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"Direita falhou em toda a linha do seu projeto político pós-Geringonça"

Carlos Pereira, líder do PS-Madeira, é o entrevistado do Vozes ao Minuto desta semana.

"Direita falhou em toda a linha do seu projeto político pós-Geringonça"
Notícias ao Minuto

07/02/17 por Inês André de Figueiredo

Política Carlos Pereira

Carlos Pereira, líder do Partido Socialista da Madeira e deputado na Assembleia da República, quer mudar o rumo da governação madeirense e construir uma alternativa ao PSD no arquipélago, tendo em conta que o partido 'laranja' está no poder há 40 anos. Sobre o Governo nacional, o socialista garante em entrevista ao Notícias ao Minuto que o rumo seguido é benéfico para a população e contraria o discurso do 'diabo' que a Direita apresentou.

Estamos no início do ano e 2017 teve um aumento do salário mínimo nacional. A negociação não foi fácil mas chegou a bom porto, como vê esta decisão?

O Governo tinha dito que o caminho que seguiria era de aumento do salário mínimo. O PS sempre disse desde o início que não faríamos o importante objetivo de competitividade do país à custa do empobrecimento e de salários baixos. Esse discurso do PSD e CDS de que o país só é competitivo se empobrecer sempre foi repudiado por nós desde a primeira hora, já na oposição o fazíamos.

Também dissemos que a questão do salário mínimo era essencial e desejável que fosse decidida num quadro de articulação e negociação entre todas as entidades, porque achámos que esse diálogo social era essencial para dar algum consenso à volta deste tema.

Este aumento do salário mínimo nacional parece-nos o corolário lógico daquilo que foi a promessa que fizemos e estamos a fazer um esforço de cumprir todas as promessas que fizemos. Contrariamente ao que disse o PSD, e em particular Passos Coelho, de que o aumento do salário mínimo trazia desemprego, nós estamos a constatar que, pelo contrário, o desemprego está a baixar.

A sobretaxa de IRS acabou para os contribuintes que recebem menos, as famílias poderão reduzir no IRS as despesas nas cantinas e transportes escolares e o IVA do passe social também poderá ser deduzido. Pretende-se devolver a capacidade de consumo às famílias mais carenciadas, como foi prometido inicialmente pelo PS?

A política fiscal que estamos a seguir é a que achamos certa para um país que quer ter crescimento económico mas também justiça social. Contrariamente ao que fez o governo anterior, que resolveu lançar uma tese de que devia de haver ética na austeridade, nós não vimos ética nessa austeridade. E o que estamos a fazer agora é garantir que a política fiscal vai ao encontro do objetivo do crescimento económico mas também possa contribuir para que as famílias possam ter níveis de vida mais adequados ao mundo moderno que vivemos. E isso parece-me totalmente natural.

A recapitalização da CGD é um dos maiores desafios deste GovernoÉ óbvio que a crítica que o PSD faz de que há uma transferência dos impostos diretos para os indiretos e que tudo fica igual não é mesmo nada verdade. A verdade é que temos de fazer opções e as opções feitas relativamente a impostos indiretos parecem naturais para todos, pois esses permitem que as pessoas possam optar, enquanto que nos diretos ficavam imediatamente sem o dinheiro.

Mas os aumentos nos combustíveis, portagens, ou bebidas açucaradas são necessários para que os objetivos do Governo sejam cumpridos?

Nós preferimos aplicar medidas como a ‘fat tax’ em que, naturalmente, a opção de consumo daquele tipo de produto é possível fazer e isso não coloca em causa o mínimo de vida das pessoas - além de ser receita fiscal é uma questão de saúde pública – e satisfaz o interesse das famílias e do programa de Governo.

Bloco de Esquerda e PCP têm um papel fundamental neste tipo de medidas?

O que estamos a fazer é a cumprir o nosso programa que tem de ser cumprido e depois cumprir aquilo que é o acordo com o Bloco e PCP. Todas as linhas de orientação que temos acordadas são para cumprir.

Nos últimos meses ficou claro que esta solução de Governo permitiu algo em que ninguém acreditava à partidaHá um conjunto de linhas de orientação que foram definidas e que estão a ser materializadas do ponto de vista orçamental, mas é óbvio que estas medidas não se tomam todas de uma vez e os timings de aplicação destas medidas também têm a ver com o programa de Governo.

Em relação à CGD, a administração de Paulo Macedo acabou de tomar posse. É um dossier que continuará a dar que falar?

Acho que a recapitalização da CGD é um dos maiores desafios deste Governo, porque é, porventura, um dos vértices daquilo que é muito importante acontecer em Portugal que é a reestruturação do setor bancário. Temos observado que há várias questões para resolver nos próximos anos mas não tenho dúvida nenhuma de que a questão do setor bancário é uma delas. Essa resolução passa, naturalmente, pela boa recapitalização da CGD e esse tem de ser um processo que tem de correr bem e o Governo tem essa responsabilidade.

A escolha de Paulo Macedo foi a mais acertada?

Parece-me que é uma escolha consensual.

Concorda com ela?

Sim. É consensual entre PS e PSD. Se o PS escolheu é porque concorda, o PSD acha que é o homem certo, portanto é uma escolha consensual, contrariamente a António Domingues, que não o era. Aparentemente, o PSD não gostava dele e ficámos numa situação melhor.

A 'Geringonça' vai aguentar até às eleições e poderá continuar no futuro?

Não gosto de fazer futurologia. Mas nos últimos meses ficou claro que esta solução de Governo permitiu algo em que ninguém acreditava à partida, que era um Governo que trouxe estabilidade, que era algo muito importante. É preciso não esquecer que estamos numa Europa em que essa estabilidade não abunda e, portanto, este país pequeno e com esta situação pouco normal conseguiu ter estabilidade.

Continuam a aspirar que o Governo caia para, eventualmente, serem eles os salvadores de uma pátria que não está perdidaAs organizações que não têm estabilidade não conseguem estabelecer os objetivos e esta tem estabilidade, claramente, com muito esforço. Todos percebemos que os partidos têm feito um esforço enorme para que essa estabilidade seja uma realidade. Há obviamente desafios porque estamos a falar de partidos com matrizes completamente diferentes.

A discussão parlamentar tem sido capaz, pela habilidade e inteligência de todos os intervenientes, de incluir todos os problemas que vão surgindo e penso que não há razão para haver instabilidades surpreendentes que levem a que isto se desvaneça e que o país perca esta possibilidade de continuar a fazer uma coisa em que muita gente não acreditava, que há uma alternativa à política de austeridade que estava a ser seguida.

E os partidos de Direita estão conformados com esta solução?

Não me compete a mim falar dos outros partidos, mas acho que depois da saga do diabo não sei se aparecerá outra saga que anime os partidos da Direita. Julgo [que os partidos] têm de pensar bem no caminho que estão a seguir. Estamos a falar do interesse do país e é importante fazer um apelo a algum patriotismo nesta altura. Estamos a conseguir fazer coisas que não aconteceram nos últimos cinco anos e acho que é dever desses partidos fazerem o seu papel de escrutínio da vida governativa, mas tentando resistir à tentação de criar entropia de tal forma severa que coloque em causa esta estabilidade e impeça que o país cumpra os seus objetivos.

Como avalia a atitude de PSD e CDS enquanto oposição?

Julgo que PSD e CDS levaram longe demais o processo de reconhecimento de que esta solução governativa é bem-sucedida. Hoje, continuam, muitos deles, a resistir a fazerem um papel de oposição pura e dura. Continuam a aspirar que o Governo caia para, eventualmente, serem eles os salvadores de uma pátria que não está perdida. Aliás, é bom lembrar que as primeiras expressões que ouvi na Assembleia da República por parte do PSD e do CDS foi ‘não estraguem, porque isto estava tudo certinho e por isso não estraguem’. Ora, agora o que percebemos é que estava tudo estragado e entrámos para resolver o estrago que foi feito e a herança que foi deixada. Portanto, agora dizemos ‘não estraguem, porque está a correr bem para o país’.

O PSD neste momento está um labirinto e está com dificuldades de sair desse beco em que se meteuQuando as famílias dizem ‘nós vamos continuar a consumir’ e isso vai puxar o PIB e as empresas também dizem ‘nós continuaremos a exportar e vamos exportar mais ainda em 2017’ é sinal de confiança. Esta ideia de que o PSD e o CDS sempre passaram de que haveria um colapso da confiança nunca aconteceu. Aliás, nenhuma das previsões que o PSD e o CDS apresentaram ocorreram.

A narrativa da Direita falhou?

A Direita falhou em toda a linha naquele que era o seu projeto político depois das criação da ‘Geringonça’. Julgo que o PSD neste momento está um labirinto e está com dificuldades de sair desse beco em que se meteu, mas tem oportunidade de o fazer até às eleições autárquicas para mostrar que é um partido com sentido de responsabilidade e que perante os resultados do país fará aquilo que lhe compete.

Marcelo Rebelo de Sousa tem tido um papel importante nesta harmonia entre Governo e Presidência da República, mas há quem diga que este 'estado de graça' tem muito a ver com o início da governação de ambos. Haverá tempestade?

Não sei o que vai na cabeça de Marcelo Rebelo de Sousa mas acho que o seu papel tem sido importante para este equilíbrio e estabilidade, tem sido uma peça importante. Mas nenhum de nós, socialistas, está à espera que Marcelo Rebelo de Sousa leve o Governo ao colo.

Estamos a fazer o nosso trabalho nem a pensar em Marcelo, nem em Passos Coelho, nem em Assunção Cristas. Estamos a fazer aquilo que são os compromissos que temos com o eleitorado e com o acordo que temos com Bloco, PCP e ‘Os Verdes’.

Nenhum de nós, socialistas, está à espera que Marcelo Rebelo de Sousa leve o Governo ao coloO papel de Rebelo de Sousa é relevante para a estabilidade mas foi relevante para outra coisa que o país precisava e ansiava, que era para garantir que o país desanuviava da pressão excessiva que quer Cavaco Silva, quer Passos Coelho, quer Paulo Portas introduziram no país.

*Pode ler a segunda parte desta entrevista aqui.

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