Vitorino recusa "mordomices" e diz que "políticos têm de descer à terra"
Vitorino Silva, candidato às eleições presidenciais, que acontecem no dia 24 de janeiro, é um dos entrevistados de hoje do Vozes ao Minuto.
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Política Presidenciais
Vitorino Silva, mais conhecido como 'Tino de Rans', é candidato à Presidência da República pela segunda vez. Em 2016, foi a escolha de 3,28% da população, o equivalente a mais de 152 mil votos.
Calceteiro de profissão, é com orgulho que se assume como o candidato de e pelo povo. Com o país a atravessar uma situação pandémica insustentável, Vitorino Silva recusou as "mordomias" políticas e uniu-se aos portugueses no confinamento, passando a fazer campanha online.
Defensor de que a democracia é para todos, promete "não deixar nenhum português" para trás.
Inicialmente, apesar de a sua candidatura ter sido aceite e de há cinco anos ter reunido 3,28% dos votos, não foi incluído nos debates com os restantes concorrentes à Presidência da República. Como viu esta atitude?
Com normalidade. Nunca pedi esmola, não ia pedir para ir aos debates. Agora, gostava de ser tratado como igual, o povo queria que eu fosse tratado por igual, e não fui. Só fui chamado aos debates por causa da força das redes [sociais], da Internet, das rádios locais e podcasts.
O Porto Canal convidou-me e depois a RTP chamou-me para a RTP3, houve candidatos com quem falei às 22h45, o único que não tinha sinal aberto, enquanto os outros marcaram as televisões todas. Senti que o povo ficou triste.
Toda a gente sabe que eu fui, de todos os candidatos, aquele que não teve grande tempo de antena
Por outro lado, agora, a ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social - ordenou o cancelamento dos debates no Porto Canal (nos quais estaria em todos). Decisão essa que teve origem após a queixa da candidatura de João Ferreira, que alegou que seria colocado "em causa o princípio de igualdade e tratamento". Concorda com a decisão?
Foi uma grande desfeita, o Porto Canal foi o primeiro a abrir-me as portas. Nem percebi muito bem o motivo. Toda a gente sabe que eu fui, de todos os candidatos, aquele que não teve grande tempo de antena e continuo a não ter direito ao mesmo tempo de antena, basta ver os telejornais das três grandes televisões e ver os minutos que me dão. Porque é que não tratam todas as candidaturas por igual? O processo é igual, sou português como eles, não sou mais nem menos que nenhum português. Porque é que isto ainda acontece num país livre, democrático...
Do seu ponto de vista, essa diferença de tratamento que menciona deve-se a que motivo?
Não sei. Foi de propósito, não tenho dúvidas, a prova é que estive nos debates e até correram muito bem, e era uma pena se eu fosse excluído como fui há cinco anos. Fizeram sondagens em que nem colocaram o meu nome, gostava de ver uma sondagem que não incluísse o nome de Marcelo [Rebelo de Sousa]. Não me respeitaram... não é a mim, é ao povo português. O povo português está muito atento e felizmente é formado e, sobretudo, muito informado. Hoje, quando a informação chega é para todos.
Há um chico esperto que pensa que alguém pode ser deixado para trás, mas a democracia é para todos
O partido que lidera, o RIR [Reagir - Incluir - Reciclar], defende que "é preciso incluir os cidadãos nas decisões políticas e reciclar o poder do voto, o poder dos eleitores". Levaria este princípio para Belém?
Claro. Sou presidente do RIR e a primeira coisa que fiz foi dar a liberdade de voto, porque é uma eleição diferente. Sou presidente do RIR, mas isto é uma eleição de pessoas e fico triste quando os partidos metem o bedelho nestas eleições. Porque é que de início só aceitaram nos debates os partidos com assento parlamentar? É incrível, o alvará do RIR é igualzinho ao alvará dos outros partidos e os partidos também vão a votos (legislativas, juntas de freguesia, etc). Esta eleição é de pessoas, é uma eleição singular.
De que forma seria implementada esta tal inclusão dos cidadãos?
Cabemos todos, isto é o nosso país, não há portugueses de domingo e outros de segunda. Não é preciso tirar um curso para perceber que a democracia é para todos. Eu quando digo que nem as pedras deixo para trás, pessoas também não deixo. E há políticos que têm deixado alguns para trás. Cabemos todos, isso é a democracia, o incluir e não o excluir.
Há um chico esperto que pensa que alguém pode ser deixado para trás, mas a democracia é para todos. Não há portugueses de primeira e de segunda.
Tem defendido, inclusive nos debates com os diversos candidatos, o adiamento das eleições. Chegou a afirmar até que, se fosse eleito com uma grande taxa de abstenção, "teria vergonha" de aceitar o resultado dessa eleição.
Fui o primeiro [a dizer], o povo é sábio. Toda a gente sabe que em janeiro está frio de rachar, cai a folha, não há oxigénio, e que morre muito mais gente em janeiro porque as pessoas estão mais fragilizadas, principalmente as pessoas de idade. Os políticos não perceberam isso, não adiaram porque não quiseram.
Quando anunciei a candidatura [em setembro] disse que devíamos proteger os nossos idosos, disse que ‘em janeiro isto ia estar catastrófico’ e eles riram-se.
Ninguém devia tomar posse se não tivesse 50% dos votantes
Adiar a data das eleições exigia uma alteração da Constituição.
Isso em 30 dias consegue-se. Eu falei em setembro, tive reunião com o Presidente em outubro, não adiaram porque não quiseram.
Foi falta de preparação?
Não deram tanta atenção à voz do povo, que anda no terreno de janeiro a dezembro. Eu, como calceteiro, sei muito bem que em janeiro estão graus negativos, em agosto há 30 graus e mais oxigénio. Toda a gente sabe que a Covid-19 afeta os pulmões (as vias respiratórias), e de inverno as folhas caem e não há tanto oxigénio.
Temos de defender a democracia. O voto tem de ser defendido, as pessoas têm de ir votar
Considera que estão reunidas as condições para uma elevada taxa de abstenção e que isso retira valor a este processo democrático? No passado domingo, dia 17 de janeiro, mais de 110 mil pessoas votaram antecipadamente.
Não tomo posse. Ninguém devia tomar posse se não tivesse 50% dos votantes. Acho que neste momento, aí mudei de ideias, o povo vai votar massivamente, tenho a certeza.
No domingo, [os locais de voto] podiam era ter aberto mais cedo, em vez de abrir às 08h00, abrir às 06h00 e fechar às 22h00, ou [a votação] ser em dois dias, tal como defendi e deixei nas mãos do Presidente da República. Se no domingo podiam votar, porque é que não podiam votar também no sábado.
Foram várias as imagens e queixas [divulgadas nas redes sociais] sobre as longas filas que se formaram nesse dia, numa altura em que o país enfrenta um elevado número de novos casos. Houve falta de preparação?
[Filas] foram enormes porque em Lisboa há muita gente, mas no país há milhares e milhares de mesas de voto e as pessoas não podem ter medo de ir votar porque a democracia está em risco. Temos de defender a democracia. O voto tem de ser defendido, as pessoas têm de ir votar. Gostaria que não fosse em janeiro, que fosse mais à frente, mas não sendo possível, temos de ir votar.
Eu estou ajudar quando passo a mensagem de que vou para casa. Não quero mordomices políticas e estou em casa a fazer campanha
Acredita numa segunda volta?
Acredito numa segunda volta, já aconteceu, por que não agora...
Depois de ter participado na reunião do Infarmed com os especialistas, afirmou que concordava com o confinamento geral já, se as eleições fossem adiadas. Não sendo, afirmou que o confinamento deveria ser decretado após o dia 24 de janeiro. Adiar dez dias esta medida, que reuniu o consenso dos especialistas, não seria imprudente?
Atenção, só tenho a minha opinião, é a minha opinião. Se perguntassem aos 10 milhões de portugueses, provavelmente haveria milhões [de opiniões]... é muito fácil ser treinador de bancada.
Eu também respeito muito a Direção-Geral da Saúde porque isto é uma guerra mundial, não é só de Portugal, e percebo muito bem as preocupações deles, não é fácil lutar contra um covarde, a Covid-19 é covarde, ataca pelas costas. É difícil, e neste momento acho que todos, mesmo todos, temos de ajudar o Governo. Eu estou ajudar quando passo a mensagem de que vou para casa, não quero mordomices políticas e estou em casa a fazer campanha.
Neste momento temos de estar unidos, o público e o privado, todos são precisos e mesmo assim não conseguimos
Critica a decisão dos restantes candidatos em manter as ações de campanha?
Não critico, cada um faz o que quer. Agora, eu faço em casa, porque em casa faço campanha segura e há adversários que não fazem campanha segura. Os restaurantes estão todos fechados e não podem abrir... abrir um restaurante para um jantar com 170 pessoas... As pessoas revoltam-se.
Os políticos têm de descer à terra. Quando digo que não quero mordomias é porque mais do que candidato a Presidente da República, sou um cidadão normal e não quero regalias.
Temos o melhor Serviço Nacional de Saúde do mundo
A importância e também as fraquezas do Serviço Nacional de Saúde [SNS], que tem sido a principal rede de resposta à pandemia de Covid-19, foram realçadas nesta crise. Considera que o investimento neste setor deve continuar a ser aumentado? Quanto ao papel dos privados? Deverá haver uma maior integração?
Toda a gente sabe que o SNS é uma conquista e podem ter a certeza que temos o melhor Serviço Nacional de Saúde do mundo. Estive na América e há gente que para ter um filho tem de pagar mais de cinco mil dólares.
Nós temos um bom serviço de saúde e não é por causa desta pandemia mundial que vai deixar de ser bom. O nosso serviço é bom, responsável e temos profissionais no público e no privado e precisamos de todos. Como já disse num debate, se um português estiver a morrer não se importa se é salvo por um médico do público ou do privado, o que quer é ser salvo. Isto não é questão, neste momento temos de estar unidos, o público e o privado, todos são precisos e mesmo assim não conseguimos.
Deve então existir uma maior colaboração?
O privado está de mãos abertas para ajudar. Qual é a razão de haver hospitais privados e públicos? É salvar pessoas. Ninguém abre um hospital privado que não seja para salvar pessoas. Quem tem um hospital privado quer salvar e ajudar pessoas, quer saúde.
Acho que sou o candidato que melhor conhece o país
A lei da eutanásia chegará às mãos do Presidente da República após as presidenciais de 24 de janeiro. O que faria enquanto Presidente nessa situação?
Eu sou a favor da eutanásia, mas também defendo que haja um referendo, porque é uma opinião pessoal e devia ser referendado. Acho que o Presidente da República teve tempo, ele não pode dizer que não o fez por falta de tempo, porque ele teve mais do que tempo. É um sim ou um não, agora 'nim’s'... Não precisamos de um Presidente da República que diga nim’s. É um sim ou um não.
A Ryanair fez mais por algumas regiões do país do que a TAP. A TAP distraiu-se em relação ao resto do país e o país está atento
Se vencer as eleições em que aspetos divergirá e convergirá do mandato de Marcelo Rebelo de Sousa?
Somos duas pessoas diferentes. Ele tem mais sabedoria da academia e eu tenho a escola da vida. Mas é preciso as duas escolas, se alguém pensa que o saber está todo na academia, na cultura e nos estudos, engana-se.
Sou um presidente 'rurbano'. Seria um presidente que ia jogar no campo todo, metade da minha vida é rural, metade é urbana. Acho que sou o candidato que melhor conhece o país. O candidato da ruralidade e da urbanidade.
Afirma-se como o "candidato do povo". Como é que o candidato do povo vê o plano de reestruturação da TAP?
Toda a gente sabe o que aconteceu no Novo Banco e não quero que exista a TAP boa e a má, quero é que a TAP seja forte, reestruturada, porque a Covid-19 vai passar e nós temos o turismo e não quero que eles [os turistas] venham visitar Portugal de carroça, o tempo da carroça já lá vai. A TAP tem que estar sempre de pé.
Concorda então que é necessário salvar a TAP?
Claro, mas que não se abandone o resto do país. A TAP tem de fazer pelo país, estar ao serviço dos portugueses espalhados pelo país. A Ryanair fez mais por algumas regiões do país do que a TAP. A TAP distraiu-se em relação ao resto do país e o país está atento. Claro que houve erros, mas que não se voltem a repetir no futuro e que os gestores da TAP aprendam com os erros do passado.
Qualquer decisão de António Costa, é a decisão. Neste momento, ele sabe mais, tem informação que nós não temos
Avizinham-se ainda meses difíceis, apesar da campanha de vacinação já estar a decorrer em Portugal. Qual a principal lição que o país pode tirar desta pandemia?
[A lição] é que o Homem é apenas uma espécie, o Homem tem de cair na realidade de que não é o dono disto tudo e temos de saber viver em parceria com as outras espécies. O Homem é tão pequenino (...) nunca vi nenhum homem com capacidade para instalar um processo à Natureza, nunca ninguém processou a Natureza. A grande lição é que o Homem é muito pequenino e se há espécies que foram extintas, como os dinossauros, o Homem que não se ponha a jeito.
António Costa anunciará dentro de minutos o reforço das medidas em vigor durante o período de confinamento [entrevista decorria no momento em que o primeiro-ministro fazia o anúncio do reforço das medidas]. Tendo em conta a movimentação que se viu nas ruas durante o passado fim de semana, considera imperativo este reforço?
Temos de estar unidos, isto é um problema de todos. Qualquer decisão de António Costa, é a decisão. Neste momento, ele sabe mais, tem informação que nós não temos, e temos de acreditar na informação que ele dá.
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