"A doença trouxe-me muita coisa boa, trouxe-me de volta ao meu encontro"
Alda Gomes foi diagnosticada com artrite reumatóide há nove anos, doença que hoje em dia está mais do que controlada, mas não deixou de falar da mesma em conversa com o Notícias ao Minuto. Além da sua saúde, recordou ainda todo o percurso profissional, sem esquecer dos sonhos que faltam cumprir.
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Fama Alda Gomes
Com um rasgado sorriso do rosto, foi assim que Alda Gomes nos recebeu para recordar e partilhar alguns dos largos passos que já deu no mundo da representação.
Não nasceu num 'berço de ouro' e lutou para ver cumprido um dos seus sonhos: ser atriz. Cedo começou a trabalhar para conseguir a sua independência financeira, sem nunca deixar para trás a colo da família.
Hoje é a entrevistada do Vozes ao Minuto, uma conversa que não aborda apenas a sua caminhada entre os holofotes, como também se abre sobre a doença com que foi diagnosticada há nove anos: artrite reumatóide.
Aos 40 anos, e numa fase da vida em que quer essencialmente estar bem consigo mesma, o sonho de ser mãe mantém-se e este será um dos desejos que quer cumprir num futuro próximo.
Depois do casting que fez em 1997 para a série ‘Riscos’ conseguiu o seu primeiro trabalho em televisão. Após este projeto, ouviu muitos 'nãos' até conquistar a fama?
Não porque não tinha sequer arriscado ir a um. Na altura também não havia castings para televisão do conhecimento do público geral. Não é como hoje. Como aquilo foi um anúncio na televisão, tanto eu como milhares de pessoas fomos [ao casting]. Fiquei a fazer parte do elenco de figuração especial, que era a turma que dava apoio à turma dos protagonistas. Fizemos parte das duas temporadas, sempre os mesmos alunos. Era como se fosse uma turma verdadeira. Apesar de haver os protagonistas, de vez em quando, dizíamos umas falas. A mim deram algumas falas com a Alexandra Lencastre, ou com o Diogo Infante, a Cristina Carvalhal, o José Wallenstein, a Margarida Marinho e muitos mais…
Como foi interagir logo com esses atores de peso?
Uma felicidade enorme. Poder estar a realizar um sonho… Não comecei com um papel principal na televisão, comecei por fazer figuração.
E depois cresceu naturalmente…
Depois foi através de 'passa a palavra', falavam-me dos castings que haveria... Foi degrauzinho a degrauzinho até fazer um casting para a Endemol e ficar a conhecer o João Canijo e outras pessoas. Com esse casting, o João Canijo ficou a conhecer-me e escreveu um papel com o meu nome para o filme dele, ‘Ganhar a Vida’, com a Rita Blanco.
Não tinha apoio financeiro nenhum da minha família e tive de me fazer à vida. Arranjei um trabalho e quando podia vinha a Lisboa fazer curtas-metragens, que era o que aparecia mais na altura e nunca recebi nadaCresceu em Alenquer e já contou que decidiu começar a trabalhar antes de acabar o 12.º ano porque queria ter a sua independência financeira. Quais eram os maiores sonhos nessa altura?
Era poder ter uma profissão como atriz. Não fazia ideia como, nem onde, não tinha informações nenhumas. Ou então qualquer coisa que me desse independência financeira. Até trabalhei em imobiliárias. Na altura em que o filme foi filmado, depois de eu voltar de França, havia uma revista em Portugal que se chamava Premier e uma vez quiseram fazer uma pequena rubrica comigo, tipo a revelação, que era sobre uma imagem do filme do João Canijo. Uma das coisas que me perguntaram era o que é que eu estava a fazer e eu disse que estava a trabalhar na imobiliária. Então o título foi: ‘A Imobiliária é uma revelação’ (uma coisa assim do género).
Era tão miúda. Tinha 21 anos. Em cinema, em Portugal, há 20 anos, fiz aquele filme e depois tinha de esperar não sei quantos anos. Não tinha apoio financeiro nenhum da minha família e tive de me fazer à vida. Arranjei um trabalho e quando podia vinha a Lisboa fazer curtas-metragens, que era o que aparecia mais na altura e nunca recebi nada, nem para custos de viagens nem de alimentação. Tinha de trabalhar para poder durante o fim de semana, ou durante dois dias, [vir fazer esses trabalhos não remunerados].
No início do ano afirmou numa entrevista: “2019 é o meu ano. É o ano que vou viver para mim e para os meus, é o ano em que vou realizar o que realmente importa”. Está a conseguir concretizar os seus objetivos?
Sim. Sabe aquelas resoluções que fazemos no início do ano, aquilo que nós queremos e pretendemos, nem que seja para termos um guião e sabermos o que fazemos daqui para a frente em vez de deixar as coisas andar como sempre fiz... Queria algo mais concreto e fiz alguns planos. Estou a dedicar-me muito mais a mim própria. Não é só à família, estou a dedicar-me 89% a mim e o restante à família.
Tenho concretizado muito este lado de respirar fundo, olhar mais para mim, para dentro, tentar não ligar ao que os outros dizem sobre mim, ao que eu deva fazer, como é que eu deva estar fisicamenteSentia que precisava desse espaço para si?
Sim! Sempre me entreguei muito e sempre dei muito aos outros, estou a falar exclusivamente da minha família. Apoiar irmãos, mãe… E eu fico sempre em segundo ou terceiro lugar. Tenho a sorte de ter um namorado maravilhoso que me apoia e até me dá asas para voar. Tenho concretizado muito este lado de respirar fundo, olhar mais para mim, para dentro, tentar não ligar ao que os outros dizem sobre mim, ao que eu deva fazer, como é que eu deva estar fisicamente... É um trabalho que ainda estou a fazer e acho que não vai ser só o ano de 2019, vai ser o resto da vida. Olhar para dentro e aceitar-me exatamente como sou, não me preocupar, não ligar porque isto de estarmos na televisão e não trabalhar durante algum tempo mexe um pouco com a minha cabeça.
Começamos a duvidar de nós próprios?
Duvido da minha capacidade de ser boa profissional com a confusão que é a capacidade de ser boa para estar até dentro do meio. O que é que é mais importante? É mostrar que sou boa atriz, boa profissional ou que aparentemente estou dentro dos padrões? Acaba por ser um trabalho muito bonito e de descoberta interior.
Se não tenho muitas propostas de trabalho, se não estou a fazer um filme agora, uma série ou uma novela, o que é que eu vou fazer? Vou trabalhar o que tenho para trabalhar comigo que é a minha obra-prima, que sou euÉ importante conseguirmos reconhecer-nos a nós próprios para haver esse equilíbrio também depois para a profissão.
Exatamente, temos que viver a vida para representá-la. Temos de viver dificuldades, traumas, tudo… Já tive a minha dose, não quero mais, mas tenho de viver, tenho de ser um ser humano verdadeiro, honesto, para depois entregar aos outros o que tenho de melhor no meu trabalho.
E nessa fase pretende estar um pouco afastada da televisão para conseguir ter esse espaço para estar consigo mesma?
Eu aproveito o facto de não ter muitas propostas, para ser honesta. E tenho feito algumas coisas, este ano até fiz algumas coisas bastante diferentes e 'bora lá', atiro-me de cabeça e faço. Mas se não tenho muitas propostas de trabalho, se não estou a fazer um filme agora, uma série ou uma novela, o que é que eu vou fazer? Vou trabalhar o que tenho para trabalhar comigo que é a minha obra-prima, que sou eu.
Abriu este mês um estúdio de música…
Sim, abriu o Vasco [namorado]. Não terminámos ainda as obras, ainda falta pôr lá umas coisas para ficar com um ar industrial, como nós queremos. Mas tínhamos um produtor a dizer: ‘Vasco, é agora, temos o projeto, o disco do João Pedro Pais para fazer e tem de ser’. Então o Vasco acelerou um bocadinho as coisas e eu ajudei. Deu tanto trabalho mas ao mesmo tempo foi giro. Tenho fotografias do Vasco deitado no chão depois de ter posto tecidos numa parede inteira. Ele exausto, a transpirar até adormecer no chão.
Mas é um projeto dos dois?
Antes de conhecer o Vasco, em 2013, ele já tinha um estúdio que se chamava Plateia de Ilusões. Já mudou de sítio, fisicamente, para Lisboa, para a antiga Valentim de Carvalho, a escola de música. Entretanto, ele precisava de um espaço maior e andámos à procura de lojas em Lisboa, mas o valor [é alto]. Então pensámos, porque não abrirmos algo aqui à porta, em Almada? Descobrimos uma loja maravilhosa e fez um ano que comprámos o espaço. Temos tido muitas visitas de pessoas, artistas, produtores que vão de Lisboa com gosto para conhecer, visitar, estar e beber um café, falar… Este lado da música que estou a descobrir é maravilhoso, as pessoas são muito disponíveis.
Mas imagina-se a fazer ainda mais parte deste projeto?
Sim! Gosto muito de fazer produção e também estou a aprender ali muita coisa. É um espaço onde gosto de ir e falar da nossa vida, estar ali dentro. É muito bom, é uma coisa construída pelos dois e temos já projetos. O Benjamim [produtor] está a produzir o último disco do João Pedro Pais, também vamos lá ter o Rogério Charraz, sendo que a produtora vai ser a Luísa Sobral, vai ser produzida lá a banda sonora de um filme... Há imensas coisas até ao final do ano. Melhor não podia estar a acontecer e consigo focar-me um bocadinho neste lado da música, refugiando-me... Posso respirar um bocadinho e estar a viver outras coisas, outra área.
Mas tem alguma ligação com a música?
Absolutamente nenhuma! Fiz uns musicais maravilhosos em que fazia voz de apoio. Sem ser na escola, onde tive aulas de música, não tenho mais ligação nenhuma a não ser o Vasco.
Penso muitas vezes: Qual é o meu plano B? Mas acho que dá para compensar, vejo como um escape para mim. O meu plano B não faço ideia qual sejaNa prática, o que faz, ajuda mais na agenda?
Agenda, produção… Nesta fase preocupo-me em saber se o estúdio está em condições para recebermos as pessoas. Agora temos pessoas que estão lá, têm condições, sentem-se bem e já recebemos vários elogios a dizer que se sentem em casa, que é um espaço acolhedor… Ali queremos que se sintam no seu espaço, em casa, que lhes proporcionemos uma forma de criação diferente, num estúdio diferente.
E como é trabalhar com o namorado. Conseguem separar a relação pessoal da profissional?
Fizemos uma produção de um evento, no ano passado, em que encaixámos perfeitamente. Foi ótimo, gostámos da experiência, correu bem e acho que não chocámos muitos. Gostei bastante, foi uma aventura.
Disse numa entrevista anterior que tem de ter sempre um plano B. Vê neste projeto um plano B?
Não! Acho que vejo, essencialmente, como o trabalho do meu namorado. Apoio desde o início quando decidimos comprar o espaço, construir desde o início. Não vejo que este seja o meu plano B, mas sim, penso muitas vezes: Qual é o meu plano B? Mas acho que dá para compensar, vejo como um escape para mim. O meu plano B não faço ideia qual seja.
Já conta com mais de 20 anos de carreira…
As pessoas começam a fazer as contas a partir de 1997, da série ‘Riscos’, mas aí foi mais uma brincadeira. Para mim a responsabilidade foi em 2000 quando comecei a fazer o filme com o João Canijo. Tive o meu primeiro papel a sério, tive de estudar a personagem, vivenciar muita coisa que não foi nada fácil lá em França. O João Canijo não me deixava andar com a minha própria roupa. Tive de andar com roupa dos miúdos do qual a minha personagem era inspiração. Tive de aprender imensa coisa. Não me deixava falar português. Punha-me na casa de emigrantes - que eram senhores que faziam parte da produção que tinham um neto que também fazia uma personagem lá – para não permitir que eu falasse português, mas falávamos. Eles cantavam o fado em português à noite, falavam imenso… Foi um pouco doloroso, mas depois passou. Portanto, faz 19 anos [que comecei a carreira].
E nestes anos todos, qual foi o ponto mais alto e qual o momento mais difícil?
O ponto mais alto foi quando fiz a Telma de ‘Jura’ para a SIC, depois transitei para a ‘Rebelde Way’ e a ‘Resistirei’. Foi aí que fiquei mais conhecida do público, tinha 26/27 anos. Há muita coisa de que não me lembro. Houve outras coisas que me custaram nessa altura, não foi fácil.
Tinha acabado de fazer 30 anos e foi muito complicado. Os meus sintomas de artrite reumatóide apareceram em 2009, há dez anos, mas [a doença] só me foi diagnosticada em agosto de 2010Por causa de ter ficado mais conhecida ou da intensidade de trabalho?
A intensidade de trabalho e o facto de dizerem que o ‘Jura’ mudou muita coisa, o panorama. Não mudou grande coisa porque as pessoas continuam muito resguardadas: ‘Ai, mostrar as maminhas em televisão e aquela cena’. ‘Ai que temos de ser um país mais evoluído’, mas não somos. Atenção, nada contra, mas não foi grande revolução. Acho que foi só aquela série e depois fez-se de tudo para não se voltar a fazer nada igual.
A que me custou mais foi uma fase pessoal misturada com a profissional, que foi a minha saúde na altura em que estava a fazer a novela ‘Perfeito Coração’ para a SIC. Tinha acabado de fazer 30 anos e foi muito complicado. Os meus sintomas de artrite reumatóide apareceram em 2009, há dez anos, mas [a doença] só me foi diagnosticada em agosto de 2010. Fiz a novela toda em 2009 até janeiro de 2010 com artrite reumatóide e não sabia o que é que tinha. Fisicamente não estava bem, tinha dor crónica, não me conseguia levantar da cama, não percebia o que é que era, as minhas mãos começaram a deformar-se e andava em todo o lado e mais algum, de todo o tipo de medicina, e não me conseguiam dizer. Só mesmo em 2010 quando fui ao Instituto Português de Reumatologia me fizeram o diagnóstico.
O pânico de não sabermos o que temos. Desde fibromialgia, esclerose múltipla, túnel cárpico e coisas piores ainda… puseram na minha cabeça que podiam ser todos estes tipos de doenças e eu achava que tinha tudo. Foi um processo muito complicado. As pessoas que gravaram comigo, desde a Fátima Belo, Pêpê Rapazote, perceberam e na altura sabiam que eu não estava bem. Aliás, foi com o conselho de muitos dos meus colegas que corri outras alternativas para tentar perceber. Dentro do trabalho tinha um pânico horrível de que a produção pudesse dispensar-me. Mais uma vez eu é que me sustentava a mim própria, pagava a minha renda, o carro… Havia dias que não conseguia pegar em nada por causa das dores. Na novela fazia de empregada de mesa e quando me punham um tabuleiro com chávenas para levar e ainda tinha de ter texto… Foi dos períodos mais difíceis. No ano seguinte não tive grande trabalho, o ano de 2011 foi péssimo. É complicado. Temos de gerir tudo de maneira a que exteriormente estejamos impecáveis, irrepreensíveis, perfeitas.
E nem sempre é fácil passar essa imagem todos os dias porque os atores são seres humanos como os outros…
Exatamente! E passar por isto sozinha foi muito difícil.
Sou uma pessoa completamente diferente, não me sinto a típica estrela de televisão, nunca me senti. E esta doença também me trouxe o lado dessa consciência, que isto não é tudo. Trabalhar em cinema ou televisão não é o que eu souMas entretanto a situação já está controlada?
Perfeitamente controlada, é uma doença crónica…. Tenho as minhas mazelas e marcas que esta doença me trouxe, mas também me trouxe um lado de pés no chão. Sempre tive, mas mais ainda. Pôr-me sempre no lugar da outra pessoa para não tratar ninguém de forma diferente, ser agradecida pelo facto de estar aqui e poder trabalhar. Ter este privilégio que há pessoas que não têm. Esta doença trouxe-me muita coisa boa, trouxe-me de volta ao meu encontro. Estou a fazer isto de 2019 que estava a dizer, mas já tenho tentado fazer isto desde há dez anos para cá. Por alguma razão esta doença apareceu em mim. Já a podia ter, mas só espoletou naquela altura, e porque é que só despoletou naquela altura? O que é que eu estava a passar que o meu corpo parou? O meu corpo deixou de trabalhar a meu favor. O que é que aconteceu para me despertar nesse sentido?
Sou uma pessoa completamente diferente, não me sinto a típica estrela de televisão, nunca me senti. E esta doença também me trouxe o lado dessa consciência, que isto não é tudo. Trabalhar em cinema ou televisão não é o que eu sou. Eu sou um ser humano. Não me defino pela minha profissão. Tenho o meu próprio percurso, sou a Alda e tenho que me relembrar disso muitas vezes. A doença artrite reumatóide trouxe-me essa consciência, de vir ao meu encontro, desta pessoa que já estava aqui e que eu ignorava, que não gostava porque isto não é ser estrela, não é ser atriz… Foi uma chapada de 'bora lá acordar', eu tenho um trabalho para fazer nesta vida que é ser serena, verdadeira e honesta comigo mesma, amar-me incondicionalmente. Estou a tentar aprender.
Visto que não dá tanto valor ao lado da fama que vem com o trabalho em televisão porque está mais exposta, e uma vez que já fez teatro, porque é que não optou por seguir apenas uma carreira nos palcos, longe dos ecrãs? Não se consegue viver apenas do teatro em Portugal?
Consegue-se sobreviver só do teatro, obviamente. Há atores que admiro imenso e que só fazem teatro e têm companhias de teatro. Eu não fiz o conservatório, não tenho essa base do teatro. Portanto, quando se começa com uma base de teatro vem-se com um grupo de pessoas que nos conhece e já sabe o nosso valor. E a partir daí começamos a percorrer vários caminhos na área do teatro, que é completamente diferente da televisão. Como dizem que é difícil entramos no cinema, também é difícil entrar no meio do teatro. Se eu não tenho essa formação, só através de conhecimentos e fazendo umas audições atrás de audições e não ficar tantas vezes…
Temos de começar a pensar onde é que nos identificamos mais, onde é que sou mais aceite, onde é que me abrem mais as portas? Na televisão, no cinema? Perfeito! Não tenho que ser necessariamente uma atriz completa. Seria maravilhoso se soubesse cantar, dançar. Isso existe e temos em Portugal inúmeros casos assim, mas eu não sou e tenho que me aceitar. No passado tinha vergonha de dizer isto, mas eu não sou atriz de teatro. Não tenho essa formação. Fiz outras coisas pelo caminho, formei-me de outra forma, é o que eu tenho, é quem eu sou. Sou mais uma pessoa? Sim, mas sou eu!
Mas acha que na televisão é mais fácil ou são mundos completamente diferentes?
São mundos completamente diferentes! Pode não ser muito fácil para muita gente que quer vir do teatro e entrar na televisão, como acontece, e as pessoas não se identificam, não gostam. Quantos atores que eu conheço e que são ótimos atores em teatro, que dão cartas e que nos levam para onde eles nos querem levar quando os vemos, e em televisão não conseguem porque não faz parte da sua formação, porque não conseguem lidar com aquela maneira de se fazer, de representar.
Acho que todos devemos pôr limites em tudo na nossa vida e não dizermos sim a tudo. Dizem-nos e ensinam-nos logo desde que começamos em televisão para não demonstrarmos a fraqueza, que estás doente, que passas por necessidades Há alguma personagem que já tenha recusado por não se identificar com a mesma?
Este ano disse não pela primeira vez a um trabalho, mas por falta de disponibilidade, não por não me identificar. Acho que isso ainda não me aconteceu.
Não tem nenhum limite na sua carreira?
Não sei, devia ter. Acho que todos devemos pôr limites em tudo na nossa vida e não dizermos sim a tudo. Dizem-nos e ensinam-nos logo desde que começamos em televisão para não demonstrarmos a fraqueza, que estás doente, que passas por necessidades. Sempre me disseram isto. Ainda no final do ano uma atriz conceituada, mais velha, disse-me para eu ter cuidado a quem é que dizia que tinha artrite. Parece que estamos fechados dentro de camisas de forças… Não se deve dizer, mas por que carga de água? Lá fora toda a gente sabe para onde é que vão os atores com problemas com droga. Se não sei quem tem uma depressão diz em televisão. [Cá], não te atrevas a dizer que tens depressão… Porque é que eu não hei de dizer que tenho artrite? Sou uma rapariga de 40 anos que tem artrite reumatóide mas que vive plenamente com isso e estou tratada.
Porque é que temos de ter esta coisa do artista tem de ser… Isso era antigamente, as nossas divas Beatriz Costa, Laura Alves, que recebiam joias dos seus fãs que a esperavam à porta e lhes entregavam tudo, se fosse preciso um carro…
Hoje isso já não é preciso até porque temos as redes sociais...
Temos as marcas que lhes dão tudo porque eu como não tenho os seguidores suficientes… Isso é outra questão. Eu faço muitos detox longos das redes sociais, até demais.
É vital para um artista ter redes sociais?
Sim! Hoje em dia é! Mas são os dias que são. Eu não sou fã…
Mas há artistas que não dão importância às redes sociais…
E que continuam a trabalhar. E outros que só vivem [para].
Há algum papel que sonhe interpretar?
Não... Não sei qual é o papel de sonho para mim. Poder trabalhar já é um privilégio, seja sempre bozainha ou mazinha, ou a criada… Gostava de fazer o núcleo cómico de uma novela. Mas para fazer graça também é preciso ter muito jeitinho.
Já esteve nesse papel no filme ‘7 Pecados Rurais’…
Sim! Achei que às vezes podia estar a exagerar demais e acho que foi um bocadinho exagerado tanta coisa, mas a gente só se divertia. Ainda por cima tínhamos o nosso Nicolau Breyner, que foi o nosso realizador. Uma oportunidade de estar a trabalhar com ele e ainda por cima como realizador… Há coisas que vêm mesmo parar às nossas mãos. Atenção, fiz casting, fui selecionada. Foi tão bom, divertido e adorei a fase da promoção do filme. Aconteceu no ano passado isso com o ‘Linhas de Sangue’ e com o ‘Leviano’. Andamos, até numa universidade fomos falar sobre o ‘Linhas de Sangue’ com os alunos, uau. Tão giro! Que orgulho!
Foi a primeira vez que trabalhou com o Nicolau Breyner?
Foi a primeira vez que trabalhei com ele…
Tinha um carinho especial por ele?
Tinha! Era uma pessoa que eu assistia na televisão com os meus avós, eles admiravam-no. Eu falo do Nicolau Breyner, mas não quero ir muito longe de uma pessoa maravilhosa que é a Marina Mota. Em televisão é uma atriz furacão, brutal, em teatro toda a gente sabe como é… E eu quando estou com ela, há três anos fizemos a novela ‘Rainha das Flores’ e eu pensei tantas vezes nos meus avós. Se eles soubessem que eu estava ali, pensei nisso com o Nicolau… Muitas vezes penso nisso. Estava em casa a ver televisão com eles e eles tinham uma grande admiração, e anos mais tarde venho a estar pessoalmente com essas pessoas… com a Marina Mota então… São oportunidades que levamos da vida. Isto sim é que é ter privilégio de fazer parte desta profissão. Também é conhecer pessoas maravilhosas que nos acompanharam desde crianças.
Alenquer é uma recordação do passado, não sinto qualquer tipo de ligação, a não ser a familiar. Hoje em dia é-me difícil sentir a minha raiz porque os meus avós faleceram em 2004, há 15 anos, e deixei de sentir uma baseLisboa é a sua segunda casa ou casa só há uma e é em Alenquer?
Não! Eu adotei a de Lisboa na altura em que comecei a fazer televisão e tinha que estar disponível. Não considero Lisboa a minha casa, não considero Alenquer a minha casa. Alenquer é uma recordação do passado, não sinto qualquer tipo de ligação, a não ser a familiar. Hoje em dia é-me difícil sentir a minha raiz porque os meus avós faleceram em 2004, há 15 anos, e deixei de sentir uma base. Nasci e fui para lá viver até aos 25 anos que foi quando eles partiram. Portanto, tenho sentido nestes últimos anos que estou com o Vasco que verdadeiramente em casa é em Almada, que é uma cidade que me acolheu muito bem. Sinto que faço parte da cidade.
Por norma as grandes figuras são muitos destacadas na imprensa, mas a Alda não é das mais mediáticas. Foi uma escolha não tornar demasiado público o seu mundo fora das artes?
Não sei se foi opção minha. Desde muito cedo percebi que não atraía muita fofoca. Ainda bem por um lado, sempre quis proteger a minha família, o meu lado frágil. Nunca namorei com atores mega conhecidos, é um primeiro passo para começarem a escarafunchar a nossa vida… Só aparecia quando era para falar de algum trabalho. Quando vou a um programa de televisão não vou lá falar de mais nada a não ser do meu trabalho…
Gostava de ser mãe, de ter uma casinha no campo ou na praia, fora da cidade, viagens de sonho…Nunca despertou esse lado…
Sim. Sempre fui muito tranquila.
Mas é sempre bom ser reconhecida pelo trabalho?
Ah sim!!! Ainda há pouco tempo recordaram o papel no ‘Jura’...
Se pudesse deixar uma mensagem à Alda para ler daqui a dez anos qual seria?
Relaxa, nem tudo é assim tão sério, isto não tem a importância que tu queres dar, a vida é outra coisa. A vida és tu, o teu mundo, as tuas realizações pessoais. Isto é cenário. Relaxa, Alda, vais sair-te muito bem. Desfruta.
Quais os projetos de vida que gostava de ver realizados?
Gostava de ser mãe, de ter uma casinha no campo ou na praia, fora da cidade, viagens de sonho… As minhas viagens que ainda estão por realizar são projetos que vão acontecer. Gostava de voltar a fazer cinema em França…
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