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"Sistema económico criou a ideia de termos de viver uns contra os outros"

José Diogo Madeira é o entrevistado de hoje do Vozes ao Minuto.

"Sistema económico criou a ideia de termos de viver uns contra os outros"
Notícias ao Minuto

26/02/19 por Beatriz Vasconcelos

Economia José Diogo Madeira

José Diogo Madeira é a prova de que nunca é tarde para mudarmos de rumo. Começou por ser jornalista e foi um dos fundadores do Jornal de Negócios, do qual foi diretor até 2002. Depois, enveredou pelo mundo empresarial e esteve à frente de uma agência de comunicação, de uma start-up tecnológica e de uma editora. Até que tudo isto deixou de fazer sentido. E quando as coisas deixam de fazer sentido, é altura de mudar. 

Foi quando entrou no mundo da meditação que se reconheceu e agora reúne pessoas em sessões meditativas em Portugal e lá fora. O próximo passo é a abertura de um centro de meditação na Ilha das Flores, no Arquipélago dos Açores.  

Antes disso, esteve à conversa com o Notícias ao Minuto a propósito do seu novo livro, o 'Volta a Ti'. Mas esta conversa foi mais do que sobre isso. Foi uma conversa acerca da sociedade, do sistema económico, da importância da cooperação, bem como da impossibilidade de vivermos em competição constante uns com os outros. 

O ambiente é ultra competitivo, de certa maneira é uma terra em que é preciso fazer de tudo para sobreviver e há pouca solidariedade entre as pessoasO José Diogo estudou economia, foi cofundador do Jornal de Negócios e envolveu-se no ramo empresarial. "Este foi o destino que o trouxe até aqui", como começa por dizer no livro. O que é que o levou a mudar de rumo?

Não sei. Acho que foi o destino que me trouxe até aqui. Não sei, talvez tenha estado muitos anos a trabalhar no meio empresarial, primeiro como jornalista e depois como gestor de empresas. Às tantas houve um esgotamento do sentido profissional e até pessoal, portanto, há cerca de dois/três anos comecei de forma natural a enveredar por um outro percurso. Não houve uma razão em específico, foi talvez um cansaço de todo aquele meio empresarial e de uma vida que para mim já não fazia sentido.

E por que razão essa vida já não fazia sentido? Deixou de se reconhecer tanto no mundo empresarial como no jornalismo?

O jornalismo foi a primeira fase profissional da minha vida, que durou para aí uns dez anos, só depois é que passou para as empresas. Talvez porque o mundo das empresas seja um mundo demasiado agressivo, no sentido em que as pessoas andam a correr atrás de objetivos que acabam por ser castelos de areia.

Por outro lado, o ambiente é ultra competitivo, de certa maneira é uma terra em que é preciso fazer de tudo para sobreviver e há pouca solidariedade entre as pessoas. Pensei um bocado nisso tudo e achei que já não fazia sentido continuar a lutar por uma coisa que para mim já não fazia sentido.

As empresas para sobreviverem precisam de que as outras não estejam tão bem como elasE no jornalismo isso também acontecia?

Não, no jornalismo era diferente. Eu também era mais novo. O jornalismo, ainda assim, é uma profissão diferente. Talvez até mais divertida. O jornalismo tem um fundo quase poético muito bonito, que é descobrir e pôr a verdade aos olhos de toda a gente. Quando é feito de forma séria e profunda, de facto, acaba por até por prestar uma função social em prol de todos.

Do jornalismo até tenho algumas saudades. Quando era bem feito, com qualidade e com meios para isso. Mas a vida é mesmo assim, acabou-se o tempo no jornalismo, passei para as empresas e aí é mais difícil… é hiper competitivo e as pessoas ultra competem umas com as outras e isso começa logo porque as empresas têm de competir no mercado com os seus produtos. As empresas para sobreviverem precisam de que as outras não estejam tão bem como elas.

Depois, dentro de cada empresa também há muita competição. E a competição acaba por ser até um estado pouco natural da humanidade, porque se todos competirmos só sobra um, que é o vencedor, os outros todos ficaram pelo caminho.

Achei que era melhor estar em ambientes em que as pessoas fossem colaborantes, que todos pudessem lucrar ou beneficiar do esforço coletivo e não tanto naquela lógica de que ‘eu para sobreviver tenho de aniquilar a concorrência toda’.

Para que as pessoas possam ter uma vida em paz é preciso que este espírito de competição seja substituído pela lógica da cooperação entre todosAgora que está de fora e consegue ver as coisas de uma outra perspetiva, o que é que poderia ser feito para melhorar esses pontos menos positivos, que são a competição, a concorrência, os objetivos?

Desde logo, as pessoas perceberem que o mundo e o que fazemos dele resulta do esforço coletivo. A própria sobrevivência da Terra como planeta, neste momento, só vai resultar se as empresas e os países cooperarem uns com os outros, no sentido de garantir garantir as condições para que a sustentabilidade ambiental se consiga e a alteração climática seja revertida. Isto é um mundo em que os países e as empresas cooperam e não competem.

Por exemplo, qual é o sentido em que a Coca-Cola e a Pepsi competem? Os produtos são quase os mesmos, mas as empresas são obrigadas a fazer campanhas de marketing umas contra as outras, ambas têm de dizer que o seu produto é melhor e isso só aumenta o sentido de separação entre as pessoas.

Desde pequeninos que somos ensinados a competir para sobreviver, até porque depois existe aquela lógica de que só os melhores sobrevivemPara o planeta Terra sobreviver com condições de habitabilidade, para que as sociedades possam viver confortavelmente e até para que as pessoas possam ter uma vida em paz é preciso que este espírito de competição seja substituído pela lógica da cooperação entre todos.

Esse sentido de cooperação aplica-se também ao panorama económico do país?

Aplica-se a qualquer país e em qualquer situação. Imaginemos seis pessoas perdidas numa ilha: se elas competirem umas contra as outras para garantirem os recursos que lhes garantem a vida – apanhar uns peixes ou uns animais selvagens que ali andem, recolher umas raízes e umas plantas para comerem –, se competirem por isso, o que pode acontecer é que sobrevive uma ou duas mas as outras quatro morrem à fome. Portanto, a solução distinta que é as pessoas cooperarem para conseguirem extrair o melhor dessa ilha, provavelmente resulta em [todas] as pessoas conseguirem sobreviver. Acho que o que se passa nas cidades, nas famílias e no planeta, falando de uma forma mais global, é isso.

Desde pequeninos que somos habituados a competir. Logo na escola, aos seis ou sete anos, dizem-nos que o que é bom é ser o melhor da turma, ser o melhor no desporto, no futebol, o melhor nisto e o melhor naquilo. E os pais – até porque querem o melhor para os filhos – não o fazem por mal, mas começam logo a replicar essa ideia de ser o melhor. As crianças que não conseguem ser as melhores ficam tristes. Portanto, desde pequeninos que somos ensinados a competir para sobreviver, até porque depois existe aquela lógica de que só os melhores sobrevivem.

A meditação permite que retornemos a um estado mais calmo e até evita que depois tenhamos algumas reações que podem não ser as mais bonitasEntão a meditação surge aqui como um refúgio ou mesmo como um estilo de vida?

A meditação é mais um modo de vida. Primeiro porque consegue acalmar aqueles momentos em que estamos mais perturbados emocionalmente, conseguimos ficar calmos, serenos e isso ajuda. Por exemplo, quando estamos no trânsito e alguém nos buzina, ou na empresa quando estamos muito chateados com um colega que fez qualquer coisa que nos prejudicou ou que nos pode prejudicar. De certa maneira, a meditação permite que retornemos a um estado mais calmo e até evita que depois tenhamos algumas reações que podem não ser as mais bonitas.

A meditação também também nos ajuda a ver que, naquilo a que chamamos sociedade moderna ou sociedades ocidentais, andamos todos a correr de um lado para o outro, a competir para garantir que não nos vão despedir, que vamos continuar a ter emprego… mas depois passamos a vida nisto e quando olhamos para trás pensamos no que é que andamos aqui a fazer, porque o que aqui deixamos é muito pouco. A meditação é um modo de olhar para as coisas de uma forma, simultaneamente, mais distante, mas também mais profunda. Mais distante no sentido em que conseguimos ver as coisas de uma forma menos imediata e até menos pessoal, conseguimos observar melhor o que nos acontece. E isso ajuda.

Neste caso é pensar 'não vou responder a este senhor, não vou guardar isto comigo e vou conseguir de uma forma calma e tranquila fazer com que haja uma dissolução da corrente negativa'Muita gente, realmente, aponta a meditação como uma forma de ‘fugir’ ao stress do dia a dia, mas como é que se explica isso às pessoas? Como é que se ensina uma pessoa a utilizar a meditação para gerir o stress?

A meditação concentra muitos dos seus exercícios e da sua prática na respiração, numa respiração mais calma, mais profunda, mais tranquila. Isso é algo que todos nós sabemos, e que quando alguém está mal dizemos ‘respira fundo que isso passa’ e de facto uma respiração mais profunda acalma. A respiração mais profunda ajuda logo a reduzir os níveis de ansiedade e de stress, mas a meditação quando praticada regularmente, ou com alguma recorrência, também nos permite observar as coisas com um maior cuidado.

Permite que quando estamos no trânsito e alguém por um motivo qualquer desata a buzinar ou a insultar - às vezes porque cometemos uma pequena falha, somos todos humanos – que tenhamos calma. Além disso, a meditação dá-nos uma perspetiva adicional, que é a seguinte: ‘se calhar este senhor que está aqui a chamar-me nomes teve um dia terrível e houve ali uma corrente de coisas negativas que o levou a aproveitar isto para exteriorizar este stress todo e a disparar estas coisas todas para cima de mim’. E posso fazer duas coisas: posso voltar a disparar para ele e se ele buzina eu buzino duas vezes mais alto e levo isto para casa e vou passar isto para a minha família, alimentando a corrente de stress e raiva, ou então faço outra coisa que é dissolvê-la e, portanto, isto vai parar em mim. Neste caso é pensar ‘não vou responder a este senhor, não vou guardar isto comigo e vou conseguir de uma forma calma e tranquila fazer com que haja uma dissolução da corrente negativa’. A meditação ajuda muito nisto, em conseguir gerir as emoções, as nossas, que muitas vezes acabam por passar para as pessoas que estão ao nosso lado.

 O sistema económico montou esta ideia de que todos nós temos de conviver uns contra os outros, porque só os melhores vão sobreviverA compreensão seria essencial para resolver alguns problemas da sociedade, como a falta de paciência? Considera que este problema se acentuou nos últimos anos? Hoje as pessoas têm menos paciência umas para as outras?

Acho que nós, nas cidades, temos uma vida muito stressante, por dois ou três motivos. Primeiro porque as cidades têm mais gente, mais carros, mais confusão no metro, os transportes públicos estão mais cheios, nas grandes cidades com muitos turistas parece que eles ocupam os lugares todos do autocarro e, portanto, torna-se mais difícil a vida nas cidades. Há mais prédios, mais altos e menos jardins. Por outro lado, a vida dentro das empresas é mais competitiva, porque de facto o sistema económico montou esta ideia de que todos nós temos de conviver uns contra os outros, porque só os melhores vão sobreviver e só os melhores vão ter os melhores salários, ter convites, etc.

De uma forma instintiva e quase, infelizmente, natural, estamos nas empresas com medo dos colegas, em vez de cooperar com os colegas, achamos que eles são nossos concorrentes e não nossos colegas no sentido de colaborador. Temos uma atitude que é ‘eu tenho de me safar’ e, portanto, não estou aqui para ajudar ninguém, eu estou aqui para sobreviver. E isso produz maus resultados até para as empresas, porque é o salve-se quem puder. Depois as pessoas ficam com essa atitude competitiva e é péssimo porque vivem stressadas, com medo de serem despedidas e tornam-se agressivas para os outros. É um mundo em que, às tantas, as pessoas estão disponíveis, inadvertidamente, para darem uma bofetada ao colega do lado. Todos temos de sobreviver. E o sistema económico está baseado nisso, estimula imenso a competição para que as pessoas façam o possível e o impossível para serem mais produtivas.

Acho curioso isso da produtividade, como se as pessoas tivessem de ser produtivas. A produtividade é uma medida das máquinas, as pessoas não nasceram para ser produtivas. Somos seres humanos. Se houver um dia em que não nos apetece ir trabalhar, as empresas deviam perceber ‘ok, esta pessoa não está bem, não trabalha hoje, porque também se viesse cá não ia fazer grande coisa. Mais vale ir passear e amanhã volta melhor’. Só que está tudo formatado para que isto não aconteça.

Se é que se pode classificar uma pessoa, que indicadores é que deveriam ser tidos em conta?

A capacidade de cooperar e não de competir. Nas escolas, as crianças deveriam ser ensinadas a cooperar e não a competir. Mesmo o sistema das notas é perverso, porque nos primeiros anos do liceu as crianças são avaliadas com notas e há ali logo uma competição sobre quem é o melhor da turma e ‘tu tiveste um 5 e eu um 4’… e há crianças que não têm capacidade para estudar ou para ter boas notas, mas isso não quer dizer que não sejam pessoas inteligentíssimas, mas o estudo da matemática ou do português não lhes corre tão bem e, por isso, não têm tão boas notas. Só que o sistema está feito para que as pessoas corram umas contra as outras, para que compreendam que estão aqui para ser o melhor porque só os melhores é que vão ter um bom futuro.

E os pais – de boa vontade – também insistem nisso, mas deviam era dizer ‘estuda o que precisares para seres o mais feliz da tua turma’, porque de facto o que é preciso é que as crianças aprendam a felicidade, a gerir emoções… Até é curioso como é que os jovens saem da escola a saber muitas coisas sobre matemática, português, geografia ou inglês, mas não haja ninguém que fale com eles sobre a gestão das suas emoções e isso reflete-se quando são mais velhas e não sabem gerir a raiva ou o medo. E, depois, claro que Portugal tem um dos maiores consumos de ansióliticos do mundo, porque as pessoas andam todas stressadas e deprimidas. Por isso é que a avaliação nas escolas deveria ser feita com base, numa parte, no esforço pessoal e a outra parte deveria ser a nota da turma toda. Isto para que cada um estivesse empenhado, de forma cooperativa, para que todos tivessem a melhor nota possível.

Este livro, 'Volta a Ti', desafia as pessoas a cooperarem ou a meditarem?

O livro é uma viagem pela nossa própria consciência para nós percebermos quem somos. E nesse sentido é um livro intimista. A proposta do livro é a seguinte: tu, que estás aqui a ler-me, senta-te aí um bocadinho durante 5 ou 10 minutos num sítio onde estejas tranquilo e não tenhas nada para fazer e faz uma pergunta a ti próprio que é ‘quem é que tu és?’. A partir daqui o livro é como se fosse uma viagem sobre a nossa própria existência, quem somos, qual é o nosso sentido de vida e o que é que andamos aqui a fazer. Quando estamos neste momento de auto-inquérito, a primeira resposta possível é eu sou o meu corpo, porque eu tenho um corpo, mas também sou a minha história pessoal, porque nasci há não sei quantos anos, já vivi isto e aquilo. Mas sou também as coisas que eu adotei como minhas, por exemplo, o clube de futebol ou o partido político’.

 Toda a gente tem um nome, mas nunca ninguém escolheu o seu nome próprio e o nome é uma marca fortíssima, porque faz muita diferença chamar-se, por exemplo, Diogo ou EsdrubalMas se começarmos a olhar para isto de uma forma mais profunda, de uma forma meditativa, começamos a ver que isto são construções que fomos fazendo e que quando nos libertamos, aos poucos e poucos, destas camadas que temos sobre nós e que às vezes são coisas tão simples como a forma como nos vestimos, a música que nos gostamos, etc., são tudo construções que adotamos mais ou menos conscientemente. Até os amigos que escolhemos. E depois o que fica no fim é uma coisa muito mais simples, que é como se fosse uma consciência de tudo isto.

Isso pode mostrar-nos que não é tarde para mudar?

Sim. Adotamos muitas construções, algumas são induzidas e outras são mais ou menos conscientes, mas há muitas coisas que nós somos porque aprendemos a ser assim, pela família, amigos ou escola. São muitas coisas que nós adotamos como nossas e estamos convencidíssimos que são nossas, mas que não somos nós que escolhemos – muitas vezes foram as circunstâncias que se manifestaram assim. Desde logo pelo nome, porque toda a gente tem um nome, mas nunca ninguém escolheu o seu nome próprio e o nome é uma marca fortíssima, porque faz muita diferença chamar-se, por exemplo, Diogo ou Esdrubal. Parecendo que não, faz. Porque até o próprio nome traduz um conceito, é como se fosse a marca, como os automóveis. Aquela sonoridade traduz um certo conceito. Às vezes perguntam-nos ‘quem é que tu és?’ e eu digo ‘eu sou o Diogo há não sei quantos anos’, mas de facto eu nem se quer escolhi que sou o Diogo, mas estou convencidíssimo que Diogo é um nome ótimo porque me habituei a ele. Por isso é que quando se pergunta às pessoas ‘gostas do teu nome?’ elas respondem que sim.

E o nome é um exemplo. Nós achamos ótimo coisas que alguém escolheu para nós e que achamos que são nossas. E quando começamos a ver isto tudo, vimos que somos o produto de uma série de construções que fomos metendo cá para dentro. Libertando-nos disto, de facto somos o que quisermos. Podemos reconstruir-nos da forma que quisermos e ser mais livres. E isso traz felicidade.

Por que motivo escreveu o livro em letras minúsculas?

Boa pergunta [risos]. Porque comecei a escrever e saía-me, naturalmente, sem letras maiúsculas. Depois, mais tarde, pensei: porquê letra maiúscula? Porque é uma regra, mas qual é a utilidade de escrever frases com letra maiúscula? Porque quando se começa uma frase percebe-se logo que há ali um começo. O ponto final e a vírgula são diferentes. Às tantas percebi que a letra maiúscula era uma letra, uma convenção gramatical e até social. Mas sem utilidade. Pelo menos, até à data,  não me apercebi de qual é. E saiu assim, já o livro anterior também tinha saído assim, e a editora achou que podia ser… e eu aproveitei.

Qual é o feedback que tem recebido?

Fica sempre mal falar em casa própria [risos]. Acho que as pessoas gostam muito, porque cada vez temos mais pessoas. As sessões são organizadas por uma comunidade que eu organizei com um amigo meu e que se chama Reflower. Começámos com isto há dois anos. No início tínhamos poucas pessoas, mas ao longo destes dois anos tivemos já mais de 33 sessões, em Portugal e lá fora. Cada vez aparece mais gente. E as pessoas vão repetindo. Estamos muito contentes e satisfeitos por vermos que as pessoas ficam contentes no final, quando estão a sair da sala vêm ter connosco e dizem ‘parabéns, adorei’.

Qual foi a razão por que escolheu a Ilha das Flores, no arquipélago dos Açores, para abrir o centro de meditação?

Fui lá uma vez e achei que aquilo tinha condições naturais fantásticas e recomendo a toda a gente que visite a ilha, porque aquilo é mesmo uma natureza fora do mundo. Como diz um amigo meu, quando lá estamos parece que estamos num parque jurássico. Tem aquela vegetação… faltam os dinossauros, naturalmente, mas parece que tem a vegetação desses filmes. E depois é uma ilha que está completamente ‘perdida’, porque está localizada no meio do Atlântico, entre Portugal e os EUA.

Quando colocamos pessoas que não se conhecem na mesma sala, em silêncio, as pessoas vão percebendo aos poucos que as diferenças que existem entre elas podem ser conversadasAs pessoas não sabem disto, e eu também não sabia, mas a Ilha das Flores e a Ilha do Corvo, que fazem parte do grupo ocidental dos Açores, ficam na placa tectónica da América do Norte e, portanto, do ponto de vista geográfico são dois pedaços de Portugal que ficam no continente norte-americano, o que é uma coisa curiosa. Aquilo está completamente isolado, tem 3.000 pessoas e uma dimensão semelhante à de Lisboa. Por isso é só imaginarmos a cidade de Lisboa sem prédios, com uma natureza muito verde e só com 3.000 habitantes… é só tranquilidade. Lá, consegue-se encontrar uma paz total. Tudo tranquilo. Não há trânsito, não há carros, passeia-se pelos trilhos… Achamos que é o local onde faz sentido termos uma estrutura onde possamos receber pessoas que vão lá meditar connosco.

José, para terminar, que problemas é que ‘ficar em silêncio numa sala’, como começa por citar Blaise Pascal, pode resolver?

Desde logo, o confronto. O silêncio é uma grande intimidade. Quando conhecemos uma pessoa, o momento em que existe silêncio e ninguém diz nada é mais constrangedor do que muitas vezes estarmos a falar de coisas irrelevantes, só para fazer conversa. Fica aquele silêncio em que as pessoas ficam intimidadas a olhar umas para as outras. Parece que é difícil estar em silêncio.

É preciso que esta ideia da competição seja substituída pela cooperaçãoQuando colocamos pessoas que não se conhecem na mesma sala, em silêncio, as pessoas vão percebendo aos poucos que as diferenças que existem entre elas podem ser conversadas e dialogadas. Todos podem perceber que fazemos parte da mesma coisa, somos todos animais, somos todos humanos mas somos todos natureza, vivemos todos neste planeta e temos muito mais a ganhar se formos uns com os outros do que uns contra os outros. Se formos uns contra os outros, um dia só fica um, mas o que fica vai ficar com um planeta cinzento e, provavelmente, sem condições de habitabilidade.

Notícias ao Minuto"Volta a Ti", publicado agora pela editora Planeta, é o quinto livro de José Diogo Madeira.© Planeta

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