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"Corremos o risco de perder uma geração inteira"

Margarida Balseiro Lopes, líder da Juventude Social Democrata (JSD), é hoje a entrevistada do Vozes ao Minuto.

"Corremos o risco de perder uma geração inteira"
Notícias ao Minuto

29/05/18 por Melissa Lopes

Política M. Balseiro Lopes

Largo do Carmo. A escolha do local da entrevista foi da Margarida, líder da JSD há pouco mais de um mês. Acabada de regressar de Fafe, onde visitara uma escola, “porque o contacto com a população não pode ser só às segundas-feiras”, a deputada do PSD, de 28 anos, concedeu uma entrevista ao Notícias ao Minuto, onde se debruçou sobre a sua visão do que deve ser a política e do que é mais urgente mudar para que não se perca "uma geração inteira". 

Ciente das responsabilidades que o cargo acarreta, não podia estar mais orgulhosa do caminho que está a traçar. Em pouco mais de um mês, conseguiu levar uma proposta da JSD (a expulsão de militantes condenados por crimes de corrupção) ao Conselho Nacional do partido, que se reúne esta quarta-feira, dia 30. E mais estará por vir, mas sempre com o foco nas reais principais preocupações dos jovens. 

Dentro da sua Jota, revela que fará um referendo interno sobre a legalização das drogas leves para fins recreativos, sobre a qual tem uma posição pessoal, até ao final do ano. 

Está há um mês na liderança da JSD. Já consegue fazer um balanço?

O balanço que eu faço é muito positivo. Uma das principais preocupações que eu tinha, e que tenho para estes dois anos, é reforçar o capital político da Jota, porque uma das coisas que mais me preocupa é o estigma que está associado às juventudes partidárias e o facto de nós termos, em tão pouco tempo (um mês e uma semana), sido notícia tantas vezes e sempre por coisas que considero positivas, deixa-me com o sentimento de que estamos a caminhar bem.

Cumpriu o sonho de discursar na Assembleia da República no 25 de Abril. Um discurso que foi bastante aplaudido. O que é que sentiu naquele dia?

Estava nervosa, como era suposto. Mas estava verdadeiramente feliz, porque era de facto um sonho, as pessoas que me eram mais próximas sabiam porque a data é muito especial e fazê-lo em nome do meu partido… o impacto foi inacreditável. Ainda hoje fui visitar uma escola em Fafe e a diretora, assim que me viu, deu-me os parabéns pelo discurso, um mês depois. Foi bom até porque não foi tanto a Margarida mas sim a líder da JSD. Acho que isso também é importante.

Muitas vezes o debate parlamentar é feito numa lógica muito divisionista – e eu alertei para isso no discurso - é normal e é suposto os partidos terem diferenças, como não pode deixar de acontecer, mas haver situações em que propostas são chumbadas apenas porque vêm de determinado partido, isto não é bom para a democracia e desde logo para as pessoas que, em teoria, é suposto serem as destinatárias da nossa ação. Acho que isso também marcou a diferença. Nos outros 364 dias vincamos bem as nossas diferenças, aquele não era o dia para isso. E o facto de eu ter fugido um bocadinho ao registo das outras intervenções marcou a diferença.

Recebeu elogios de outras bancadas parlamentares?

Sim, do PS e do CDS.

Houve algum elogio que a tivesse particularmente marcado?

Dentro dos partidos ou fora dos partidos? Fora dos partidos, surpreendeu-me muito Ferreira Fernandes, do DN, e o facto de o meu pai ter ficado tão emocionado com o discurso 

Foi a Margarida que preparou o discurso?

Sim. Falei com alguns amigos mais próximos e com quem tenho muita cumplicidade política. Sabia que à partida iria querer ter presente uma lógica de agradecimento às gerações anteriores, mas também uma lógica de futuro, sobre os desafios que temos pela frente. Obviamente que estava em representação do grupo parlamentar do PSD, mas muito daquilo que eu disse do “Portugal por fazer” são coisas que eu já tinha dito no congresso da JSD. Foi possível fazer esse casamento.

Disse, nesse discurso, que há assuntos em que vocês, políticos, não ouvem suficientemente o que povo reclama, referindo-se depois à corrupção.

Falei de duas coisas, da corrupção e da transparência, que são coisas diferentes.

É sobretudo a corrupção e a falta de transparência que nos está a impedir de cumprir Portugal?

São, e falta depois tudo o resto. Para mim, esse é claramente o desafio. Eu brincava e dizia que – e acredito nisso – [a corrupção] é o elefante na sala. Agora, ele continua de facto na sala, mas já olham para ele, já falam dele e o incómodo é evidente. Mas isso já é bom, já começámos a fazer qualquer coisa.

Não se trata de ser de Esquerda ou de ser de Direita, como é evidente, a corrupção não tem coresRefere-se a Sócrates?

Não só, mas também. Não se trata de ser de Esquerda ou de ser de Direita, como é evidente, a corrupção não tem cores. É uma coisa que nós não podemos ignorar e de que as pessoas falavam mas face à qual a classe política estava muda e calada, que é: há um conjunto de ex-governantes, todos do mesmo governo, todos do mesmo partido (uns militantes outros não), que num determinado período de tempo montaram uma teia de promiscuidade e de captura da comunicação social, de condicionamento dos tribunais, da justiça, condicionamento da opinião pública.

Quando há uns anos houve dirigentes a alertar para uma claustrofobia democrática, houve quem tivesse gozado e, afinal, houve jornalistas que foram expulsos da profissão – o caso mais evidente foi o de Manuela Moura Guedes – em resultado daquele período. Viemos a saber mais tarde porquê. Porque havia um contacto com os donos em Espanha. Isto é gravíssimo. Para lá da vergonha que é para o país e para o PS, que já admitiu, ter um ex-primeiro-ministro e alguns ministros daquele governo acusados de corrupção, revela as fragilidades da democracia e isto entronca com o discurso do 25 de Abril.

Quando eu dizia que a liberdade não se funda numa noite, constrói-se diariamente, a democracia também não é um bem que tenhamos por adquirido e que seja irreversível. Temos exemplos, como é o caso da Hungria, em que há direitos e liberdades fundamentais que a dada altura começam a ser colocados em causa, e eu falo à vontade disso até é de um partido que faz parte da mesma família política que o PSD, neste caso o PPE. Serve para ilustrar que não podemos assumir que está tudo feito, mesmo aquilo que foi feito tem de ser garantido todos os dias.

Até que ponto deve ir a transparência de modo a evitar que a corrupção prossiga o seu caminho na sombra?

Corrupção e transparência estão relacionadas mas são assuntos diferentes. No que toca à corrupção, estamos claramente a falar de um conjunto de decisões políticas que foram tomadas, não em função do interesse público mas em resultado de interesses particulares. Quanto à transparência estamos a falar da possibilidade de cada cidadão saber quem, quando, como e porquê, quanto custou hoje e quanto vai custar amanhã, isto sobre todas as decisões que são tomadas. A transparência, claro, também se aplica aos titulares de cargos públicos.

O melhor exemplo que tenho e que ilustra isto é exatamente nas PPPs [Parcerias Público Privadas], que é capaz de ser aquele que é um tipo contratual que tem maior pendor intergeracional porque se paga lá à frente e fica para as gerações futuras. Faz algum sentido que, aos dias de hoje, tenhamos por exemplo no setor rodoviário os contratos todos no site da UTAP [Unidade Técnica de Acompanhamento de Projetos], mas não tenhamos todas as renegociações ou todos os estudos que levaram a que aqueles contratos tivessem sido celebrados? Vai-me dizer que isso não é corrupção. Pode não ser, como é evidente.

Mas será falta de transparência.

Começa por ser falta de transparência. Se existisse maior transparência, teria sido mais difícil para os prevaricadores atuarem porque o nível de escrutínio público era muito maior. E depois temos o resultado que é: A austeridade que nós tivemos, acho que hoje em dia já não há bem a teoria de que foi a crise internacional que motivou. Além das questões das PPPs foi a questão da Parque Escolar e provavelmente poderá vir mais qualquer coisinha.

Poderá vir mais qualquer coisinha também referente a governos anteriores...

Que venha. De que governo for. Esta ideia do “são todos iguais” só serve os corruptos.

Na política, aos olhos dos eleitores, por uns acabam por pagar todos. Essa ideia do “são todos iguais” é perigosa?

Claro que é. Até porque inibe pessoas que sejam sérias, íntegras e bem intencionadas de vir [para a política]. Aquilo que mais me incomoda é isso, o “são todos iguais”. Durante a campanha eleitoral, ouve-se: “vocês só vêm cá de quatro em quatro anos pedir o voto”. Não há ninguém que me possa acusar disso porque não é só à segunda-feira – que é o dia do contacto com o eleitorado – que eu o faço. Hoje [terça-feira] fui a Fafe e vim de Fafe, fiz quase metade do país de carro. E não há um dia da semana em que eu não esteja também a fazer isso.

É preciso combater essa ideia e mostrar que de facto não são todos iguais.

É fundamental.

As juventudes têm um papel importante nesse combate?

Sim e acho que só se lidera pelo exemplo.

E o exemplo “vem de cima”.

Lá está, o exemplo vem do topo da hierarquia do Estado. Não podemos dizer às pessoas que devemos ser todos bons cidadãos e depois ser o exemplo contrário.

Foi por acharmos que devemos liderar pelo exemplo que, na semana passada, enviámos uma carta à comissão de revisão estatuária a pedir, já que estão a fazer a revisão dos estatutos e dos regulamentos, que seja consagrada a regra de quem é condenado por corrupção, ou por outros crimes contra o Estado, deve ser expulso do partido.

Como se sente pelo facto de Rui Rio ter acolhido a sua proposta, sendo esta apreciada em Conselho Nacional?

Sinto-me satisfeita. Aqui trata-se de perceber de que forma é que o partido quer tratar a questão. Temos uma regra, quem se candidata contra listas do PSD em eleições autárquicas é expulso. Se temos esta regra, faz algum sentido que não tenhamos uma que expulse quem é condenado por corrupção? Quem é condenado por corrupção não faz falta ao partido.

Temos de dar o exemplo dentro de casa para podermos defender fora o que praticamos no nosso partidoIsso vai ao encontro do tal "banho de ética" que Rui Rio prometeu.

Vai ao encontro. Temos de dar o exemplo dentro de casa para podermos defender fora o que praticamos no nosso partido. Isso é fundamental.

Relativamente ao caso Manuel Pinho, que por acaso já não é arguido no caso EDP devido a irregularidades processuais. Era bom que prestasse esclarecimentos o quanto antes?

Agora será necessariamente ouvido porque foi criada a Comissão de Inquérito. Sobre a energia ele terá bastantes coisas a dizer.

A Margarida criticou o Bloco de Esquerda pelo facto de o partido ter pedido o alargamento do objeto dessa comissão de inquérito até ao governo de Durão Barroso. Porquê?

Eu quero que as regras se apliquem a todos. O que defendo não é para os outros, é para todos. Ora, mas o que aconteceu nesse caso foi claramente o Bloco a dar a mão ao PS. Volto a dizer: A corrupção não tem Esquerda nem Direita. Agora, porque é que se começou a falar no tema tão intensamente nas últimas semanas?

Porquê?

Porque, além da acusação ao ex-secretário geral do PS e ex-primeiro-ministro José Sócrates, ficou a saber-se que havia outros ministros daquele governo a serem investigados por corrupção, gestão danosa e etc.

Crê que foi, então, uma forma de dispersar atenções?

Claro. Já que vamos ouvir estes, já agora ouvimos todos desde os anos 90, foi só o que faltou. E até pode fazer sentido do ponto de vista teórico perceber. O ponto é: vai-se meter tudo no mesmo saco, baralha-se tudo. É por isso que alguém dizia, há uns dois anos, que o Bloco é a lavandaria. Vai tudo para dentro da mesma Comissão, com um âmbito temporal enorme. Está-se a equiparar um governo como o de Sócrates, em que há vários ministros investigados, com o do Barroso ou do Santana? Faz algum sentido?

Devia ser criada uma Comissão de Inquérito [sobre as rendas na energia] para cada um dos governos, é isso?

Por aquilo que sei, acho que faz sentido criar uma Comissão de Inquérito ao período em que o governo do PS esteve em funções, desde 2005 a 2011.

Mas faz também sentido conhecer a história toda, atravessando vários governos, incluindo o de Barroso.

Faz, faz. Mas as PPPs, a Parque Escolar, enfim, são coisas que são muito limitadas no tempo, não foi no tempo de Durão Barroso.

Alargar a Comissão de Inquérito sobre as rendas da energia é uma forma de não dar em nada?

É, é. Já não bastava o que o Bloco tinha feito com a Comissão à Caixa quando a assassinou.

Por que razão diz que assassinou?

O Tribunal da Relação tinha dado razão à própria Comissão na possibilidade de ter acesso a um conjunto de documentos que tinham sido recusados. O sigilo dá para muita coisa e também deu para isso. Antes de a decisão ter transitado em julgado, eles mataram a Comissão, não quiseram ouvir mais ninguém, houve direitos potestativos tanto do PSD como do CDS que não puderam ser exercidos. Houve audições que não foram feitas, os partidos de Esquerda não quiseram fazer as audições, o que é também curioso. E, portanto, morrendo a Comissão, a decisão deixou também de ter efeito útil.

Há partidos onde a corrupção floresce mais do que noutros?

Não acho que a corrupção seja propícia ou decorrente de partidos. Mas há um partido que tem um problema grande com vários dos seus membros.

E há alguma razão que explique isso?

Não sei. Não sei se se juntaram todos no mesmo período. Não sei. É uma pergunta interessante.

A relação com Rui Rio tem sido ótimaA Margarida é admiradora de Passos – e até nem se importa que lhe chamem Passista -, e votou em Santana nas diretas. Como é a relação com Rui Rio?

É ótima.

Tem tido a tal autonomia que exigiu?

Tenho. Aliás, a relação tem sido ótima, começou no congresso da Jota [JSD] com o discurso de encerramento a falar abertamente de temas que gostava que a Jota falasse. Não é normal, pelo menos eu nunca tinha visto. Passado uns dias, reunimo-nos com o presidente do partido para apresentar a moção em detalhe, falámos na necessidade de conseguirmos visitar as residências universitárias, que é um dos principais problemas que temos atualmente para as novas gerações que estão no Ensino Superior.

Ainda na semana passada, no Porto, os responsáveis da universidade nos diziam que há casos de abandono em resultado dos custos do alojamento. Ficou logo ali assente que a visita seria feita também por ele [Rui Rio]. Na semana passada veio connosco exatamente fazer a visita a duas residências no Porto. E, além disso, o discurso do 25 de Abril foi uma escolha do presidente do grupo parlamentar mas foi também do presidente do partido.

É positiva então a análise que faz da prestação de Rui Rio?

Muito positiva.

Como é que vê o retomar de relações entre o PS e o PSD, simbolizado naquele aperto de mão?

O PS mudou de postura.

E o PSD mudou de líder.

O PSD mudou de líder, mas diversas vezes o anterior líder tentou diálogo e que houvesse iniciativas nossas e deles que pudessem ter alguma plataforma de entendimento, mas o PS não estava disponível. Fico contente que tenha mudado de postura. Momentaneamente, porque se formos ver os debates parlamentares recentes percebemos que o PS já voltou ao mesmo.

Em que situações concretamente?

A propósito das iniciativas legislativas do sigilo bancário e da questão dos 50 mil euros, de todas essas propostas que foram apresentadas, a do PSD [propunha facilitar o acesso das comissões parlamentares de inquérito a informação bancária de “instituições de crédito que recebam do Estado um apoio direto ou indireto à sua capitalização”] foi redondamente chumbada, como é tradição das bancadas mais à Esquerda. Portanto, nada de novo.

Ninguém fala nem falará de guerra de gerações, todas as gerações fazem falta ao país, mas nós corremos o risco de perder uma geração inteira Concentremo-nos nos jovens. Para a JSD, o que é que é mais urgente fazer para cumprir o tal Portugal jovem? Que medidas tem em vista ‘atacar’ primeiro?

Os jovens hoje em dia em Portugal não têm forma de se autonomizarem. Vivem num ciclo de baixos salários, de estágios sucessivos e de preços de habitação exorbitantes, o que faz com que não consigam iniciar o seu projeto de vida. E se nós sabemos – e bem - que temos de combater o inverno demográfico e apostar na natalidade, como é que é possível apelar a um jovem que tenha filhos, se o jovem não consegue sair da casa dos pais? Esse é o desafio. Vinco muitas vezes, ninguém fala nem falará de guerra de gerações, todas as gerações fazem falta ao país, mas nós corremos o risco de perder uma geração inteira.

E que medidas vai a JSD propor para contrariar isso?

Ao nível da habitação, o Porta 65, cujo antecessor chegou a ter 60 milhões de euros de execução, há mais de 15 anos, hoje tem 15 milhões. 60% dos candidatos ficam de fora porque cumprem os requisitos mas não há verba. O que nós defendemos é, além do reforço do Porta 65, haja um reforço das deduções fiscais que existem com a habitação, criando especificamente um benefício para jovens com menos de 30, 35 anos, que tenham despesas com habitação. Se calhar vai-me dizer que há casos de jovens que não pagando IRS precisam desse apoio, para isso há a figura do crédito fiscal que permite dar uma ajuda a esses jovens. Eu até sou mais adepta desta última forma de atribuição de apoio que é pela via fiscal e não pela via do subsídio. Do ponto de vista ideológico, acho que faz mais sentido, mas numa primeira fase combinava estes dois instrumentos.

Depois o que defendo é que deve haver claramente uma diferenciação fiscal para jovens com menos de 30 anos - obviamente com um limite, um jovem que entra no mercado de trabalho a ganhar 3 mil ou 4 mil euros não precisa desse apoio. É no início de vida que os jovens mais precisam de ajuda para terem rendimento disponível para se conseguirem libertar.

Os mais novos estão a descontar para um sistema que toda a gente sabe que vai falir É a prioridade?

É a prioridade. Obviamente que depois também quero discutir a Segurança Social, que é um tema que não abarca só os mais velhos, os mais novos estão a descontar para um sistema que toda a gente sabe que vai falir – não sabemos o dia, nem sabemos eventualmente o ano exato – mas ninguém faz nada. É fundamental garantir que os jovens de hoje vão ter pensão amanhã, mas o mais urgente é exatamente esta geração que não consegue sair de casa dos pais.

Mudando aqui a agulha da conversa, é a favor da eutanásia. É importante debater a questão também fora do Parlamento?

Acho que sim, pese embora essa discussão não seja nova. É uma discussão tão profunda, a vários níveis.

Sendo tão profunda, não é uma discussão que se faça através de outdoors como aqueles do CDS Almada ‘Eutanásia mata’?

Não, nem com demagogia.

Que é o que está a acontecer?

É. Ainda há pouco Assunção Cristas se pronunciou sobre a eutanásia...

Dizendo que o Governo se preparava para “executar a morte”.

Pronto [suspiro]. Fui à missa no domingo e o senhor padre dizia que a questão de defender a eutanásia era a mesma coisa que a discussão tida por ocasião do holocausto e a morte dos judeus.

Sem prejuízo de até achar que um referendo sobre a eutanásia podia ser interessante, não me vou escudar atrás disso, para não decidir aquilo que achoÉ favorável a um referendo sobre esta questão?

Os referendos são sempre positivos porque estamos a perguntar às pessoas aquilo que elas acham. Mas não quero usar o referendo para me escudar numa não decisão. Ou seja, se vai a votação no dia 29 [esta terça-feira], hei-de votar de acordo com a minha consciência. Considero que esta é claramente a matéria que mais demonstra o que é que é ser uma matéria de consciência. Sem prejuízo de até achar que um referendo podia ser interessante, não me vou escudar atrás disso, para não decidir aquilo que eu acho.

Tem noção de como é que o Parlamento se posiciona e se divide relativamente a esta questão?

Não sei. Não tenho a perceção sequer de quantos deputados do meu partido votarão ‘sim’ ou ‘não’. Não tenho falado sobre isso, tenho falado mais comigo própria.

E vai votar a favor?

Sim.

E relativamente à legalização da prostituição à qual também é favorável …

Mas é ridícula a forma como a Juventude Socialista colocou a questão na agenda. Comparar e dizer que deve ser uma profissão como é a advocacia ou como é outra profissão qualquer é ridicularizar um tema que é, de facto, muito relevante e, no limite, tem a ver com uma visão do mundo e da sociedade muito diferente da minha, pode até ser isso.

Considero que esta é uma questão em que, havendo regulação é por causa da proteção das mulheres, da garantia da sua dignidade e por uma questão de saúde pública. Não acho que ser prostituta ou ser advogada seja exatamente a mesma coisa. Com todo o respeito, houve muitas advogadas e advogados que se sentiram incomodados com aquilo, aliás, a Ordem dos Advogados veio reagir a isso. Simplificar as discussões com este tipo de chavões é prejudicar as bandeiras que se querem defender. E para a própria imagem das Jotas é prejudicial.

E a JSD vai apresentar alguma proposta no sentido da legalização?

Eu já assumi publicamente que sou a favor, mas há duas matérias onde a JSD não tem verdadeiramente uma posição assumida: a questão da legalização das drogas leves e a legalização da eutanásia. São duas matérias em que sou favorável, eu, Margarida Balseiro Lopes, a título pessoal. São duas matérias onde vou querer ouvir a opinião da estrutura, aliás, uma das coisas que hei-de propor até ao final do ano é um referendo interno sobre a legalização das drogas leves para fins recreativos.

Eu até sou a favor do consumo de drogas leves para fins recreativos, mas acho que devemos ser sérios nos debates que fazemosExcluindo a questão do auto-cultivo, como chegou a propor o Bloco de Esquerda para fins medicinais?

O auto-cultivo é uma irresponsabilidade. Seria meio caminho andado para não haver controlo daquilo que era cultivado ou não. Eu até sou a favor do consumo para fins recreativos, mas acho que devemos ser sérios nos debates que fazemos, se estamos a falar para fins terapêuticos, faz sentido a questão do auto-cultivo? Como é que se iria fiscalizar na casa das pessoas? Nem o Bloco de Esquerda, se calhar, sabe.

Legalização do trabalho sexual. É esta a principal preocupação dos jovens? Estou muito convencida de que não será, nem a primeira nem a décima  Imaginemos que as Jotas seriam chamadas a governar. Aceitaria um Bloco Central de Jotas?

Não tenho nada contra as outras Jotas, acho que são todas úteis, quando cada uma delas fizer melhor o seu trabalho, melhor é para a democracia, porque o trabalho de credibilização não pode ser só a JSD a fazer. Agora, acho que há diferenças. Há dias tive um debate com o Ivan [líder da JS] na Renascença e a jornalista perguntava qual seria a primeira preocupação a transmitir a António Costa. Ao fim de alguma pressão disse legalização do trabalho sexual. É esta a principal preocupação dos jovens? Estou muito convencida de que não será, nem a primeira nem a décima.

É uma forma de tentar ser popular entre os jovens?

Nem sei, não quero estar a fazer juízos de intenção. Não sei se é para ser popular, se é para não discutir os temas que verdadeiramente afetam os jovens – e onde o Governo não se tem portado bem -, não sei, não estou na cabeça deles. Ou se, efetivamente, para aqueles jovens em concreto esse é o alfa e omega da sua atuação política. Sei que, para a JSD, uma das razões que justificam o afastamento dos jovens da política tem a ver com o desfasamento entre as preocupações das pessoas e o discurso dos políticos. Se o político está a falar de uma coisa que não me interessa que não faz parte do meu dia a dia, que não me tira o sono, vou ouvi-lo a que propósito? 

Isso está a acontecer em que casos?

Temos estudantes a abandonar o Ensino Superior porque não têm residências e o Governo está há mais de um ano para dar cumprimento a uma resolução aprovada por unanimidade na Assembleia da República. Não é só construir, é preciso requalificar e aproveitar infraestruturas que já existam. Os jovens estão a abandonar o Ensino Superior por isto e nós estamos a discutir a legalização do trabalho sexual? Há uma coisa que nós nunca nos podemos esquecer, eu pelo menos tenho sempre essa preocupação, é que estamos sempre a falar para as pessoas.

Há muito essa falta de preocupação na política?

Há. O que não significa que tenhamos de andar ao sabor do vento. Temos de saber exatamente aquilo que queremos. Tem de haver uma relação entre aquilo que são as preocupações das pessoas e aquilo que é o discurso político. Se aqueles que são os destinatários da nossa mensagem não nos ouvem e acham que aquilo que dizemos não é relevante, estamos aqui a fazer o quê?

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