Laboratório recria horror de prisão militar na Síria com tecnologia 3D
A fome, tortura e violações que marcam o dia-a-dia dos detidos na prisão militar síria de Saidnaya foram recriados a três dimensões por uma organização britânica, para mostrar e comprovar os abusos dos direitos humanos cometidos no conflito.
© Eyal Weizman
Tech Reino Unido
A Amnistia Internacional é uma das organizações de defesa dos direitos humanos que recorrem à Forensic Architecture (FA) para criar um modelo navegável da prisão que permita alertar para a situação dos presos políticos na Síria.
O ativista e arquiteto israelita Eyal Weizman, 46 anos, criou a FA em 2011, estando atualmente instalado no 'campus' da Universidade de Londres, no sul da capital britânica.
O laboratório interdisciplinar é especializado na produção de análises e provas para serem usadas em processos sobre direitos humanos nos tribunais internacionais, com a arquitetura como ferramenta chave para recriar com precisão situações ocorridas em ambientes caóticos.
Antes da FA, nenhuma organização ou jornalista tinha tido "acesso" à famosa prisão do regime de Bashar al-Assad, situada 25 quilómetros a norte de Damasco.
O laboratório reuniu testemunhos dados à Amnistia Internacional por antigos prisioneiros e juntou-os com imagens de satélite e outras informações disponíveis na internet.
"Trata-se de desvendar os factos a partir de pormenores", explicou à agência France-Presse o investigador Stefan Laxness.
"Apanhar os detalhes espaciais inadvertidamente mencionados pelos detidos e usar isso para reconstruir a experiência que tiveram ajudou-nos a compreender como a prisão pode estar estruturada e começámos a notar um padrão na trajetória que cada detido tem no edifício", explicou.
Um detido descreveu como a luz do sol iluminava determinadas partes da sua cela a dada altura do dia.
"Quando ele situou a cela num espaço com uma determinada orientação e nós fizemos uma simulação solar, o testemunho dele coincidiu com os parâmetros físicos. De certa forma, isso permite validar o entrevistado e a sua história", disse Laxness.
Os investigadores da FA também viajaram para Istambul para entrevistar "testemunhas auditivas", que estiveram vendadas ou impossibilitadas de ver outras partes da prisão.
Esses antigos detidos não tinham informação visual pormenorizada da prisão, mas forneceram informação valiosa a partir do relato do que ouviram, desde os ritmos da vida na prisão, as rotinas dos torturadores ou ocorrências mundanas como uma torneira que pinga.
Laxness disse que os antigos detidos não estão normalmente familiarizados com a tecnologia 3D, mas "muito rapidamente" compreendem como funciona e querem contribuir para o modelo com dados sobre a sua experiência pessoal.
Além da prisão militar síria, a FA recriou o bombardeamento de Gaza de agosto de 2014, o genocídio de Ixil, na Guatemala, em 1978-1984 e o naufrágio de uma embarcação no Mediterrâneo que transportava 63 migrantes.
A organização é a única a fazer este tipo de trabalho e colabora com organizações de defesa dos direitos humanos, tribunais internacionais e a ONU.
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