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"Encontro falta de preocupação na urgência de ver caso Setúbal resolvido"

Fernando Negrão, deputado e vereador de Setúbal do PSD, é o convidado desta quinta-feira do Vozes ao Minuto.

"Encontro falta de preocupação na urgência de ver caso Setúbal resolvido"
Notícias ao Minuto

19/05/22 por Marta Ferreira

Política Fernando Negrão

Fernando Negrão preside à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e tem sido uma das vozes críticas sobre a falta de esclarecimentos por parte do primeiro-ministro, António Costa, acerca do caso do acolhimento de refugiados ucranianos por russos pró-Kremlin. 

O deputado e vereador de Setúbal considera, em entrevista dada ao Notícias ao Minuto, que as audições até agora realizadas não são suficientes, apesar de terem sido importantes, e que, na sua perspectiva, há "falta de preocupação na urgência de ver caso Setúbal resolvido".

Defende também que os serviços de informação portugueses (Sistema de Informações da República Portuguesa - SIRP) necessitam de mais meios técnicos - nomeadamente com recurso a metadados - para levarem a cabo o seu trabalho de forma mais eficaz. "Temos de ir mais longe", sublinhou. 

Relativamente às eleições que se avizinham do PSD, em que Jorge Moreira da Silva e Luís Montenegro são candidatos à liderança do partido, Negrão tende a preferir Moreira da Silva considerando que daria "um grande primeiro-ministro".

Setúbal? [Costa] ainda não deu informações nenhumas sobre este assunto a não ser tomar posição sobre a realização de inquéritos

Considera que as audições sobre o apoio a refugiados ucranianos por apoiantes do regime de Putin na Comissão de Assuntos Constitucionais foram suficientes?

Não foram suficientes, mas foram importantes porque ficamos com a noção de como é que o sistema funciona e como é que, por vezes, não funciona. Esses dados que recolhemos foram importantes para os nossos juízes, mas estão em falta ainda as diligências feitas pelo Governo, das quais aguardamos os respetivos relatórios, e há um problema por resolver que tem a ver com a questão dos serviços de informação. É de difícil resolução porque as exigências do segredo de Estado são muito fortes, no sentido de proteger, de facto, mas, simultaneamente, temos de pensar que eles não devem prejudicar o curso de investigações que também elas são importantes para o próprio Estado.

Portanto, acredita que Costa deveria prestar mais esclarecimentos?

Sim. Ainda não deu informações nenhumas sobre este assunto a não ser tomar posição sobre a realização de inquéritos, portanto, presumo que esteja a aguardar os resultados dos inquéritos para depois dar mais informações. 

Acha que deve ser um assunto a ser escrutinado no Parlamento?

Acho que devia ser escrutinado no Parlamento e nós começámos a fazê-lo, mas, na altura, tivemos essa dificuldade de aceder aos serviços de informação que a Lei impõe regras muito estritas no que diz respeito à proteção do segredo de Estado. 

Os nossos serviços de informação trabalham muito limitados nas suas competências

Como é que, para si, deveria ser feita esta fiscalização das ‘secretas’ e em que falham os serviços de informação portugueses?

A fiscalização existe. Quando defendo o reforço da fiscalização dos serviços de informação tem a ver com o reforço de competências e com o reforço de meios que nós temos de dar aos nossos serviços de informação. Os nossos serviços de informação, neste momento, trabalham muito limitados nas suas competências porque a sua atividade resulta quase exclusivamente na recolha de informações, sejam elas das chamadas pontes abertas que são, por exemplo, como os jornais e comunicação social em geral, sejam elas de informações recolhidas através dos cidadãos e através de contatos feitos pelos agentes dos serviços. Temos de ir mais longe. 

Temos de fornecer aos serviços de informação mais meios, designadamente os agora tão famosos metadados. Os metadados não são escutas telefónicas. Os metadados, já tem sido explicado, é só para saber quem contacta quem quando e de onde para onde. Estes dados são fundamentais. 

Portanto, quanto mais competências dermos aos serviços de informação, maior e mais forte é a atividade. 

Acredita que são necessários, portanto, mais meios técnicos?

Exatamente, mais meios técnicos e mais capacidade de ação no sentido do tratamento das informações.

Vamos ver se essas suspeitas do doutor Marques Mendes se confirmam ou não 

No início de maio, Marques Mendes dizia que o facto de o PS usar a sua maioria absoluta para (inicialmente) impedir audições no Parlamento poderia significar ou que escondia alguma coisa, ou que queria agradar o PCP por se tratar de um assunto incómodo. Qual é a sua opinião?

Entretanto, das entidades que foram ouvidas, o PS acabou por votar favoravelmente pelas audições de todas, à exceção de uma que são os serviços de informação. Portanto, este é o ponto de situação e aguardamos pelos resultados para ver se essas suspeitas do doutor Marques Mendes se confirmam ou não. 

Considera que o PS votou favoravelmente devido à pressão dos partidos?

A explicação só pode ser essa, não é? Porque num primeiro momento votou contra e na altura da realização das diligências entendeu votar a favor.

Considera que possa haver um problema de transparência no que diz respeito à entidade fiscalizadora dos SIRP? 

Não tem a ver com a entidade fiscalizadora. As entidades fiscalizadoras existem e fazem muito bem o seu trabalho, assim como os agentes de informação fazem muito bem o seu trabalho e são até elogiados em países estrangeiros. A questão está no facto de as informações recolhidas e tratadas terem chegado ao Presidente da República e ao primeiro-ministro só depois de se tornar público o caso. Isso é o grande motivo de preocupação. Será que isso aconteceu? Por que razão? Porque não havia nada a assinalar de especial? Mas se chegou alguma coisa depois de se ter tornado público através do jornal Expresso é porque havia alguma coisa a assinalar. O quê? 

O que acha desses relatórios só terem chegado depois de se ter sabido pela comunicação social?

Considero isso preocupante e foi isso que aconteceu. Sabemos bem! O primeiro-ministro confirmou que só recebeu depois da notícia ter sido pública e isso é preocupante porque alguma coisa chegou, não sabemos é o que terá chegado.

É preciso ser escrutinado. Não podemos ter um sistema em que as informações vitais chegam só a uma ou duas pessoas. Desta forma, o escrutínio é quase impossível.

Encontro alguma falta de preocupação na urgência de ver este caso resolvido.

Encontra algum ‘culpado’ em toda esta situação?

Não encontro culpado nenhum. Encontro uma enorme falta de sensatez. Encontro alguma falta de preocupação na urgência de ver este caso resolvido. Para já, culpados ainda não encontrei nenhum. 

Acredita que o presidente da Câmara de Setúbal se vá manter no decorrer das investigações?

O presidente da Câmara Municipal de Setúbal já tem duas marcas que dificilmente se livrará delas. A primeira é não ter explicado aos cidadãos de Setúbal, na sua Câmara, a sua versão dos factos, ou o seu entendimento dos factos, e a segunda é a completa falta de sensatez em manter cidadãos russos a acolher refugiados ucranianos quando há uma guerra entre dois países, onde a Rússia invade a Ucrânia. 

Acredita que isto pode levar à demissão do autarca?

Acho que estamos a falar de assuntos de Estado muito sensíveis, estamos a falar de coisas ligadas à segurança interna e portanto devemos ser sensíveis também ao tempo. 

Considerava que André Martins se deveria demitir?

Eu nunca disse que o presidente da Câmara se deveria demitir. Eu disse que se deveria demitir ou por sua iniciativa ou no fim das investigações se, de facto, houvesse razões para isso. 

Mas tinha dito, em declarações anteriores, que, caso André Martins se demitisse, nunca se encontraria um ‘culpado’ e o caso ficaria encerrado.

Disse isso se, realmente, nós não formos suficientemente urgentes – e quando digo nós falo da Assembleia da República e também Governo – na investigação e se ficarmos bloqueados pela impossibilidade de acesso a informação do serviço de informações. 

O caso Setúbal é uma mancha no acolhimento de refugiados em Portugal no que diz respeito à imagem que temos no estrangeiro?

Não é bom, naturalmente que causará alguma preocupação no meio diplomático e no meio político, mas não queria transformar isto num caso dramático para a imagem de Portugal, que não é. Acho que não afetará tanto quanto algumas vozes, e foram poucas, assinalaram.

Moreira da Silva pode dar ao país um grande primeiro-ministro 

Mudando agora o foco para as eleições internas do PSD. Acredita que Moreira da Silva é um bom candidato para suceder a Rui Rio?

Em primeiro lugar, tenho de dizer que tanto Moreira da Silva quando Luís Montenegro são dois bons candidatos para o liderar o PSD. Têm feito uma campanha interna exemplar no sentido de expressar mais as opiniões onde estão de acordo do que aquelas em que estão, aparentemente, em desacordo. 

Mas considero que - tendo ambos grandes qualidades para serem líderes do PSD - Jorge Moreira da Silva tem uma formação nacional e internacional que no PSD é exemplar, no país é invulgar e pode dar ao país um grande primeiro-ministro. 

O que acha que trará de novo para o partido?

A sua formação trará, de facto, uma visão nova do PSD e trará ideias novas para o país. Mas não quero com isto dizer que Luís Montenegro não o possa fazer, mas a sua experiência é diferente, que ainda não está virada para soluções mais radicais do ponto de vista da modernidade. Ainda assim, eu li as moções de ambos e diria que as diferenças não são muito grandes. As diferenças não são assinaláveis, não são suficientes para afastar um do outro de forma irreversível e o que o PSD precisa mesmo é de união e tranquilidade, de voltar a falar com os portugueses e trazer ideias novas para Portugal.

Comparando ambos, apesar de considerar Moreira da Silva mais capaz de desempenhar o cargo, acha que o peso mediático de Montenegro poderá beneficiá-lo?

O mediático hoje em dia tem de ter em conta todos os candidatos e os candidatos têm de ter em conta o espaço mediático e, portanto, nessa medida também haverá disputa nestas diretas. Se me perguntar se Luís Montenegro é uma pessoa mais conhecida a nível nacional, eu diria que sim, foi um grande líder parlamentar e isso deu-lhe uma projeção mediática muito grande. Até que ponto é que isso o vai beneficiar ou não… enfim, depois das eleições saberemos. 

O que acha que falhou na campanha de Rio que o levou a perder contra Costa e ainda para mais com uma maioria absoluta?

Confesso que não estou propriamente preocupado com essa questão da derrota de Rui Rio. Com tudo o que sabemos, até os especialistas ficaram admirados com esta maioria absoluta e com a sua amplitude. Alguma coisa terá acontecido nos votantes e no momento da votação uma vez que antes tudo indicava que isso [maioria absoluta] não iria acontecer. Mas há um problema com o PSD e esse problema foi o afastamento dos portugueses. Foi uma falta de diálogo com os portugueses, com os agentes das diversas áreas profissionais, das diversas áreas mesmo políticas, das diversas áreas sejam elas científicas, sejam elas jurídicas, sejam no âmbito médico… o PSD afastou-se da sociedade e tem de recuperar esse diálogo com a sociedade, é fundamental porque o PSD sempre soube falar para a sociedade e, neste momento, não só não tem falado como não tem escuto. 

Rui Rio manifestou sempre uma posição de ‘nim’ relativamente ao Chega, com avanços e recuos. Já Moreira da Silva é perentório e disse, no seu discurso, "Nunca, jamais, em tempo algum" a um possível entendimento com o partido de André Ventura. Acha que essa posição mais firme pode ser mais positiva para o PSD?

Eu acho que se deve ser resolvido relativamente a alguns valores que o Chega defende como a divisão dos portugueses entre os ‘bons’ e os ‘maus’, como às vezes algumas medidas que propõe que têm traços nítidos de racismo e xenofobia. Agora, eu também acredito noutra coisa. Acredito que o Chega institucionalizando-se, ou seja, integrando a vida política normal de todos os dias, vai perceber que os portugueses querem uma sociedade justa sem racismo, sem xenofobia, e, principalmente, sem políticos que o queiram dividir.

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