tem direitos? Afastando-me de questões mais filosóficas, podemos caminhar, pelo menos, pelo bom senso e assumir que o Estado não faz tudo o que podia ser feito para que mulheres evitem abortar.
Não quero castigar ninguém, porque não há castigo maior para uma mulher que abortar, mesmo para aquelas que o fazem de livre vontade. Ninguém gosta de abortar. Temos de dar condições. Por um lado, para que as pessoas não engravidem se não quiserem e, por outro, se isso acontecer, para que possam ter a criança ou dá-la para adoção. Penso que é uma proposta pacífica que tem a ver com aquilo que é a matriz do CDS.
A vida não se referenda. Não podemos eliminar uma pessoa porque esta está doente, a pesar à família e a custar dinheiro ao Estado e aos contribuintesHá algum ponto em que difere da proposta de João Almeida sobre o combate à eutanásia?
Nesta matéria estamos totalmente de acordo e sintonizados. Somos do mesmo partido e há causas que nos separam e outras que nos unem. Esta é uma delas. Sobre esta questão, para já, concordamos que a eutanásia é inconstitucional. Depois, sou contra o referendo porque acho que a vida não se referenda. Percebo quem defenda que um referendo, num Parlamento que está tomado pela esquerda, possa ser a forma de evitar a legalização da eutanásia. Mas, também considero que a esquerda não irá ficar no comando do hemiciclo para sempre e que a direita irá voltar em peso a São Bento. Portanto, entendo que uma lei que seja aprovada em Assembleia da República deve ser revertida e é mais fácil rever uma lei aprovada no Parlamento do que a que é aprovada por referendo. É de recordar que a Constituição diz que a vida humana é inviolável e, por isso, também acho que para aprovarem a eutanásia terão de alterar a Constituição.
Não podemos eliminar uma pessoa porque esta está doente, a pesar à família e a custar dinheiro ao Estado e aos contribuintes. Não pode ser, até porque, hoje em dia, a medicina moderna permite aliviar o sofrimento e dar qualidade de vida às pessoas. Resumindo, temos duas opções: Ou descartamos as pessoas ou cuidamos delas e um partido como o CDS tem a obrigação de cuidar e não de descartar.
Na sua moção propõe uma “auditoria exaustiva às contas do partido”. Qual é a sua proposta concreta para resolver o problema financeiro que o partido enfrenta?
Nós não conhecemos as contas, não percebemos o que se passa com o partido, mas é claro que houve uma má gestão nos últimos anos. Por exemplo, a venda da sede do Porto a uma sociedade angolana. Aquilo que ali se fez foi um ato de gestão danosa que prejudicou muito o partido. É preciso primeiro perceber quais são as dívidas reais e os encargos do partido após a realização dessa auditoria que proponho. Depois, a meu ver, para recuperar o partido financeiramente temos dois caminhos: Renegociar a dívida com o banco e fazer uma dilatação do empréstimo para o podermos pagar. Em segundo lugar, temos de racionalizar os meios do partido - que nós não sabemos quais são nem os custos que têm - respeitando sempre as pessoas porque não podemos ter despedimentos e bullying profissional como aparentemente em acontecido no CDS.
A captação de receita do partido, deverá ser realizada através do aumento de quotas, considerando que o partido não tem quotas obrigatórias pode passar a tê-las temporariamente. Também acredito que os militantes e os simpatizantes do CDS vão ajudar financeiramente o partido, mas para isso têm de confiar novamente na estrutura partidária. Para se conquistar essa confiança, o partido tem de ser transparente, tem de apresentar ideias e ter uma agenda política que sirva o seu eleitorado. As pessoas não vão contribuir para um partido que não as representa ou que não as ouve. Temos de ter um partido seguro, previsível e que defenda as causas e as bandeiras dos seus eleitores.
E internamente, tem alguma proposta para cortar despesas no partido?
É muito importante perceber outra coisa, que infelizmente não sei em que grau é que aconteceu nem com quem do partido. Nós não podemos ter titulares de cargos políticos a receber avenças do partido. Por exemplo, quem é deputado não pode ter um salário de presidente. Contudo, agora temos de olhar para frente. No futuro tem de haver uma clareza profunda e total nas contas, que têm de ser mostradas aos conselheiros nacionais de forma transparente e clara. Até defendo que estas contas deviam ser apresentadas aos portugueses. Todos os eleitores devem ter acesso às contas dos partidos não vejo razão para que se esconda o que quer que seja porque a vida política tem de ser escrutinada para que não haja dúvidas.
Não podemos exigir a António Costa transparência nas contas públicas e depois dentro da nossa casa não a termos. Temos de substituir as paredes de pedra grossa da nossa casa por paredes de vidro Também propõe a "criação de um código de boas práticas para os eleitos do CDS e todos os que ocupem lugares de escolha ou nomeação através do partido". Concretamente, de que tipo de condutas está a falar?
Nós temos de ser um exemplo para a sociedade, estas práticas têm a ver com a transparência fiscal. Deve ser claro que não há um aproveitamento pessoal por parte de quem está na política. Isso tem de ser claríssimo. Não podemos exigir a António Costa transparência nas contas públicas e depois dentro da nossa casa não a termos. É mais nesse sentido, tem de haver uma moralização, uma ética e uma responsabilização da atividade política e de quem ocupa cargos no partido. Temos de substituir as paredes de pedra grossa da nossa casa por paredes de vidro.
Promete ainda a reconciliação dentro do partido. Como é que pretende alcançar essa união?
Fazendo com que o partido se regenere, respeitando os militantes de base, as concelhias e as distritais. As copulas têm de representar essas bases. A direção do partido não pode ser uma entidade abstrata, longínqua e intocável, que quando há eleições toca nos militantes e depois se recolhe novamente à sua clausura. Não pode. Temos de ter um respeito profundo pelas escolhas das bases que, no dia-a-dia, são quem dão a cara pelo partido nas suas freguesias e nas suas terras. Todos nós vimos o que aconteceu com a escolha dos deputados na campanha europeia, a tragédia que a imposição dos candidatos foi para o partido. E por isso, é que defendo directas para a escolha dos candidatos quer seja para as freguesias, câmaras ou para deputados. É assim que se respeita a vontade dos militantes. Tenho a certeza que com esta fórmula conquistaremos uma vitalidade e uma vivacidade no partido como há muitos anos não se vê.
Tanto o Chega como o Iniciativa Liberal surgiram sobretudo porque o CDS abandonou as bandeiras da direita e deixou que estas fossem tomadas por novos partidos Na sua candidatura afirma querer “criar uma plataforma política alargada, como forma de agregar a direita, conquistar o centro e a abstenção”. Como é que uma candidatura tão à direita conquistaria o centro?
Primeiro, conquistaremos uma parte da abstenção. Nas legislativas, 51% de portugueses não votou. Se o CDS mudar e escolher o futuro, tenho a certeza de que pelo menos 10 ou 12% desse bolo que não vota passará a votar. Depois, os novos partidos à direita do CDS apareceram porque deixámos esse espaço aberto e as pessoas aderiram. Basta olhar para o fenómeno do Chega. É um fenómeno expectável e a responsabilidade é nossa porque tirámos o apoio a André Ventura em Loures e abrimos a porta para que criasse um partido. Mas tanto o Chega como o Iniciativa Liberal surgiram sobretudo porque o CDS abandonou as bandeiras da direita e deixou que estas fossem tomadas por novos partidos. Portanto, se voltarmos a ocupar esse espaço que deixámos vamos crescer novamente e, simultaneamente, conquistar o centro.
Se partidos como o Chega e o Inciativa Liberal tomaram o espaço deixado pelo CDS, como é que propõe a reconquista desse eleitorado?
Se regressarmos ao sítio de onde nunca devíamos ter saído e se as pessoas virem e perceberem que não são somos mais do mesmo e que temos atores políticos com provas dadas, que defendem o que acreditam até às últimas consequências, o eleitorado vai voltar a olhar para o CDS como um partido de confiança. Não serão todos os que já saíram para a Iniciativa Liberal e para o Chega, admito. Mas, essencialmente, quem engrossará muito o universo de eleitores do CDS será a abstenção. Quem se absteve nas últimas eleições não foram só pessoas que não se interessam por política, foram cidadãos que não se sentiram representados. Captando esse eleitorado, é possível tornar o CDS 'a grande casa da direita'.
Para mim, o Chega é um partido aliado. Portanto, mais facilmente me coligaria ou faria acordos com o Chega do que com o Bloco de Esquerda Admitiria alianças com o Iniciativa Liberal e com o Chega?
Com o Iniciativa Liberal não, porque não é um partido que defenda, nem de perto nem de longe, os valores do CDS. O Iniciativa Liberal tem uma perspetiva liberal da economia, mas não defende uma responsabilidade social na atividade económica como o CDS. A nível dos valores, o Iniciativa Liberal é, por exemplo, a favor do aborto e da eutanásia e nós não somos. Somos claramente um partido muito diferente que temos apenas um ponto de contacto na questão económica. O Iniciativa Liberal é cada um por si e o CDS é um por todos e todos por um. Já o Chega, foi um partido que foi criado por muitas pessoas que saíram do CDS. Para mim, o Chega é um partido aliado. Portanto, mais facilmente me coligaria ou faria acordos com o Chega do que com o Bloco de Esquerda.
E com o PSD?
Claramente. O PSD tem uma grande diferenciação de ideologias e correntes a nível interno. Contudo, como se sabe, o PSD é o parceiro natural historicamente do CDS e não vejo razões para que não o continue a ser.
Não acredito que João Almeida consiga vencer estas eleições. O sonho de um CDS igual aos últimos quatro anos é um pesadelo. O verdadeiro sonho é mudar de atores políticos, é apostar no futuro e ter um congresso que escolha um caminho diferente Rui Rio saiu vencedor das diretas do PSD, à segunda volta. Os sociais-democrata ficaram nas melhores mãos?
Isso é um problema do PSD. Nós temos problemas muito graves no partido e temos de estar concentrados na resolução dos mesmos. A eleição interna do PSD não influencia o nosso resultado. É certo que, nos últimos quatro anos, o CDS teve um PSD esfrangalhado e não aproveitou para crescer, o que é extraordinário. Esta incapacidade é mais uma prova de que a estratégia que Assunção Cristas escolheu foi uma trajetória falhada. Considerando que João Almeida fez parte dessa direção, também é culpa sua todo este declínio do partido. É por isso que não acredito que João Almeida consiga vencer estas eleições. O sonho de um CDS igual aos últimos quatro anos é um pesadelo. O verdadeiro sonho é mudar de atores políticos, é apostar no futuro e ter um congresso que escolha um caminho diferente.
Se for eleito, está disponível para estabelecer acordos com o PS e com o Governo ou quer construir uma oposição intransigente?
Um humanista personalista tem de estar aberto ao diálogo com todos, mesmo com quem está radicalmente em oposição. Nós nunca podemos deixar de ouvir os outros. Acho que, em política, é uma ofensa aos portugueses e à própria concepção de democracia, uma pessoa com responsabilidades políticas dizer que não fala com outros. A meu ver, é triste e perigoso. Oiço muito isso na esquerda, o que é lamentável. As pessoas têm de se ouvir. Depois, se há acordos ou entendimentos, depende. Se o PS tiver uma proposta que é exatamente igual aquela que defendo, só se for casmurro é que posso estar contra. Quem me dera é que o PS apresentasse uma proposta igual há que eu faria, o problema é que não faz.
Considera que o Governo tem a capacidade de levar o mandato até ao fim?
Não sei, depende muito da conjuntura económica internacional. Se houver uma crise económica semelhante à que aconteceu há alguns anos, o Governo, em dois ou três meses, deixa de ter condições para governar. Penso que se os portugueses começarem a passar dificuldades, as coisas complicam de tal maneira que o Governo cai. Mas espero que isso não aconteça. Penso que é importante, em nome da estabilidade, que as legislaturas cheguem até ao fim e que haja uma certa serenidade. Não sou a favor de ruturas institucionais a não ser que haja um problema grave que o justifique. Se assim o quiser, acho que o PS tem todas as condições para ir até ao fim do mandato.
A crise dos professores foi terrível para o CDS. Infelizmente, Assunção Cristas não soube antecipar ou lidar com a situação depoisVoltando a outubro, na sua opinião, qual foi o maior erro do CDS nas eleições legislativas?
A escolha dos candidatos. A meu ver, essa escolha desmobilizou internamente todo o partido e transmitiu uma imagem muito negativa ao exterior. Outro momento chave que identifico como negativo foi a questão da crise dos professores. A forma como o CDS lidou com esta situação deu um sinal péssimo ao país e ao eleitorado do partido. Acho que o CDS falhou dramaticamente e que inverteu a perceção de crescimento que tinha alcançado até aí. A crise dos professores foi terrível para o CDS. Infelizmente, Assunção Cristas não soube antecipar ou lidar com a situação depois. Foi um momento de viragem, cujos efeitos se verificaram logo nas eleições europeias. Depois, penso que também não ajudou a falta de regeneração dos candidatos, a insistência nas ideias de sempre e a transmissão de uma concepção de partido ultrapassada.
Estamos despojados de causas e andamos à procura delas, enquanto os outros as apanham. Deixámo-nos tomar não só por mérito dos outros partidos mas pela nossa própria inércia Considera que a campanha legislativa do CDS pecou pela incapacidade de comunicar com o eleitorado ou pelas propostas do próprio programa?
Acho que pela falta de ideias. Hoje ninguém se pode queixar de dificuldade em comunicar. De facto não havia uma mensagem interessante ou uma identidade forte. Se hoje perguntarmos a alguém: 'O que é que o CDS defende?' ou 'No que é que o CDS é difere do PSD ou do PS?' Ninguém sabe. Mas, antigamente, as pessoas sabiam que o CDS era o partido do mundo rural, dos agricultores, reformados, pescadores e empresários porque havia causas. Agora estamos despojados de causas e andamos à procura delas, enquanto os outros as apanham. Por exemplo, nós andámos a defender o 25 de novembro desde sempre, agora o Chega falou desta questão e tomou conta desta bandeira e já ninguém quer saber do CDS. Deixámo-nos tomar não só por mérito dos outros partidos mas pela nossa própria inércia.
E para as eleições autárquicas, que metas propõe?
Temos de começar já a trabalhar nas eleições autárquicas depois deste congresso. É uma matéria fundamental e quem ganhar as eleições tem de avançar imediatamente. Se não, arriscamos não ter candidatos ou a perder as câmaras que ainda temos. Devemos apostar numa grande malha autárquica, para construirmos uma rede local que alavanque o resto da atividade política do partido. Se não tivermos militantes nas terras não temos partido.
O mandato de Marcelo Rebelo de Sousa ficou muito aquém. Não me revejo neste tipo de mandato presidencial. Se for líder no CDS não apoiarei a recandidatura de Marcelo Rebelo de SousaO apoio à recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa irá ser decidido em Concelho Nacional. Qual é a sua avaliação do mandato do atual Presidente da República?
Na minha opinião, o mandato de Marcelo Rebelo de Sousa ficou muito aquém. Não me revejo neste tipo de mandato presidencial. Se for líder no CDS não apoiarei a recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa. Contudo, esta é uma decisão do partido e que não do presidente. Mas, se for líder do partido e os militantes tiverem outra posição, terei de me conformar, como é óbvio. Ainda assim, acho que ou o CDS não apoia ninguém e dá liberdade total aos seus militantes ou se apoiar uma candidatura tem de reflectir aquilo que é a matriz e a identidade do partido. Este primeiro mandato presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa não defendeu, na minha prespetiva, aquilo que são os valores do CDS e deu um apoio muito evidente à esquerda. Eu considero que o Presidente da República deve ter um distanciamento maior.
Como aprecia uma hipotética recandidatura de Assunção Cristas à Câmara Municipal de Lisboa nas próximas autárquicas?
No passado, Assunção Cristas teve efetivamente sucesso na sua candidatura à Câmara Municipal de Lisboa. Mas é preciso recordar que também beneficiou de uma conjutura política e que não chegou a autarquia só através do seu mérito. Maso facto de ter sido uma má presidente de partido não quer dizer que seja uma má presidente de câmara. Mais uma vez, entendo que tem de ser uma decisão das estruturas locais. Se os militantes de Lisboa escolherem Assunção Cristas, o líder do partido não se pode opor. Não tenho nada pessoalmente contra Assunção Cristas, as minhas divergências são meramente políticas.
Se perder estas eleições volta a recandidatar-se?
Não penso nisso, não me consome nem por um segundo. Acho que o importante agora é continuar a divulgar a minha candidatura até ao congresso, espero que Aveiro seja um espaço de grande vitalidade que conte com uma grande participação de todos, que seja um congresso no qual não haja casos, onde as votações só ocorram depois de todos falarem para que o líder que seja eleito, seja eleito sem rabos de palha para que o partido possa ter um período de tranquilidade, de reorganização e de crescimento.
Se o partido escolher uma liderança "mais do mesmo" vai continuar no CDS?
Não sei, terei de ver. Tenho a triste convicção de que o partido não crescerá se continuar no caminho dos últimos tempos. Tenho uma visão dos partidos instrumental. Os partidos devem estar ao serviço dos portugueses, portanto o CDS ou serve valores e um modelo de sociedade ou não serve e, como aconteceu, os portugueses tiram-lhe os votos. Se for esse o futuro do CDS tenho muita pena porque é um partido com uma história muito longa e importante na democracia portuguesa. Se estarei no partido ou não para ver? Depende de como o partido estiver e também estiver comigo. Não poderei apoiar um partido em que não acredito.
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