Meteorologia

  • 23 NOVEMBER 2024
Tempo
14º
MIN 13º MÁX 22º
Vozes ao Minuto

Vozes ao Minuto

Vozes com opinião. Todos os dias.

"Nunca percebi porque é que, morrendo alguém, não se deve perguntar como"

O ministro da Defesa, José Alberto Azeredo Lopes, é o entrevistado de hoje do Vozes ao Minuto.

"Nunca percebi porque é que, morrendo alguém, não se deve perguntar como"
Notícias ao Minuto

21/03/17 por Elsa Pereira e João Oliveira

País Azeredo Lopes

Azeredo Lopes. Não era a escolha mais óbvia para a pasta da Defesa, mas foi a de António Costa. Sinal de desinvestimento na tutela? Recusa a ideia. Aliás, o que se previa ser um desafio calmo, tem-no sido muito pouco. Colégio Militar, Comandos, Operação Zeus. Apenas alguns dos casos que teve de enfrentar em pouco mais de um ano. E enfrentou.  Não é de deixar as coisas pela metade e trata-as pelo nome.

Afavelmente, recebe-nos no seu gabinete para uma conversa - viríamos a descobrir mais tarde - longa. E, sem olhar para o relógio, não se escuda a matérias suscetíveis de gerar algum desconforto.

Invoca legitimidade política para calar os descontentes e apelida de "tontos" alguns que chegaram a reclamar a sua demissão. Mas explicando porquê, sem tiques de despotismo. O ministro da Defesa é o entrevistado de hoje do Vozes ao Minuto.

Não era um dos nomes mais prováveis para assumir esta pasta. Não tinha um peso político muito forte nem ligação às Forças Armadas. Na altura falou-se que isso seria sinal de que António Costa não daria especial atenção à pasta da Defesa. Como responde, agora, a quem assim vaticinava?

Normalmente, não respondo a quem faz vaticínios e muito menos quando são vaticínios em que as pessoas se enganam. De facto, na altura disse-se muita coisa, não só sobre a Defesa como sobre outras pastas. 

A questão do peso político resulta, a meu ver, muito mais da ação governativa do que de prognósticos feitos antecipadamente e creio que, independentemente de não falar de mim, os diagnósticos sobre eventual desinteresse no Governo a propósito do Ministério da Defesa foram desmentidos ao longo deste ano. Acho que se falou muito da Defesa, às vezes não pelas mais agradáveis razões. 

Uma das principais questões que se coloca na política da governação e sobretudo na área da soberania é quando dizemos uma coisa hoje e depois flutuamos e dizemos outra amanhã e outra depois de amanhã. Portanto, se olhar para o que é hoje a área da governação, independentemente de ela não ter feito ou sido objeto de um acordo específico para a viabilização de uma solução governativa, a verdade é que a Defesa, a meu ver, está muito bem representada e tem conseguido ocupar um espaço de cidadania que ultrapassa muito a própria titularidade da pasta, e que diz respeito especificamente a uma função moderna das Forças Armadas, numa sociedade democrática como é a portuguesa.

Não tenho nada a ideia de nunca me enganar e raramente ter dúvidas. Não padeço dessa sorteMas ficou ou não surpreendido com o convite?

Fiquei, claro. Sabe que eu não tenho nunca aptidão para gerar expetativas ou trabalhar expetativas para convites. Não está de todo na minha prática de vida. Foi um convite que me honrou muito, que tem ainda por cima um grande desafio e que correspondeu àquilo que eu procurei sempre fazer na vida. Portanto, isto [o convite], para mim, representou uma oportunidade muito engraçada de poder, no fundo, verificar se algumas das minhas condições batiam certo. Parece que não me enganei. E não tenho nada a ideia de nunca me enganar e raramente ter dúvidas. Não padeço dessa sorte. 

É muito importante que se perceba o seguinte: não é possível ter Forças Armadas reforçadas e motivadas se não houver o reconhecimento de conceitos a que nós nos habituámos, quase de forma pequeno-burguesa, a dar por adquiridos. Todos evocamos mas muito poucos sabem o que é a família militar, ou porque é que os deficientes representam uma obrigação fundamental e até de decência cidadã, ou porque é que não podemos deixar essa questão ser degradada ou colocada em segundo plano.

Quando acabou a Guerra Colonial, Portugal não podia manter Forças Armadas de centenas de milhares de pessoas, não podia. Não era concebível, independentemente do Serviço Militar Obrigatório. Nós não temos noção por vezes do que significou passar dessa dimensão esmagadora para uma dimensão de trinta mil efetivos. É enorme o esforço que as Forças Armadas fizeram e como foram capazes de se readaptar socialmente a funções completamente distintas.

Alguns elementos das Forças Armadas que reagiram de forma cooperativa à decisão sobre o Colégio Militar perceberam que há aqui uma questão de legitimidade política que não pode ser questionadaÉ verdade que depois, com custos também importantes, a pirâmide etária está hoje seriamente invertida porque temos pessoas de mais idade e a reposição de elementos nas Forças Armadas não pode evidentemente fazer-se ao ritmo que se fazia nos anos 60 e nos anos 70.

Num mundo que é hipercomunicacional, haverá de reparar que se fala pouquíssimo das Forças Armadas. A questão não é se o facto é triste ou mau. É como é que a questão, a existir, é resolvida, qual é a posição das Forças Armadas e como é que reagem perante a adversidade. E eu posso falar tranquilamente do Colégio Militar.

O caso do Colégio Militar foi bem resolvido?

Acho que foi muito bem resolvido. Acho que o Colégio Militar percebeu que não havia qualquer hostilidade e que alguns elementos das Forças Armadas que reagiram de forma cooperativa perceberam que há aqui uma questão de legitimidade política que não pode ser questionada.

Mas sentiu que a tentaram questionar?

Não se esqueça de que eu estive a dirigir o regulador dos media [ERC] e depois disso pouca coisa me incomoda, acredite. A pressão mediática faz parte da vida e da sociedade contemporânea e de quem exerce funções públicas.

A verdade é que o Colégio Militar, e neste caso o Exército, mostraram como foram capazes de enfrentar a questão de regulamentos que, no meu entender, violavam regras básicas de não-discriminação. E não morreu ninguém, que eu saiba. O Colégio lá continua, celebra agora mais um aniversário, a docência continua, os jovens continuam a aprender.

A decisão política em relação aos Comandos foi muito clara. Enquanto fosse ministro da Defesa, não ia haver mais situações desta natureza nas gavetas, ou nos gabinetes, ou inquéritos que não eram concluídos ou sequer iniciadosNo verão passado, houve ainda o trágico acidente com o C-130.

São os factos mais trágicos que sou capaz de recordar do ano passado. A 11 de julho, um dia depois da nossa vitória no Europeu de Futebol. É uma tragédia tanto mais reforçada quanto ao mesmo tempo estamos a falar de um acidente que não acontecia na Força Aérea há mais de 15 anos. Isto é traumático: as circunstâncias do acidente, a envolvente do acidente. A Força Aérea foi capaz de enfrentar a questão e resolvê-la.

Pouco tempo depois, em setembro, tivemos os Comandos. E aí, a decisão política foi muito clara, claríssima. Enquanto fosse ministro da Defesa, não ia haver mais situações desta natureza nas gavetas, ou nos gabinetes, ou inquéritos que não eram concluídos ou sequer iniciados. E esse facto é doloroso porque quebra comportamentos que eram tidos como padrão. Evidentemente, depois extremaram-se as opiniões –  houve quem defendesse a extinção dos Comandos, quem considerasse um ataque soez da extrema-esquerda aos Comandos.

Não era aceitável que, mais uma vez, as coisas ficassem como tinham ficado no passado. Havia sempre um facto que justificava um silêncio ensurdecedor. Muitos confundiram isto com tibieza, com um ataque à exigência e à preparação das Forças Especiais. Uma estupidez crassaA questão sempre foi colocada por mim nos seguintes termos: nunca eu interferiria na administração da Justiça ou num qualquer processo de inquérito ou mesmo num inquérito disciplinar que fosse feito pelo Exército, mas tinha de ser feito. Não era aceitável que, mais uma vez, as coisas ficassem como tinham ficado no passado. Havia sempre um facto que justificava um silêncio ensurdecedor. Muitos confundiram isto com tibieza, com um ataque à exigência e à preparação das Forças Especiais. Uma estupidez crassa. Nunca percebi porque é que alguém tem de morrer ou, porque é que, morrendo alguém, não se deve perguntar em que circunstâncias morreu e em que é que isso torna mais forte ou mais fraca uma formação. Ninguém me convencerá do contrário.

Foram detetadas falhas, essas falhas estão quase corrigidas. Em todas as fases, foram sempre anunciadas medidas em que os prazos foram sempre cumpridos. O que for decidido, para mim nunca poderá estar mal. No que se refere à componente interna, mais uma vez o Exército passou por uma prova muito difícil, porque foi obrigado a enfrentar, pela primeira vez, uma questão muito pouco habitual. Acabou, não vai continuar a fingir-se que não aconteceu. Foram feitos os necessários processos e inquéritos. Foi tomada uma decisão inicial de sanção no processo disciplinar, neste momento dependente do recurso. Aquilo que define as regras gerais de orientação será concluído nos prazos e em abril os cursos serão reiniciados. É crucial porque demonstra que nenhuma instituição está ao abrigo de, no caso de as coisas correrem mal, não serem corrigidas e não obrigar a um repensar dos procedimentos quando for caso disso.

Houve uns tontos que disseram que devia demitir-me e que tinha a responsabilidade política pelo que tinha acontecido. Um disparate completoForam corrigidas ao ponto de podermos afirmar que uma situação destas não se repetirá?

Não. Não estamos a falar de deuses ou anjos. Estamos a falar de sociedades humanas. Aquilo que obriga à ação política do ministro ou do ministério é fazer tudo o que estiver ao seu alcance para evitar que situações destas se repitam. Se posso garantir? Não posso. Houve uns tontos que disseram que devia demitir-me e que tinha a responsabilidade política pelo que tinha acontecido. Um disparate completo. Devia demitir-me se, olhando ou tendo presentes estes factos, não tivesse feito nada. Queriam era ver-me daqui para fora o mais depressa possível.

Houve outros tontos que, quando lhes disse que deste tipo de circunstâncias pode resultar num Exército mais forte, disseram que não, que as Forças Armadas estavam radicalmente enfraquecidas. A minha opinião é que, hoje, o Exército pode olhar para trás e não tem nada que se envergonhar de todo o comportamento que adotou. E é um comportamento que o honra e o prepara evidentemente para circunstâncias adversas que possam ocorrer.

O que era para ser uma pasta tranquila acabou por, enfim, resultar numa agitação.

Na altura disseram-me que era uma pasta em que não acontecia nada. Eu já me perguntei várias vezes o que seria se acontecesse [risos]. Já pensei nisso várias vezes. Quem me dera que não tivessem acontecido alguns factos trágicos de que falámos. Olho para trás e acho que Portugal pode ficar orgulhoso das Forças Armadas que tem, o que não deve ser fácil. Não deve ser fácil uma instituição com tradições e hierarquias como as Forças Armadas ser obrigada a olhar para si mesma e a corrigir comportamentos.

Hoje, o Exército pode olhar para trás e não tem nada que se envergonhar de todo o comportamento que adotouNão gosto muito daquela separação que há entre a parte técnica e a parte operacional. Não pode haver democracia sem haver um Estado político. É crucial que recuperemos o fio condutor que mexe isto tudo. Não há democracia se não houver regras sistémicas de legitimidade. Não faltou quem achasse ‘para que é que precisamos de Forças Armadas? Não vamos ser invadidos por Espanha’. Há um elemento pedagógico e de cidadania que se quebrou quando se acabou o Serviço Militar Obrigatório.

Nos conteúdos dos programas de ensino, desapareceram as Forças Armadas. Ou seja, a pessoa chega à idade adulta sem ter tido um minuto em que lhe falassem sobre o que são as Forças Armadas e o que fazem. A culpa é de quem não percebeu que ninguém nasce ensinado e que, ou continuamos a achar que devemos existir como um Estado – e aí tem de se valorizar as Forças Armadas e o seu estatuto –, ou então mais vale dizer que já não somos um Estado e faz-se outra coisa. Questão diferente é discutir se se deve retomar o Serviço Militar Obrigatório.

Eu não sou capaz de dizer quando é que vamos deixar de ter risco de ataques terroristas – tenderia a dizer que é um fenómeno que vai fazer parte da condição das nossas sociedades por um tempo que não sou capaz de prever, mas que prevejo longoA Suécia fê-lo recentemente.

Sim, a Suécia e outros países. Portanto, há a verificação de duas coisas: em primeiro lugar, do ponto de vista profissional, uma menor atratividade da função militar, justamente pela inércia com que fomos deixando de valorizar a função das Forças Armadas.

Em segundo lugar, não lhe escondo que se fala muito mais de segurança e de defesa quando antes a segurança era puramente interna e defesa era para as Forças Armadas. Mas, depois dos atentados de Paris – e eu fui logo lá a seguir aos atentados - era impressionante ver nos Campos Elísios dezenas e dezenas de soldados armados até aos dentes. Era impressionante, por outro lado, verificar como para as pessoas, esse elemento era um elemento de tranquilização. Se forem a Bruxelas, ainda veem o mesmo clima. Um amigo meu, belga, disse-me: ‘Nunca mais vamos deixar de ter soldados nas ruas enquanto houver risco de ataques terroristas’. Eu não sou capaz de dizer quando é que vamos deixar de ter risco de ataques terroristas – tenderia a dizer que é um fenómeno que vai fazer parte da condição das nossas sociedades por um tempo que não sou capaz de prever, mas que prevejo longo.

De repente, percebemos que, de facto, estivemos a desinvestir totalmente. À primeira concretização de uma ameaça, nós estávamos nus. Era um sentimento estranho que porventura é comparável ao 11 de Setembro. Quando foi o 11 de Setembro, os Estados Unidos perceberam o que era sofrerem, no seu território, um ataque. E é um momento traumático que levou a reações também elas extremadas, que explicam Guantánamo, Abu Ghraib, e por aí em diante. Ou seja, uma sociedade mal preparada para enfrentar a ameaça, tem tendência a ser muito mais fácil enfrentar populismos, demagogia. E olho hoje para a minha triste Europa e não vejo sinais nada agradáveis.

Tem sido notícia, até muito recentemente, o facto de haver cada vez menos recrutas. Isto é preocupante? O Serviço Militar Obrigatório poderá ser repensado para colmatar estas falhas?

Acho que não devemos incorrer na tentação de uma solução como o Serviço Militar Obrigatório sem explorar devidamente as circunstâncias atuais e a forma de melhorar os mecanismos e a divulgação que temos para o recrutamento.

A própria condição daqueles que se apresentam não é satisfatória. Hoje tendemos a ver pior, e isto vem de um ‘cegueta’ a falar’, tendemos a ser mais fracos, a fazer menos exercício físico, a ter menos mobilidade, a ver pior por causa da nossa vida multiecrã, a ouvir pior. Isto implica depois dificuldades em desagregar, desses que assim se apresentam, daqueles que podem servir em condições as Forças Armadas.

Isto pode passar por soluções como, por exemplo, reservar uma decisão final sobre a possibilidade de essa pessoa poder ou não pertencer às Forças Armadas para o fim da formação. Porquê? Porque nessa altura, teoricamente, estará mais musculado, tem condições físicas mais adaptadas àquilo que é a exigência real das Forças Armadas.

Estivemos a desinvestir totalmente. À primeira concretização de uma ameaça, nós estávamos nusDepois, as Forças Armadas estão associadas hoje a uma condição exigente, à separação das famílias, etc. Depois, há a questão da modernização da forma de comunicar. Se continuamos a comunicar pela publicação de anúncios em jornais, não vamos ter muita sorte. Portanto, hoje é impensável deixarmos as Forças Armadas de fora de uma comunicação moderna. Não estou a falar de propaganda. As redes sociais têm de estar presentes. Somos obrigados a comunicar com as pessoas de uma forma que elas compreendam. A culpa nunca é do destinatário, nunca é do jovem que não compreende os valores. Se eu penso que vou lá com um anúncio de página inteira num jornal, estou muito enganado, porque eles nem sequer leem jornais. Leem no digital.

E não faria sentido, já que falou nessa desvalorização e falta de informação na parte escolar, uma maior articulação nesse sentido?

É uma excelente pergunta, mas felizmente é daquelas para mim fáceis. Tanto fazia, que faz. Não está a ser pensado, está a ser executado. E não tem mérito genético. É antes de mim que é preparado um referencial para a Paz, a Segurança e a Defesa. Que envolve o Instituto de Defesa Nacional na elaboração dos conteúdos e que envolve o Ministério da Educação. Isto significa que hoje temos conteúdos (o livro para o professor, para o estudante, etc.) que não integram o programa obrigatório, mas que integram um dos referenciais que representam conteúdos para as pessoas saberem do que é que estamos a falar. Quando eu cheguei, isso estava calmamente em Baião, mas e depois? No ano seguinte, não vai ser só Baião, vai ser todo o distrito do Porto, onde já uma grande maioria de municípios aderiu. Não é por uma questão de centralidade, é primeiro por uma questão de população. Depois é mais fácil generalizar. Distrito de Lisboa, distrito do Porto, e sempre em articulação direta [com o Ministério da Educação]. Viseu, em mais de 20 Câmaras, só uma é que não quis participar). Em breve chegará a Vila Real, Viana do Castelo, Aveiro, Algarve.

Segunda questão que estamos a trabalhar: Faz ou não sentido preparar conteúdos para crianças? Eu acho que faz. E não é para fazer propaganda militarizada. Acho que tudo depende da forma como se explica. Julgamos que as pessoas têm de perceber tudo.

É mais uma questão de dar-lhes conhecimento daquilo que existe e daquilo que elas podem seguir no futuro.

Exatamente. Ninguém me pode acusar de ser bélico. Eu, só em certas circunstâncias muito particulares, é que legitimo o uso da força. Os conteúdos podem ser feitos aqui, mas têm depois de ter um olhar da Educação. Não porque eu tenha receio de que saia daqui um produto meio maluco de guerrinhas e tal. Mas é importante.

Não podemos esperar que, só com Facebook ou Twitter, as pessoas percebam a função das Forças Armadas. Temos depois de ir a montante e explicar que se hoje estamos aqui, é provavelmente graças às Forças Armadas. Se temos democracia, é porque houve uma coisa há muitos anos a que se chamou o Movimento das Forças Armadas que, além de ter defeitos, teve a enorme virtude de nos permitir ter hoje uma democracia com todos os defeitos que ela tem, mas que eu não trocava por nada.

Olho hoje para a minha triste Europa e não vejo sinais nada agradáveisJá apresentou a António Costa a proposta da introdução dos contratos nas Forças Armadas até 18 anos?

Está a ser ultimado. E depois vai entrar no processo de arquivo.

Mas essa proposta foi bem acolhida pelo Governo?

Isso diz respeito à vida íntima do Governo. Depois se verá. Se entrar no processo legislativo, é porque não foi mal acolhido. Isto não significa uma medida desesperada para garantir a fixação de pessoas.

Hoje as Forças Armadas estão divididas em duas áreas fundamentais: o quadro permanente e o regime de voluntários e contratados. Por definição, não sendo do quadro permanente, é preciso uma temporalidade definida para a vinculação, que está mais ou menos consolidada em seis anos. Ora, quando a formação na Marinha demora um ano, um dos seis anos já foi. E é ao fim dos seis anos, em que o formando está no apogeu das suas capacidades, que vai à vida. Isto faz sentido? Acho que não. Ou seja, é possível hoje admitir que, em certas áreas ou mesmo em todas, se possa admitir um prolongamento.

Há pouco falávamos dos dossiers 'quentes' - por assim dizer -  que a tutela tem gerido. A corrupção nas messes surpreendeu-o? No âmbito da Operação Zeus, testemunhos houve que vieram dar conta de que este tipo de casos acontece há quarenta anos e que toda a gente sabe. Todos veem e todos calam, no fundo.

A corrupção ou a alegada corrupção, não é? Não é politicamente correto mas ainda ninguém foi condenado. Desde pequeno que ouço falar disso, das questões ligadas às traficâncias da manutenção militar e por aí adiante. O que é que eu registaria como mais importante? Duas coisas. Primeiro, que houve uma investigação que foi levada a cabo e que eu estava a par. Foi levada a cabo com total liberdade e com resultados – até ver – muito significativos, ou seja, pessoas constituídas arguidas, acusadas e detidas.

Segundo, a perceção de que esses comportamentos são totalmente inaceitáveis. Portanto, desapareceu aquela tolerância social de dizer que era inevitável que assim fosse. O que não quer dizer que não venha a acontecer de novo. Era o que faltava. Isto não é património das Forças Armadas. É algo que pode acontecer em qualquer área da vida pública ou da vida privada. Em terceiro lugar, que evidentemente o ministro da Defesa apoiará todas as ações que se destinem a reforçar mecanismos preventivos, de vigilância, que detetem o mais precocemente possível este tipo de comportamentos. 

Ao nível do combate a incêndios, já se consensualizou que as Forças Armadas terão um papel importante.

A Força Aérea vai voltar a ter um papel importante nesse domínio, não no sentido de decisões. A Força Aérea não vai transformar-se numa corporação de bombeiros nem vai reivindicar um espaço que é da Proteção Civil, mas do ponto de vista cooperacional é evidente que toda a gente hoje concorda – e é bom que assim seja – que a Força Aérea deve ter essa participação. Numa altura em que se fala de reequipamento, deve por isso ser normal que sempre que se venha a adquirir um meio que possa ser utilizado no combate a incêndios, esse tipo de adaptação faça parte do reequipamento. Isso acontece com os helicópteros ligeiros que vão agora – por processo de aquisição que se iniciou – chegar, e acontecerá também porventura se viermos a adquirir um novo avião de transporte médico que é algo que está a ser ponderado pelo Governo.

A Força Aérea não vai transformar-se numa corporação de bombeiros nem vai reivindicar um espaço que é da Proteção CivilNo que diz respeito à Marinha, também tem um papel mais ou menos visível neste domínio, mas também já foi destacado pelas piores razões num ano que foi muito mau no ponto de vista da incidência de fogos, além do Exército, que foi duramente testado no ano passado.

Agora acabaram as negociações e o planeamento para aquilo que eu espero que seja uma pequenina época de incêndios, o envolvente é muitíssimo superior ao de 2016. Já há elementos das Forças Armadas a ter uma formação com os bombeiros para poderem participar com mais eficiência nas operações de vigilância e de rescaldo com o devido equipamento e não em circunstâncias precárias como aconteceu no ano passado.

E em relação ao aeroporto complementar na Base Aérea do Montijo, em que ponto está a avaliação?

A Força Aérea tem a incumbência – por despacho meu – de até final de abril me dar conta da avaliação que faz do custo para manter a operação, que é posta em causa com a instalação do aeroporto complementar. Tem de se pensar numa solução alternativa, qual é o custo disso e em que termos é que esse custo tem de ser enfrentado. Esse é o estudo de que estamos à espera. Um estudo que eu quero e desejo ser o mais objetivo possível. 

*Pode ler a segunda parte desta entrevista aqui.

Campo obrigatório