"Presidente sombra? Salvei o Sporting várias vezes da insolvência"
Numa entrevista concedida ao Desporto ao Minuto, José Maria Ricciardi assegura que a sua candidatura é a única "que tem condições para resolver" a situação "dramática" pela qual o clube atravessa.
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Desporto José Maria Ricciardi
Aos 63 anos, José Maria Ricciardi, tantas vezes apelidado de ‘presidente-sombra’, avança com uma candidatura própria à presidência do Sporting, nas eleições que irão decorrer no próximo dia 8 de setembro, e onde terá como adversários João Benedito, Pedro Madeira Rodrigues, Frederico Varandas, Rui Jorge Rego, Dias Ferreira e Fernando Tavares Pereira.
Até abril, o banqueiro era parte integrante do Conselho Leonino. No entanto, a polémica causada por uma publicação de Bruno de Carvalho nas redes sociais após a derrota com o Atlético de Madrid, na qual apontou o dedo aos jogadores, e que culminou com a instauração (e posterior retirada) de processos disciplinares aos homens de Jorge Jesus, levou, não só a que abandonasse o órgão social, como a que retirasse o apoio ao então presidente do clube de Alvalade.
Em entrevista ao Desporto ao Minuto, o banqueiro diz-se “positivo e tranquilo” quanto ao desfecho do sufrágio, assegura ter garantido “um conjunto de soluções” para inverter a situação financeira do clube e alerta para o perigo de se entregar a liderança a “uma equipa de estagiários”: “Depois não se venham chorar...”
Um buraco de 120 milhões de euros é um buraco de 120 milhões de euros, não é de 50 euros. Quem não resolver isto, vai enfrentar o descalabro, e depois vai levar com o Dr. Bruno de Carvalho
Falta menos de uma semana para as eleições. Qual é o seu estado de espírito neste momento?
Muito positivo e tranquilo. A situação do Sporting é dramática, espero que os sócios percebam. Se perceberem, ótimo, porque sabemos que somos a única candidatura que tem condições para resolver isso. Se não perceberem, paciência, é assim que vejo o assunto.
Acredita que irá conseguir vencer estas eleições?
É evidente que tenho sentido muito apoio, mas nunca conseguimos medir essas coisas com precisão. Além disso, há muita gente que estará indecisa e a ponderar. Aquilo que nos preocupava mais era não conseguir transmitir a mensagem do que está em jogo, de que o Sporting, se tiver uma equipa de estagiários, vai direto ao descalabro. Agora os sócios é que vão decidir. Nós, mesmo que não ganhemos, ficamos de consciência completamente tranquila.
Sente que conseguiu passar a sua mensagem?
Acho que sim, que as pessoas percebem. Sei que muita gente não tem sensibilidade ou paciência para números e economia, mas acho que percebem que um buraco de 120 milhões de euros é um buraco de 120 milhões de euros, não é de 50 euros. Quem não resolver isto vai enfrentar o descalabro, e depois vai levar com o dr. Bruno de Carvalho por causa das tosses. Se querem, querem. Depois não digam que não avisámos.
Durante os debates, viveu alguns momentos de maior exaltação, principalmente com Dias Ferreira e Frederico Varandas. Sente que, neste momento, são os seus principais adversários?
O dr. Dias Ferreira principal adversário? Não me dê vontade de rir, sinceramente. Não sei quem são os principais adversários. O meu principal adversário é o descalabro que o Sporting pode ter se os sócios decidirem entregar o clube nas mãos de pessoas que nem consciência da situação têm. Nem sabem ao que vão. Nós não temos nenhuns adversários, respeitamos todos os concorrentes. Achamos que há demais, mas isso caberá aos sócios decidir. Não elogiamos nenhum adversário em especial, podemos é irritar-nos mais com algum concorrente. Sei que a asneira é gratuita, mas às vezes irritamo-nos.
Foi uma campanha bem disputada e respeitosa?
Acho que nos debates não se discute nada, porque com o número de pessoas que existem, não se consegue explicar nada. Somos a única candidatura que não tem diretores de futebol e empresários para fazer negociatas de jogadores. Somos a única candidatura que não precisa do Sporting para rigorosamente nada, para sobreviver. Nos debates, isso não se explica. Por isso é que, para nós, é muito mais importante falar com vocês [jornalistas] ou com os sócios. Isto sim é importante. Agora, os debates em que só se dizem lugares comuns e em que não se consegue explicar as coisas... Devido ao número de concorrentes, não me parece que sejam elucidativos, mas chegaram ao menos para perceber as características das pessoas.
Surpreende-o que, numa fase tão adiantada, haja tantos candidatos?
Sim, alguns já deviam ter tido a consciência de que não têm qualquer chance. Deixo isso ao critério deles, não me preocupa absolutamente nada.
Encontrou-se com Rui Jorge Rego. Já ambos disseram que não há fusão de listas, mas admite trabalhar com ele se for eleito?
Admito trabalhar com todos. Um dos maiores problemas do Sporting é a falta de coesão. O Sporting está completamente partido, só uma equipa com grande capacidade de liderança poderá resolver este problema. Por isso é que temo que, se for um desses amadores, vamos continuar com o Sporting completamente balcanizado e com um iminente regresso de Bruno de Carvalho. Deixarei isso ao critério dos sócios. Ganhando, como espero, convidarei todos para o Conselho Estratégico, porque não tenho medo nenhum de oposição ou de críticas. Continuarei a ouvir os sócios nas redes sociais. Se não ganhar, quem ganhar será o meu presidente, eu não irei para a oposição. Voltarei à minha vida normal e desejo a melhor sorte para o Sporting. Espero que não aconteça.
Caso não seja eleito, pretende ter um papel ativo no futuro imediato do Sporting?
Não. A nossa candidatura exerceu o dever cívico de explicar aos sócios que a situação é dramática. Se não o entenderem, não vamos ter papel ativo coisa nenhuma. Ficam com quem escolherem e depois não se queixem. A mim não se vão queixar de certeza absoluta. Nem a mim nem às pessoas que estão na minha candidatura. Depois não se venham chorar que se enganaram com os palácios das modalidades e novas Academias em Lisboa, quando não temos dinheiro sequer para pagar ordenados aos jogadores. Depois não se venham queixar.
Se não for connosco e vier uma destas listas de principiantes, tenho a certeza absoluta de que o clube vai perder a maioria da SAD
Já disse que nunca foi o ‘presidente sombra’ que muitos diziam que era. Mas por que acha que se criou essa ideia?
Porque me querem denegrir com essa palhaçada. Nunca fiz sombra de ninguém. Nunca fui nem hei de ser sombra de absolutamente ninguém. É ridículo. A única coisa que fiz foi, em conjunto com outras pessoas, salvar o Sporting várias vezes da insolvência, coisa que esses senhores que lá estão nunca fizeram nem vão fazer na vida, não têm capacidade para o fazer.
Era inevitável que o assunto BES fosse abordado durante a campanha?
Estou-me marimbando para isso. Já disse que não tenho nada a temer, não tenho telhados de vidro. Percebo que, quando as pessoas estão desesperadas, me tentem atacar com questões pessoais. Fui considerado o melhor banqueiro da Europa em 2016, coisa que nenhum desses senhores há de ser na vida.
Foi um dos últimos a avançar com a candidatura. Porquê a apresentação mais tardia?
Eu e o José Eduardo, os dois fundadores da candidatura, andámos a tentar convencer outras pessoas de que não precisamos do Sporting para rigorosamente nada. Andámos a tentar convencer pessoas que considerávamos ter capacidade para dirigir o Sporting a candidatar-se. Como elas não quiseram, porque é preciso ter uma grande paixão e paciência para aturar as idiotices que ouvimos todos os dias, nós, com a nossa paixão, decidimos vir para ver se salvamos o Sporting desta situação. Só este ano, o fosso para o Benfica e para o FC Porto já vai ser de 50 ou 60 milhões de euros. Mas, mesmo assim, querem construir Academias ali para a Avenida da Liberdade ou para o Parque Eduardo VII. Que vão em frente, sim senhora, mas depois não se venham queixar.
Quando tomou a decisão de que seria necessário formar outro projeto? Quando retirou o apoio a Bruno de Carvalho?
Não, nem se pense nisso. Nunca. Quando retirei o apoio a Bruno de Carvalho, fi-lo porque achei que o senhor estava a destruir aquilo que tinha feito. Sempre tive esperança de que aparecesse outra pessoa com capacidade, porque nem eu nem o José Eduardo somos os únicos. O Sporting, graças a Deus, tem muitas soluções de pessoas que poderiam ajudá-lo, e que amanhã serão o seu futuro. Dou o exemplo do Tomás Froes, do Samuel Almeida, do Miguel Poiares Maduro, do Rui Calafate... Tantos que podem amanhã ter capacidade para isso. Mas, como não apareceu ninguém... Isto não é um problema de idades, não é por serem jovens que dizemos que as pessoas que estão a concorrer não têm capacidade. Não têm agora, nem daqui a 30 anos. Como não apareceram, nós decidimos, no final de julho, avançar.
Se for eleito, encontrará um clube dividido e em dificuldades financeiras. Qual dos dois aspetos o preocupa mais?
Os dois, mas a maior preocupação é a dívida. Estamos em dificuldade financeira fruto da balcanização que transformou o Sporting. O Sporting não ganha nada de absolutamente significativo no futebol há muitos anos. Já teve equipas tão boas ou melhores do que as dos rivais, já teve treinadores melhores do que os dos rivais, e não ganhou nada. Isto é porque as lideranças têm falhado. Achamos que, se não ganharmos, vai ser outra vez a mesma história, mas com uma consequência mais grave: é que a situação do Sporting já é bastante grave, e, além disso, o fosso para os outros, por causa da Liga dos Campeões e das fortunas que se estão a pagar, vai aprofundar-se. Espero que os sócios tenham consciência disso.
Por onde se começam a resolver os problemas financeiros do Sporting?
Vamos ter de ter um conjunto de soluções, que já as temos em cima da mesa. Não vou dizer os investidores, isso mostra incompetência e infantilidade. Nunca se anunciam os investidores antes de fechar as operações. Temos um conjunto de investidores, seja na parte da dívida, seja na parte do capital, que, mantendo a SAD maioritariamente do Sporting, nos permitirá fechar este buraco por onde o Sporting está a meter água todos os dias. Depois, a partir daí, passamos a ter uma gestão que nos permite finalmente ser campeões nacionais. O que, aliás, é fundamental para ficarmos do outro lado do fosso.
Faz questão de que o clube mantenha a maioria da SAD?
Connosco, o Sporting terá a maioria do capital da SAD. Se não for connosco e vier uma destas listas de principiantes, tenho a certeza absoluta de que o clube vai perder a maioria da SAD.
Recuperar a confiança de investidores como Álvaro Sobrinho é fundamental?
É evidente. Só num clube que vive em esquizofrenia é que se maltrata os acionistas minoritários da sua principal empresa. Num clube normal, já se viu alguém maltratar os acionistas? Eu nunca vi... Mas no Sporting temos sempre essas originalidades.
Um dos maiores desafios do próximo presidente será lidar com a situação de Bruno de Carvalho?
Se esses estagiários ganharem, de certeza que vão 'levar' com ele. Os sócios depois que não se venham chorar. Temos que vir outra vez para o tirar de lá. Depois amanhem-se.
Se o Sporting não conseguir colocar ponto final no jejum de títulos vai passar a competir entre o Sporting de Braga, o Vitória de Guimarães e o Rio Ave
Terá necessariamente de haver um menor investimento no futebol?
Se o Sporting continuar a ter todos os anos uma diferença de 60 ou 70 milhões de euros para os rivais, vai começar a jogar entre o Sporting de Braga, o Vitória de Guimarães e o Rio Ave. Se quiserem isso, votem nos ditos estagiários, nas pessoas que vão ter aprender a ser presidente do Sporting.
Não equaciona, então, recorrer ao mercado para contratar um jogador livre no imediato?
Não, não. Aliás, quero aproveitar para dizer que o presidente Sousa Cintra fez um magnífico trabalho. Segundo sei, conseguimos, entre empréstimos, vendas e dispensas, reduzir consideravelmente o número patético de jogadores que tínhamos. Ainda não sei exatamente o número, mas não quero deixar de dar os parabéns ao presidente Sousa Cintra.
Sousa Cintra disse que montou um plantel capaz de lutar pelo título. Vê essa capacidade nestes jogadores?
Vejo. Estamos atrasados, começámos mais tarde, com a situação que se sabe... O facto é que, apesar disso e de não estarmos a jogar o que necessitamos, vamos à frente no campeonato. Tenho esperanças de que, quando começarmos a jogar mais, possamos lutar pelo título, já que com as dificuldades que enfrentamos estamos à frente.
José Peseiro é, então, para manter?
Nós cumprimos com os compromissos assumidos pelo clube. O José Peseiro foi contratado, neste momento é o nosso treinador e é ele que vai continuar. Acho que tem feito um magnífico trabalho para a situação que encontrou, e que voltará a repetir-se se esses estagiários ganharem as eleições.
Consegue garantir que o Sporting irá colocar um ponto final no jejum de títulos se for eleito?
Com certeza, foi por isso que nos candidatámos. Porque, se o Sporting não conseguir colocar ponto final no jejum de títulos vai passar a competir entre o Sporting de Braga, o Vitória de Guimarães e o Rio Ave. Vai passar a ser o nosso campeonato, depois haverá outro entre FC Porto e Benfica. Querem isso? Então façam outras opções que não a nossa.
O investimento nas modalidades é para manter?
Vamos trabalhar para que as modalidades continuem a ganhar. Agora, connosco, vai haver rigor orçamental e não bandalheira, que é o que se passa hoje em dia, em que não se façam orçamentos nem se contabilizam os gastos. O Sporting é uma empresa, que é algo que acho que alguns candidatos ainda não perceberam, porque nem sabem o que é uma empresa. Mas isso os sócios que decidam. A partir de agora, a minha conversa é esta. Não querem... Passem bem.
Vê-se a ser presidente durante tanto tempo quanto Luís Filipe Vieira ou Pinto da Costa?
O tempo suficiente para conseguirmos retomar a liderança do futebol nacional e tornar o Sporting num clube europeu. Queremos ser uma direção europeia, não nacionalzinha, a discutir balneários, com todo o respeito para quem faz isso. Isso é ridículo. Vamos transformar-nos numa direção europeia e o Sporting num clube internacional e grandioso.
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