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"Representávamos outro tipo de coisa que os Excesso não representavam"

Há 30 anos receberam o primeiro cachet por um concerto numa festa de passagem de ano. Desde então foi sempre a 'somar pontos', ou melhor, álbuns e fãs. No ano de comemoração dos 20 anos de carreira profissional, os Anjos são os entrevistados do Vozes ao Minuto.

"Representávamos outro tipo de coisa que os Excesso não representavam"
Notícias ao Minuto

26/11/18 por Mariline Direito Rodrigues e Patrícia Martins Carvalho

Fama Anjos

'Ficarei', 'Quero Voltar', 'Perdoa', 'Numa Noite Branca', 'Bem Longe num Sonho Meu'... A verdade é que poderíamos ficar aqui durante várias linhas de texto a enumerar as músicas dos Anjos que foram verdadeiros sucessos.

Em miúdos animavam as festas de familiares e amigos, depois surgiu o projeto Sétimo Céu e, finalmente, a marca Anjos. Volvidos 20 anos, o balanço é mais do que positivo.

Nelson e Sérgio Rosado dizem com orgulho ao Notícias ao Minuto que a sua carreira é "uma das bem felizes" que existem no panorama musical nacional.

E feliz é também a relação com os fãs, especialmente as fãs, como não poderia deixar de ser. É com admiração que constatam que "as miúdas de há 20 anos são agora mulheres e vão aos concertos com a família toda", o que não é coisa pouca para uma banda que muitas vezes foi rotulada com "tudo o que era foleiro", apenas por seguir um género musical pop.

Olhando para trás, sente-se aquela saudade dos primeiros tempos: das multidões que gritavam pelos seus nomes, das montras que racharam com a pressão das fãs, das rádios locais que visitaram e até das coreografias.

O mais recente ponto alto da carreira foi o lançamento de 'Eterno', a música que Sérgio escreveu para cantar à mulher no dia do seu casamento. A partilha com o público foi obrigatória. "Não podia ser egoísta", explicou.

Como era a vossa relação quando eram crianças?

Nelson: Eu era o mais reguila, o mais traquina. Mas nós dávamo-nos bem. É uma questão de personalidades e as nossas jogam bem uma com a outr. E depois o ambiente familiar, a harmonia que existia em casa também fazia com que nos déssemos bem no plano pessoal e, depois também, no profissional.

Mas andavam muito de candeias às avessas um com o outro?

Sérgio: Tivemos uma relação de irmãos muito idêntica a quase todas as famílias. Claro que tivemos situações complicadas, como todos os irmãos, e a nossa mãe é que sofria porque na altura trabalhava em casa então passava muitas horas connosco [risos].

A harmonia familiar foi transportada para o âmbito profissional?

Nelson: Sim e é engraçado transpor isso para o trabalho. A verdade é que ganhámos o hábito de trabalhar juntos desde sempre, desde muito pequeninos.

Sérgio: E sempre houve química e empatia em palco. Às vezes a nossa forma de pensar pode levar a algum choque em determinados momentos, mas o que é interessante é que o produto final fica bastante enriquecido.

Já aconteceu entrarmos assim um bocadinho aziados, mas o palco é como que um remédio.Já aconteceu subirem ao palco chateados um com o outro?

Sérgio: Já aconteceu entrarmos assim um bocadinho aziados, mas o palco é como um remédio. Não me recordo de nada que tenha corrido mal num concerto por estarmos chateados.

Nelson: Em estúdio já aconteceu, mas nada de grave. Acaba por ser sempre tudo ultrapassado, porque temos personalidades que se conjugam e completam.

Notícias ao MinutoO Nelson tem 42 anos e o Sérgio 38. Ambos nasceram em fevereiro© Facebook/Anjos 

Como é a personalidade do Nelson?

Sérgio: O Nelson é muito mais hiperativo e enérgico do que eu. Ele é obcecado com a perfeição das coisas, com os pormenores, com a organização do dia a dia. Eu sou muito mais tranquilo, muito mais relaxado

Não existem carreiras perfeitas mas há, de facto, umas bem felizes e a nossa é uma delas E a do Sérgio?

Nelson: O Sérgio tem um lado muito mais criativo que é importantíssimo . Acabamos por conjugar essas duas personalidades completamente diferentes. Não existem personalidades perfeitas, nem carreiras perfeitas, mas há, de facto, umas bem felizes e a nossa é uma delas.

Vocês começaram a cantar e a tocar muito cedo. Quando foi o primeiro espetáculo com direito a cachet?

Nelson: Foi em 1988, em Almada, numa passagem de ano. Era uma festa com amigos e familiares, mas eles acharam por bem dar-nos um cachet. Daí que assumamos que começámos a cantar e a tocar – como amadores – há 30 anos.

E como profissionais?

Sérgio: Há 20 anos. Foi quando começámos a gravar o álbum ‘Ficarei’ e a marca Anjos foi registada, em outubro de 1998. Mas o álbum só saiu em 1999.

Notícias ao MinutoIrmãos Rosado no início da carreira enquanto Anjos© Facebook/Anjos

No ano passado lançaram o álbum ‘Longe’, mas estiveram cinco anos longe dos estúdios...

Sérgio: Sim, é verdade que estivemos um pouco ausentes no que diz respeito a discos lançados, mas não estivemos afastados. Nós somos muito de performance, vivemos muito do contacto com o público e, felizmente, nunca precisámos de fazer muita promoção e talvez tenha havido aqui um erro de estratégia que já está identificado.

Por que motivo não precisavam de apostar na promoção?

Sérgio: Porque concerto gerava concerto. Houve uma altura em que lançávamos um disco praticamente todos os anos. Depois surgiu o projeto de fazer um álbum acústico e correu tão bem que prolongámos mais um ano, ou seja, estivemos dois anos com aquele disco em várias salas de todo o país.

Foi por isso que as pessoas tiveram a sensação de que haviam estado ausentes?

Nelson: A questão é que não fomos aos coliseus, andámos pelas salas de Braga, Évora, Beja, Guimarães com promoção local. São digressões que nos enchem o ego e nas quais se contam histórias sobre as canções, não se canta apenas.

São espetáculos mais intimistas?

Sérgio: Sim e não tínhamos um espetáculo igual, era consoante o nosso estado de espírito e o próprio público. No concerto de Guimarães foram quase três horas no palco, as pessoas não nos deixavam sair e as pessoas do teatro, coitadas, a quererem ir embora [risos].

Clique deu-se quando olhámos para o público à frente dos palcos e vimos uma geração nova a cantar as nossas músicas

O disco saiu no ano passado, mas o single ‘É o Amor’ foi lançado há dois anos. Sentiram-se pressionados a fazê-lo?

Sérgio: A verdade é que tínhamos de lançar qualquer coisa nova. E esse clique deu-se quando olhámos para o nosso público à frente dos palcos e vimos uma geração nova a cantar as nossas músicas. Aí percebemos que tínhamos de lançar o disco o mais depressa possível.

Qual é o desafio que se coloca perante uma geração nova de fãs?

Sérgio: O desafio foi atualizar o nosso som sem que perdêssemos a identidade. Começámos com um registo muito pop - ‘Perdoa’, ‘Ficarei’, ‘Quero Voltar’ - e depois fomos sempre acompanhando e evoluindo.

Os pais passam o gosto pelos Anjos aos filhos. É muito engraçadoQuem é vai aos concertos dos Anjos?

Sérgio: É o público da nossa geração que já não vai tantas vezes porque tem as famílias, mas que quando pode vai e leva a família toda. Os pais passam o gosto pelos Anjos aos filhos. É muito engraçado.

Nelson: São as miúdas de há 20 anos que agora são mulheres e têm maridos e filhos e vão todos. Quando sabem que há um concerto dos Anjos organizam-se para ir e têm uma espécie de revenge pessoal. É muito giro.

As pessoas ainda compram discos?

Nélson: Compram. O nosso público gosta de ter a capa e de juntar à coleção. É claro que agora é diferente. Nós temos discos de platina que na altura equivaliam a 40 mil CD vendidos, agora só equivalem a 10 mil.

Essa mudança foi de fácil adaptação para os Anjos?

Sérgio: Sentimos que tínhamos de dar aqui uma volta para acompanhar os novos cenários que iam surgindo, a questão do YouTube, por exemplo, perdemos essa fase. Já chegámos tarde.

Houve uma fase em que não se ligava muito à música portuguesa, mas agora houve um regresso em força.

Nelson: E muito devido a uma nova geração. Geração essa que participa, sem preconceitos, no nosso álbum ‘Longe’.

Antigamente a pop era misturada com tudo o que era foleiro Porquê sem preconceitos? Já houve preconceitos?

Nelson: Antigamente a pop era misturada com tudo o que era foleiro, uma ideia que era difundida por uma determinada elite que quando não conseguia alocar o teu estilo de música alocava-o ao género pimba. Hoje em dia isso já não existe.

É a perceção do que é português que está diferente?

Nelson: Hão-de reparar que hoje em dia tudo o que é tradicional está a ser valorizado. Temos vários exemplos disso: as tascas, os barbeiros, os alfaiates… Na música isso também aconteceu, mas nós nunca mudámos radicalmente a nossa cena.

Sérgio: E somos uns felizardos por continuarmos a fazer aquilo de que gostamos.

Quando lançámos o ‘Ficarei’, em 1999, fizemos uma tour pelas rádios locais O que também está diferente hoje é a forma de se relacionarem com os fãs.

Sérgio: Sim, quando começámos não havia redes sociais. Mas isso foi muito bom para nós, porque conhecemos outra realidade e era bom que os artistas de agora pudessem passar por essa fase. Quando lançámos o ‘Ficarei’, em 1999, fizemos uma tour pelas rádios locais do nosso país durante quase um mês... algumas eram em caves e nós chegávamos à vila ou aldeia e estavam todos à nossa espera!

Era difícil lidar com as fãs?

Sérgio: Foi algo que também foi evoluindo, tal como nós. Mas passámos por coisas incríveis, as pessoas não fazem ideia.

Representávamos um outro tipo de coisa que os Excesso não representavamNelson: Para entrarmos nos estúdios da Valentim de Carvalho tínhamos mil e tal adolescentes à porta, os seguranças tinham de nos ir buscar. Nós representávamos um outro tipo de coisa que os Excesso não representavam. Em termos musicais estaríamos num registo diferente do deles, apesar de a linha ser pop e de atingirmos basicamente o mesmo público. Mas havia ali uma franja de público que gostava muito de nós, mas não gostava deles.

Algum episódio desse género que vos tenha marcado?

Sérgio: Houve uma sessão de autógrafos na Valentim de Carvalho do Rossio [que já não existe]. A pressão por dentro era tão grande que as montras racharam. Havia alturas em que os seguranças agarravam em nós e começavam a correr, que era só a pior coisa que se podia fazer [risos]. Depois com o decorrer do tempo começámos a perceber que as pessoas só queriam uns beijinhos, autógrafos e conversar.

Ainda sobre essa época. Quem teve a ideia de fazer o videoclipe do ‘Perdoa’ daquela forma?

Nelson: [Risos] Foi a produtora. Naquela época havia vários vídeos que marcaram muito. Lembro-me de um do Ricky Martin em que ele dançava à chuva e nós tínhamos a idade e o estilo que apelava muito ao ‘sex appeal’.

Sérgio: Mas esse videoclipe tem uma história que agora é engraçada, mas na altura assustámo-nos. No dia em que o gravámos no Parque das Nações estava tanto, mas tanto calor, que uma das bailarinas desmaiou com o impacto da água que era lançada por um camião dos bombeiros.

Hoje em dia não sentem saudades das coreografias?

Sérgio: Isso foi algo que se foi perdendo com o tempo, até porque houve uma fase em que as músicas eram mais pop/rock e tínhamos banda e não dava para fazer coreografias.

Nelson: E também vais envelhecendo [risos]. Mas foi uma fase muito gira da qual nos orgulhamos muito e olhamos para isso com saudades.

Qual é a vossa música preferida?

Sérgio: Temos várias que nos marcaram, as várias fases de sucesso coincidiram com determinadas músicas.

Nelson: Para mim, a balada mais bonita que eu já cantei até hoje é a música que o Sérgio escreveu agora para a Andreia, ‘Eterno’.

Acho que era egoísta da minha parte esconder aquele dia E foi um sucesso nas redes sociais porque as imagens do casamento foram partilhadas com o público. Porquê?

Sérgio: Tinha de partilhar aquele momento, um dos mais felizes da minha vida, com o público. Acho que era egoísta da minha parte esconder aquele dia.

Como foi escrever aquela música que é um resumo da sua história de amor com a Andreia?

Sérgio: A última vez que tinha escrito letra e música tinha sido no primeiro álbum, há 20 anos. Acho que agora foi o recuperar do meu lado mais poético.

Nelson: O engraçado é perceberes que a música é quase a história de amor de toda a gente.

Vinte anos depois sentiu-se inseguro?

Sérgio: Não é fácil. Lembro-me de que escrevi a música e depois cruzei-me com a Carolina Deslandes no estúdio e mostrei-lhe. E ela ouviu, olhou para mim e perguntou-me: ‘queres que te diga o quê? Está perfeito’. Fiquei mais descansado, mas depois achei que ia correr mal na igreja, porque não iria conseguir cantar. Aliás, no vídeo vê-se várias vezes que estou a cantar de olhos fechados, exatamente para me conseguir concentrar.

Ver o meu filho trazer a mãe ao altar foi incrível Foi um momento muito marcante…

Sérgio: Foi! E ver o meu filho trazer a mãe ao altar foi incrível. Ter os filhos a assistir ao casamento é muito especial. E é muito engraçado porque vários casais partilharam connosco que viram o vídeo e decidiram que era o momento de também eles casarem.

E para ti, Nelson? Como foi?

Nelson: Eu próprio tive de fixar o olhar no horizonte para não chorar. Estava toda a gente a chorar, até o próprio coro gospel quando entrou começou a chorar…

A música foi escrita para a Andreia, mas agora é de todos até porque foi editada. Ela lida bem com isso?

Sérgio: Ela já está habituada [risos]. Mas há uma música que é só dela e que nunca a vou editar.

No próximo ano arranca a tour ‘20 anos’. Estão preparados?

Nelson: Claro. O primeiro grande concerto de arranque será no Coliseu do Porto, a 23 de março.

Porquê começar a Norte?

Nelson: É uma forma de homenagear e de dar um carinho aos nossos fãs do Norte que estão sempre a queixar-se de que tudo o que acontece é sempre em Lisboa

E onde é que vai terminar?

Sérgio: Para já é surpresa, mas podemos adiantar que vai ser um espetáculo completamente diferente.

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