"Serei triplamente mais interventivo do que Marcelo Rebelo de Sousa"
André Ventura, candidato a Presidente da República e líder do Chega, é o entrevistado de hoje do 'Vozes ao Minuto'.
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Política André Ventura
Quando todas as sondagens apontam para a reeleição de Marcelo Rebelo de Sousa à primeira volta na corrida a Belém, André Ventura, deputado único e presidente do Chega, não se dá por vencido. Em entrevista ao Notícias ao Minuto, o candidato recordou as eleições presidenciais disputadas entre Mário Soares e Freitas do Amaral e sublinhou que numa "segunda volta tudo pode acontecer".
André Ventura deixou também severas críticas à forma como o atual Presidente da República tem desempenhado o cargo e garantiu que, se for eleito, será "triplamente mais interventivo" do que Marcelo Rebelo de Sousa.
O candidato apoiado pelo Chega prometeu ainda, que se chegar a Presidente, nunca colocará as suas convicções pessoais, como por exemplo sobre a eutanásia, "acima da opção da maioria dos portugueses", mas garantiu que vetará "a maior parte das normas que venham acrescentar rendimentos mínimos e subsídios, em Portugal". Ainda se vencer estas eleições, André Ventura afirmou que irá "exercer influência" para que se resolva "o problema da comunidade cigana" no país, antes que se desenhe "uma situação, em Portugal, realmente violenta".
Recentemente, disse que não concordava com a extinção do SEF. Contudo, no programa de ação política do Chega defende que se deve "preparar de forma gradual a integração das forças de segurança numa única polícia nacional”. Pode esclarecer?
O que se está a falar aqui não é de uma reestruturação ou de uma organização global das forças de segurança. O se está a falar aqui é apenas da fusão de uma das polícias noutra. Caso se extinga o SEF, o que que vai acontecer, em termos de percepção social e de organização jurídico-institucional, é a punição de uma instituição por um episódio. Ou seja, não há nenhum plano global de criar uma polícia nacional, ideia que aceitaríamos.
O que aconteceu é que houve um caso no SEF, como já houve noutras polícias e a solução parece ser acabar com esta instituição. Portanto, não é a mesma coisa que defendemos e não concordamos com esta abordagem por ser punitiva e generalizada. O que se passou é grave, atenção não quero menorizar o caso, mas um episódio no SEF levar à sua extinção é um erro, venham a ser ou não apresentados mais casos.
Também se tem esses casos na PSP, GNR e, provavelmente, na PJ e não é por isso que a primeira solução é extinguir esses corpos de políciasMas têm surgido mais relatos e denúncias sobre eventuais maus-tratos a imigrantes depois da polémica sobre a morte do cidadão ucraniano. Defende a mesma posição, podendo este caso não se tratar de um episódio isolado?
Repare-se, também se tem esses casos na PSP, GNR e, provavelmente, na PJ e não é por isso que a primeira solução é extinguir esses corpos de polícias. Considero que temos de investigar o que aconteceu, os tribunais estão cá para isso e temos de confiar neles. No que diz respeito ao futuro, temos de criar mecanismos para que isto não volte a acontecer em território português, mas não é punindo o SEF que vamos realizar esse objetivo.
Então, se não considerasse que uma possível extinção do SEF tivesse um objetivo punitivo, na sua perspetiva, o SEF deveria encaminhar para uma fusão com outras forças de segurança?
Não o SEF sozinho, mas sim se houvesse toda uma reorganização policial para a criação de uma polícia nacional. Mas não é isso que está em causa. Uma absorção do SEF e das suas funções pelas forças policiais não faz sentido, nesta altura. Aliás, confrontei Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna, na Comissão de Assuntos Constitucionais, sobre o facto de Magina da Silva, diretor nacional da PSP, ter saído da reunião com o Presidente da República e ter dito que está a trabalhar com o Ministério da Administração Interna (MAI) na proposta de fusão da PSP e do SEF. O ministro disse que isso não é assim e António Costa afirmou que não vai haver fusão. Entendam-se. Alguém está a mentir.
O diretor nacional da PSP já veio esclarecer que "apenas apresentou a sua visão pessoal para a reestruturação em curso que não afeta o trabalho conjunto em curso entre as Forças e Serviços de Segurança e a decisão por parte do Governo".
Pois, mas, na altura, o diretor não disse que se tratava de uma opinião. Disse que estava a trabalhar com o MAI na referida proposta. Logo, alguém está a mentir. Quem é que esteve a trabalhar com o diretor nacional da PSP nessa proposta que [o diretor nacional da PSP] referiu inicialmente? Foi o ministro? Temos de saber isso. Antes de falarmos de qualquer outra coisa temos de perceber por onde é que esta ideia andou e quem é que está mentir. Foi o Presidente da República, o primeiro-ministro, o ministro da Administração Interna ou diretor nacional da PSP? Temos de apurar isto.
O que faria diferente de Marcelo Rebelo de Sousa é que não toleraria que o primeiro-ministro mantivesse Eduardo CabritaE o que teria feito, se fosse Presidente da República?
Teria procurado estar em cima da situação desde o início e não intervir apenas quando há câmaras a apontar para o caso, como faz Marcelo Rebelo de Sousa. Sobretudo, teria procurado gerir os equilíbrios aqui em jogo. Não me escudaria ou esconderia do processo nem da avaliação que está em risco. O que faria diferente de Marcelo Rebelo de Sousa é que não toleraria que o primeiro-ministro mantivesse Eduardo Cabrita. Por muito amigo e por muita confiança que António Costa tenha no ministro, Eduardo Cabrita está fragilizado com o que se passou no SEF e pelo o que se está a passar em relação à Administração Interna, no geral. Como Presidente da República teria feito uma pressão imensa para que o ministro fosse afastado.
Mas, Marcelo Rebelo de Sousa já fez declarações nas quais abre a porta à demissão do ministro da Administração Interna.
Exercer a pressão que foi feita, por exemplo, com Constança Urbano de Sousa, ministra da Administração Interna, na altura dos incêndios de 2017? É muito diferente do que se viu agora. Quando Marcelo Rebelo de Sousa quer fazer pressão, sabe fazer pressão. Marcelo Rebelo de Sousa não quer é perturbar o contexto político nem o apoio que o Partido Socialista (PS) pode lhe dar nestas eleições presidenciais.
Se for eleito Presidente da República serei muito mais interventivo. Serei, arrisco-me a dizer, triplamente mais interventivo do que Marcelo Rebelo de SousaVoltando ao programa do Chega, é defendido que a figura do Presidente da República deve acumular o cargo de primeiro-ministro. Na altura das eleições legislativas, numa entrevista ao jornal Público, disse que as eleições presidenciais têm a maior legitimidade possível da democracia e que, depois, o cargo "só serve, praticamente, para cortar fitas", "estar em apresentações", "fazer apelos de sofá ao Governo" e que "não serve para mais nada". Ainda concorda com estas declarações?
O que disse foi que, desde Mário Soares, os Presidentes tornaram o cargo praticamente simbólico, não que o cargo em si fosse assim. Isso nota-se não só nos níveis de abstenção, os portugueses dão pouco valor às eleições presidenciais, mas também na própria dinâmica da campanha eleitoral. Criou-se a ideia de que o Presidente da República é uma espécie de prémio, que quando alguém está em fim de carreira vai ali para o Palácio de Belém e diz umas coisas, de vez em quando, nas festividades, recebe os diplomatas no início do ano diplomático e corta fitas nas inaugurações dos monumentos. Isto é errado. Enquanto tivermos este tipo de Presidentes não vamos ter o equilíbrio de poder que a Constituição, no seu primeiro momento, tinha previsto.
Agora, continuo a achar que a presidencialização do regime é a melhor solução. Em Portugal, temos uma enorme confusão: elegemos o Chefe do Estado, que é a primeira figura do Estado, mas que, na verdade, manda bastante menos em termos de impacto na vida das pessoas em comparação com o primeiro-ministro. Nós defendemos que o sistema presidencialista é mais barato, eficaz e claro. Se mudássemos para um regime presidencial pouparíamos cerca de 25 milhões de euros por ano, o que seria muito significativo para os contribuintes.
Mas, tendo em conta o regime vigente, como é que se propõe a fazer diferente dos restantes Presidentes?
Se for eleito Presidente da República serei muito mais interventivo. Serei, arrisco-me a dizer, triplamente mais interventivo do que Marcelo Rebelo de Sousa e não deixarei de dar indicações sobre o caminho que temos de seguir no combate à crise ou sobre limitações de poderes - intervenção que Marcelo Rebelo de Sousa nunca quis fazer quando o Governo exagera nas suas competências, como por exemplo, na expropriação, nos gastos do dinheiro público ou na não luta contra a corrupção. Eu terei intervenção.
Não deixaria de permitir que entrassem em vigor normas de esquerda só porque posso não concordar com as mesmas
Mas o Presidente tem a função de desempenhar um poder mais moderador.
Mas pode ser mais interventivo se quiser, apesar de ser, é verdade, o árbitro da democracia. Vou dar um exemplo: quando foi demitido o presidente do Tribunal de Contas, o Presidente da República não deveria ter tido uma intervenção? Não deveria ter dito que não era admissível em democracia, quando vão chegar milhões de fundos europeus, demitir-se o presidente do tribunal que vai fiscalizar esses mesmos fundos. Ou quando não se reconduziu a Procuradora-Geral da República, depois do trabalho fantástico que todos reconheceram, ao longo de quatro anos, que levou, por exemplo, à prisão do José Sócrates, não deveria ter tido o Presidente da República uma palavra? Mas Marcelo Rebelo de Sousa refugiou-se no tal papel de árbitro e de moderador. Então, para isso, não precisamos de um Presidente da República. Acho que um Chefe de Estado eleito diretamente pelos portugueses deveria ter mais intervenção nestes momentos.
Quando formalizou a sua candidatura afirmou, à saída do Tribunal Constitucional, que, caso seja Presidente, irá "impedir leis que perpetuem este regime. A Lei da Eutanásia deverá estar nas mãos do atual Presidente, mas se estivesse nas suas, vetaria?
Depende de como viesse regulamentada da Assembleia da República. Não posso deixar que as minhas convicções pessoais - já disse que sou contra a eutanásia - se coloquem acima da opção da maioria dos portugueses. Portanto, o que faria era garantir que a Lei da Eutanásia estava devidamente regulamentada para que a eutanásia fosse o exercício de um direito e não um instrumento de destruição de vidas. Não permitia que se criasse um cenário de precedência com idosos, como acontece noutros países, onde os mais velhos têm medo de ser eutanasiados. Aí, certamente que não a aprovaria.
Mas também não deixaria de permitir que entrassem em vigor normas de esquerda só porque posso não concordar com as mesmas. Não sou como as outras candidatas [Marisa Matias e Ana Gomes] que dizem que nunca vão dar posse a um governo do Chega ou que acham que o Chega devia ser ilegalizado. Se for escolhido pelos portugueses, serei um Presidente da República à direita, naturalmente, porque sou um político de direita, mas não deixarei de dar posse a um governo de esquerda.
O meu objetivo, como Presidente, é de vetar a maior parte das normas que venham acrescentar rendimentos mínimos e subsídios em PortugalEntão, quando disse que iria "impedir leis", a que se referia? Pode dar um exemplo?
Por exemplo, impediria todas as leis de segurança social que continuam a aumentar estupidamente a subsidiodependência em Portugal, enquanto quem trabalha se sente cada vez mais afogado em impostos. Comigo não passarão normas que distribuam rendimentos sociais de reinserção. Aliás, o meu objetivo, como Presidente, é de vetar a maior parte das normas que venham acrescentar rendimentos mínimos e subsídios em Portugal. Quero dizê-lo já para que não haja nenhuma duplicidade de intenções. Se for eleito, vetarei a maior parte destas normas.
E dissolveria o Parlamento?
É preciso ter em mente que estamos a viver uma crise devido à pandemia e que temos também a Presidência Portuguesa da União Europeia à porta, que vai ser um momento importante para o país. Ou seja, preferia estabelecer linhas vermelhas que o Governo e que a maioria parlamentar teriam de cumprir. Estas linhas traduzir-se-iam numa garantia de que não era colocada em causa a iniciativa privada, como faz muitas vezes o BE, que não eram postos em causa os direitos fundamentais, como faz muitas vezes o PCP, ou que não era colocado em causa o equilíbrio das instituições, como faz muitas vezes o PS, em matéria de corrupção.
Se esses limites fossem assegurados, não haveria razão para dissolver a Assembleia da República e lançar o país numa crise política num momento em que temos uma crise muito maior para lidar que é a crise da Covid-19. Mas, se estas linhas fossem ultrapassadas, então, teria de ser.
Qual seria a primeira coisa que faria, se fosse eleito Presidente da República?
Exercer influência junto do Governo para que no máximo em seis meses tenha pronto e implementado um amplo plano contra a corrupção em Portugal.
Disse que vai continuar, se for Presidente, a dizer que "há problemas com minorias raciais e étnicas, em Portugal", até estas minorias "cumprirem o mesmo que os outros". O que é que isto quer dizer na prática?
Quer dizer que, como Presidente, olharia para um problema que a maior parte do país tem insistido em ignorar, que é o problema da comunidade cigana em Portugal. Quando falo das pessoas de etnia cigana não é por ter uma obsessão especial é porque é uma comunidade que, maioritariamente, tem uma grande dependência de subsídios do Estado, que tem problemas em lidar com as leis e com o Estado de Direito, como se vê nos direitos das mulheres e dos menores. Apenas 15% da população desta comunidade vive de rendimentos do seu trabalho. Isto significa que, aproximadamente, 85% vive de outros tipos de economia ou de subsídios do Estado, etc*. Enquanto não olharmos para isto como um problema, serei o Presidente que vai dizer que há aqui um problema e que tem de ser resolvido com urgência porque os portugueses não podem continuar a pagar por quem sente que está acima da lei e fora do Estado de Direito.
*Referência ao 'Estudo Nacional sobre as Comunidades Ciganas' publicado em dezembro de 2014 que concluiu que, dos 1.599 inquiridos, "cerca de 18% dos indivíduos responderam ser ativos com profissão/trabalho, contra quase 57% que afirma estar desempregado, à procura do 1º emprego ou nunca ter trabalhado. Esta situação contrasta com o que foi observado em outros estudos qualitativos realizados na AMP e AML em que metade ou mais dos entrevistados eram ativos (Mendes, 2005 e 2007)".
Mas, a subsidiodependência é um fenómeno transversal a qualquer comunidade. Porquê discriminar a população de etnia cigana?
Sim, é verdade, há muitas pessoas que não são de etnia cigana que vivem de subsídios, de esquemas ou da economia paralela. A questão é que nesta comunidade específica há um padrão dominante de incumprimento, que não se verifica em mais nenhuma outra.
Como pode dizer que há um padrão dominante nesta comunidade quando não há estudos suficientemente representativos e atualizados ou informações nos Censos que comprovem esses dados?
Não há nenhuma outra comunidade em que só 15% vivam dos rendimentos do trabalho e isto é um dado que não podemos ignorar. Então os restantes 85% vivem do quê? De heranças? Nós sabemos que não é. Sabemos que é da economia paralela, da subsidiodependência ou, e aqui acredito que seja uma minoria - para que isto não dê mais confusão do que já existe -, de atividades criminais. A verdade é que temos de olhar para os dados, também quando vemos que na população prisional estão muitos mais ciganos do que a expressão que esta comunidade tem na população geral. Há aqui um problema de ligação com o Estado de Direito.
Mas, mais uma vez, não há informação que comprove as suas declarações.
Já vi números que demonstram que, mesmo na população prisional, há uma sobrelotação de pessoas de etnia cigana. Mas em relação a esse estudo de 2014, pode confirmar. A percentagem de pessoas de etnia cigana que vive dos seus rendimentos é muito baixa. Para além disso, temos ainda uma outra questão que penso que é universalmente reconhecida que tem a ver com os direitos das mulheres e dos direitos das crianças. Não podemos ter mulheres tratadas como objetos e também não podemos ter crianças a serem retiradas das escolas aos 15 anos, por uma questão de tradição. Infelizmente, até já temos tribunais que lhes dão razão e que dizem que é uma questão cultural*. Como Presidente vou opor-me veementemente contra isto e procurarei exercer influência para que o Parlamento legisle, no sentido de resolver esta questão da etnia cigana em Portugal.
*O Juízo de Competência Genérica de Fronteira, da Comarca de Portalegre, aceitou, em 5 de Janeiro de 2017, o abandono escolar de uma rapariga de 15 anos, que se encontrava a frequentar o 7.º ano. A menor e a família alegaram que esta tinha de ajudar a mãe em casa e invocaram também a sua cultura cigana - notícia avançada pelo jornal Público, a 5 de setembro de 2018.
Então, quando se referia a "problemas com minorias raciais e étnicas, em Portugal", referia-se exclusivamente a pessoas de etnia cigana?
Nesse momento, estava a referir-me concretamente ao problema da comunidade da etnia cigana no país. Mas, há outras minorias que temos em Portugal e que também têm algumas dificuldades no que se refere ao cumprimento da lei. Temos sobretudo, algumas zonas mais problemáticas, mas são focos específicos e não um problema de uma comunidade no geral. Por exemplo, nos subúrbios de Lisboa, na linha de Sintra, há problemas evidentes, e que até já levaram a processos-crime entre polícias e minorias, com algumas comunidades afrodescendentes, mas isso são problemas localizados.
Em todo o país há problemas com o cumprimento da lei. Particularizar essas minorias é uma forma de discriminação.
É isso que estou a dizer. Que nos casos referidos [na resposta anterior], são questões pontuais e que não podemos dizer que a comunidade afrodescendente não cumpre as regras, porque uma grande maioria está integrada. Agora, não podemos dizer que com a comunidade cigana isso acontece e, arrisco-me a dizer, que a maioria da população da comunidade cigana, neste momento, não cumpre os padrões de comportamento exigíveis pelo Estado de Direito. E isso é grave e acho que o Estado de Direito tem de agir para corrigir isso.
Pode definir o que é uma pessoa racista ou xenófoba?
É alguém que sem qualquer fundamento e apenas com o pressuposto da sua cor, raça ou nacionalidade procura criar considerações e juízos de valores negativos sobre outra pessoa. Mas, repare-se, que disse 'sem qualquer fundamento', o que não é o meu caso, eu tenho um grande fundamento.
Não estigmatizo minorias nem tenho um discurso do medo. Isto é um problema. Quando falo da comunidade cigana, para que fique claro, não é para criar à comunidade nenhum medo caso seja eleito ou sugerir que serão alvo de alguma perseguiçãoMas sem dados concretos, o seu fundamento, neste caso, é uma opinião…
Eu referi o último estudo que temos sobre a comunidade cigana que me permite dizer isto. Não vou dar casos pontuais - apesar de ter sido vereador em Loures e ter assistido ao que se passa - porque, como disse, casos pontuais há em todo o lado. Mas, em relação à etnia cigana há um problema e se nós não percebermos que há um problema nunca o vamos resolver. Dizer que há problema na comunidade não é menorizar as pessoas é dizer que há um problema de cumprimento das regras por parte daquela comunidade.
Na tese de doutoramento que concluiu em 2013 na Universidade de Cork, na Irlanda, mostrou-se apreensivo com a "estigmatização de minorias" e com o "discurso do medo" e criticava o excesso de detenções "sem qualquer prova concreta", que tinham "consequências devastadoras em termos de saúde mental dos suspeitos e da própria sociedade". Continua a defender esta ideia?
Eu não estigmatizo minorias nem tenho um discurso do medo. Isto é um problema. Quando falo da comunidade cigana, para que fique claro, não é para criar à comunidade nenhum medo caso seja eleito ou sugerir que serão alvo de alguma perseguição. O que defendo é muito simples: o Estado de Direito tem de integrar e, tenho dito e temos visto isto pela Europa toda e na História, ou integramos a bem ou um dia alguém vem integrar a mal. Eu prefiro integrar dentro das regras do Estado de Direito.
O que é que quer dizer com "integrar a mal"?
De alguém vir fazê-lo com violência e com força. Não quero que isto aconteça. Quero que isto aconteça dentro do Estado de Direito, dentro das regras democráticas. Se criámos uma bolha, na qual as pessoas sentem que há uns a que o Estado dá tudo e outros a quem o Estado não dá nada, temos aqui um cocktail explosivo para um dia termos uma situação, em Portugal, realmente violenta. O que quero evitar é essa estigmatização.
Mas quando se discrimina uma comunidade está-se a estigmatizá-la e a criar um discurso do medo.
A comunidade é que se estigmatiza a si própria e se afasta das regras de padrão de comportamento. Como político o que tenho de dizer é que esta comunidade tem de cumprir as mesmas regras que todos os outros. Isto não tem nada a ver com estigmatização, prende-se apenas com o querer integrar. E não descansarei enquanto não sentir que em Portugal todos são tratados da mesma forma, quer sejam de etnia cigana quer sejam de outra qualquer.
Acredito que não haverá governo de direita sem o PSD e o Chega. É impossível, perante os números que temos atualmenteMudando de assunto, numa entrevista ao Expresso admitiu que o PSD tinha vergonha de si. E que, ao contrário de Rui Rio, tinha muitas hipóteses no futuro de ser primeiro-ministro. Caso as imposições do Chega sejam aceites para ser constituído um Governo no futuro liderado pelo PSD, está confortável ao lado de um partido que tem vergonha do seu?
Não é estar confortável, coloco é Portugal acima disso. Acima de me sentir bem ou mal, o mais importante é se os portugueses estão bem ou mal. Se no futuro, o PSD aceitar as nossas exigências e se criar um governo de rotura com o regime, a questão é se os portugueses estão confortáveis. Sempre colocarei os portugueses acima do conforto pessoal e daquilo que sinto. Com as minhas declarações pode-se supor o que penso de alguns dirigentes quer do PSD, quer doutros partidos, mas isso é secundário face ao objetivo principal, que é haver um governo que afaste os socialistas do poder nos próximos anos.
Então, acredita num diálogo possível e aberto com Rui Rio?
Acredito que não haverá governo de direita sem o PSD e o Chega. É impossível, perante os números que temos atualmente. Aliás, ainda hoje [dia 21 de dezembro] foi divulgada uma sondagem para o JN/CMTV que coloca o Chega como terceira força política nacional. Isto significa que podem gritar, atirar ao ar, saltar da janela ou andar a 200 quilómetros por hora de carro, que o Chega veio para ficar e não há nenhuma força à direita que o consiga substituir.
Portanto, percebo estes esforços que o PSD tenta fazer para só precisar da Iniciativa Liberal e do CDS porque na verdade são mais fofinhos do que o Chega, mas isso não vai acontecer e é evidente que, perante todas as sondagens, só o Chega conseguirá uma maioria à direita em Portugal. A questão, depois, é o que é que o PSD está disposto a fazer para conseguir um governo de direita.
Gosto de Passos Coelho, considero-me amigo dele e penso que também me considera seu amigo Nessa mesma entrevista, disse também que gostava que Pedro Passos Coelho voltasse ao PSD. Não acha que isso poderia ser prejudicial para o Chega, isto supondo que, hipoteticamente, poderia potenciar o crescimento do PSD e consequente o decréscimo do espaço do Chega?
Não, não estou preocupado com isso. Também ouvi Marques Mendes com essa teoria. Não estou preocupado com o crescimento do Chega nem com o meu conforto pessoal, estou preocupado em termos integridade, transparência e um governo à direita forte.
Vai ser uma campanha minimalista. Tínhamos previstos eventos com 600/700 pessoas que, obviamente, vão ter de ser muito reduzidosPortanto, acha que se entenderia da mesma forma com Pedro Passos Coelho como com Rui Rio?
Não quero ser indelicado. Tenho de Rui Rio a imagem que tenho, é minha a minha opinião, e não quero lançar conflitos dentro do PSD, que não é o meu partido. Eu gosto de Passos Coelho, considero-me amigo dele e penso que também me considera seu amigo. O que sei é que Passos Coelho trouxe integridade à política, transparência e firmeza, que são valores que admiro. Se Passos Coelho regressasse à política, não sei se seria líder do PSD, se se coligaria comigo ou se iríamos fazer governo, mas ficaria sempre feliz que um homem como ele voltasse à política portuguesa, mesmo que isso, hipoteticamente, em termos de eleitorais, pudesse prejudicar o Chega porque não estou a pensar no partido nem em mim, estou a pensar em Portugal e num governo de direita que afaste o PS do governo.
A única segunda volta que tivemos, em Portugal, foi em 1986. Na altura, Freitas do Amaral teve sempre à frente de Mário Soares, em todas as sondagens, até ao fim, e Mário Soares venceu as eleições Voltando a atenção para um futuro mais próximo, para os dias que se seguem, defendeu que as campanhas presidenciais têm de ser "reorganizadas" e que devem passar "a imagem de que os candidatos não estão num regime acima dos portugueses". Como está a pensar adaptar a sua campanha à pandemia?
Vai ser uma campanha minimalista. Tínhamos previstos eventos com 600/700 pessoas que, obviamente, vão ter de ser muito reduzidos. Vamos apostar em espaços como aqueles que são autorizados para os espetáculos culturais, em auditórios com lugares marcados, distribuiremos gel e máscaras nas ações de campanha e teremos muito poucos ajuntamentos de rua ou arruadas. De qualquer forma, será sempre respeitado o distanciamento físico. Será tudo muito contido e haverá toda uma redefinição da campanha. Em todo o caso, apesar desta redefinição, é fulcral passar pelos 18 distritos do continente e esse vai ser o meu esforço e compromisso.
Preocupa-o o impacto que esta redefinição da estratégia na campanha possa ter nos resultados eleitorais?
Admito que sim, admito que possa ter impacto. Mas as pessoas também já perceberam que este contexto é diferente e que eu, enquanto candidato, vou ter de me readaptar. Apesar de ter votado contra o Estado de Emergência, a questão aqui não é essa é que há regras sanitárias que tem de ser cumpridas em nome da saúde publica. Por isso, não faria sentido defender o combate à Covid-19 e estar permanentemente a desafiar essa linha.
Eu e Ana Gomes estamos muito próximos em termos de intenção de voto. Acredito que no dia das eleições vamos estar, talvez, próximos, mas acho que vou ficar à frenteAté agora, todas as sondagens realizadas apontam para a vitória de Marcelo Rebelo de Sousa à primeira volta. E, segundo uma das mais recentes, realizada para o Porto Canal e o semanário Sol, Ana Gomes teve o maior aumento de intenções de voto contando agora com 13,3%, mais 2,8% do que a sua candidatura (10,5%). Ainda acredita que vai ganhar estas eleições ou já só está a lutar pelo segundo lugar?
Acredito que ainda é possível levar Marcelo Rebelo de Sousa a uma segunda volta nas presidenciais. Numa segunda volta tudo pode acontecer. A única segunda volta que tivemos, em Portugal, foi em 1986. Na altura, Freitas do Amaral esteve sempre à frente de Mário Soares, nas sondagens, e Mário Soares venceu as eleições.
Mas sobre essa sondagem, se se reparar, eu e Ana Gomes temos exatamente a mesma votação direta: 10,5%. No entanto, na distribuição de indecisos, Ana Gomes recebe todos os votos. Confesso que considero esta uma análise um pouco extraordinária, ao considerar que não há nenhum eleitor indeciso que votasse em mim.
Mas o que as sondagens têm demonstrado é que é o candidato com menos eleitores do seu partido a votarem em candidatos apoiados por outros partidos, bem como o contrário.
O que estou a dizer é que considero que eu e Ana Gomes estamos muito próximos em termos de intenção de voto. Acredito que no dia das eleições vamos estar, talvez, próximos, mas acho que vou ficar à frente porque a mobilização do eleitorado que sinto à volta deste projeto é muito maior do que a que sinto à volta da candidatura de Ana Gomes.
Se ficar atrás de Ana Gomes tenho de retirar consequências políticas disso e essas consequências passam pela demissão da liderança do partido. Depois abre-se um processo interno de liderança e não decidi ainda se serei recandidatoJá disse que se demitiria do cargo de líder partidário caso Ana Gomes ficasse à sua frente nestas eleições. Se este cenário se verificar, por onde passará o seu futuro político?
Não sei. Se ficar atrás de Ana Gomes, tenho de assumir as consequências.
Mas, está a ponderar demitir-se e depois recandidatar-se?
Demitir-me não é um ato somenos num partido que teve eleições há menos de cinco meses. Se ficar atrás de Ana Gomes tenho de retirar consequências políticas disso e essas consequências passam pela demissão da liderança do partido. Depois abre-se um processo interno de liderança e não decidi ainda se serei recandidato. Dependerá muito da avaliação que os militantes fizerem do meu trabalho enquanto candidato presidencial e líder político. Ainda falta algum tempo. Vamos ver como é que essa avaliação será feita.
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