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"Dou 'não satisfaz' ao ministro da Educação e ao Governo"

Os professores estiveram em greve ontem depois de várias reuniões com o ministro da Educação que terminaram sem qualquer consenso. Por essa razão, o entrevistado de hoje do Vozes ao Minuto é João Dias da Silva, secretário-geral da Federação Nacional da Educação.

"Dou 'não satisfaz' ao ministro da Educação e ao Governo"
Notícias ao Minuto

22/06/17 por Patrícia Martins Carvalho

País João Dias da Silva

A greve de ontem dos professores não teve o impacto esperado, uma vez que a imposição dos serviços mínimos obrigou a que os exames nacionais e as provas de aferição se realizassem. Esta foi a primeira vez que tal aconteceu e João Dias da Silva deixa claro que não concorda com a alteração legislativa que permite a aplicação de serviços mínimos.

Para o sindicalista é preciso investir nas escolas, um investimento que não é apenas financeiro. É preciso, sublinha, definir políticas de longo prazo, o que só é possível se houver um compromisso nacional que tem de ir além do que aquilo que é a sobrevivência de um governo.

E porque estamos em final de ano letivo, convidámos João Dias da Silva a dar notas a alguns atores importantes da área da Educação. E o resultado não foi positivo!

A greve de ontem contou com serviços mínimos e, por isso, a realização dos exames nacionais e das provas de aferição não foram afetadas. É algo que nunca tinha acontecido…

Foi a primeira vez porque houve uma alteração legislativa em 2014 sobre as condições para o estabelecimento de serviços mínimos que, até então, não estavam previstos na Educação.

O que lhe parece esta alteração legislativa?

Consideramos que é errada. Deveríamos ter a possibilidade de fazer a greve, verificar o impacto da mesma na realização dos exames e, os alunos que não os realizassem, poderiam fazê-lo depois com o Ministério da Educação a agendar uma nova data.

Assim não há a necessidade de novas datas…

Exatamente. Os serviços mínimos impõe que seja garantida a realização das provas de aferição e dos exames nacionais.

Como é que correu a reunião de ontem [terça-feira] com o ministro Tiago Brandão Rodrigues?

Finalmente nós reduzimos os nossos problemas a oito propostas de alteração a um texto que o Ministério da Educação (ME) tinha apresentado. Acolheram apenas uma, rejeitaram cinco e duas foram aceites apenas de forma parcial.

Que propostas foram essas?

A única que foi aceite foi a que dizia respeito à definição de um processo de audição sindical a propósito da revisão da portaria de rácios.

Não foi aceite a proposta relativa à participação da FNE na elaboração da circular que o ME prevê fazer este ano para clarificação da organização do ano letivo. O ME também não admitiu a possibilidade de recurso a uma nova vinculação extraordinária em 2019, também não assumiu o compromisso de que o descongelamento das carreiras ocorresse a partir de 1 de janeiro de 2018, também não aceitou que fosse integrado no texto a determinação de uma negociação para possibilitar o correto posicionamento posterior de todos os docentes com a consideração do tempo de serviço que tem estado congelado. E também não aceitou a proposta de abertura de um processo negocial a iniciar no prazo de 180 dias sobre o reconhecimento da especificidade do desgaste profissional docente com efeitos na possibilidade de saída voluntária de serviço.

Quais foram os argumentos do ministro?

O ministro tem dito que o ME não tinha condições porque da parte do Governo não houve as condições que lhe permitissem assumir compromissos desta natureza, especialmente a nível do Ministério das Finanças. A verdade é que o Ministério da Educação não teve condições para permitir respostas positivas.

O que deixa os professores descontentes…

Claro!

Como é o dia-a-dia de um professor?

É muito complexo. Muitos deles têm que fazer todos os dias 150 ou 200 quilómetros para cada lado para darem aulas, depois dão as suas aulas, têm reuniões, elaboram relatórios, respondem a questionários, preparam aulas, corrigem testes… As suas atividades ultrapassam largamente as 40 horas por semana.

A questão das horas semanais é também uma reivindicação vossa.

Sim, queremos limitar o tempo de trabalho do professor às 35 horas e não permitir que seja inesgotável. Realizar todas as tarefas que lhes são atribuídas sem limitação de tempo é inaceitável, como em qualquer profissão.

E as escolas? Estão adaptadas àquela que é a realidade da sociedade?

Há muitas insuficiências. Há escolas muito bem dotadas, mas há outras mal dotadas. Não há um equilíbrio naquilo que são as condições de trabalho das escolas. Infelizmente ainda temos escolas que estão insuficientemente dotadas em equipamento e com orçamentos ridículos que mal lhes dão para funcionar. Os diretores têm que andar a contar os tostões para ver se não têm que desligar a luz durante alguma parte do dia para fazer poupanças de energia.

Isto prejudica a aprendizagem e a preparação dos alunos? Claro. Tudo o que constrange e limita os meios disponibilizados aos alunos tem efeito sobre eles e sobre os seus resultados de aprendizagem. É preciso investir na escola para que todos os alunos tenham sucesso e para que não se deixe nenhum aluno para trás. Não podemos ter uma escola que desiste dos alunos. Não queremos uma escola de sucesso administrativo em que se passa mesmo sem se saber.

O número de alunos por turma é um fator prejudicial?

É um dos fatores. Há outros como o número de alunos por professor. Nós temos professores em determinadas disciplinas que têm 200 e 300 alunos. Como é que um professor pode garantir um acompanhamento adequado para cada um dos seus 300 alunos? É evidente que é muito difícil e esta é uma realidade que nós temos de eliminar.

É preciso fazer mudanças. Há receio por parte dos governantes?

Os governantes olham para o seu horizonte de sobrevivência política e sabem que têm à sua frente quatro anos. E querem que se possa medir, nesses quatro anos, os efeitos das decisões que tomam e, por isso, tomam as decisões que têm um impacto mais imediato.

E as decisões cujos impactos são medidos a médio/longo prazo?

Os ministros têm mais dificuldade em centrarem-se nesse tipo de decisões porque precisam de ter efeitos práticos e mais próximos das decisões que tomam. Esse é um aspeto que condiciona algumas decisões, não todas, mas algumas.

É preciso um compromisso nacional para garantir uma solução para este problema?

Sim, temos defendido que exista um compromisso nacional em determinadas matérias, porque entendemos que não é bom para a sociedade que uma família, ao colocar os filhos na escola ou jardim de infância sinta uma grande incógnita porque não sabe como vai ser o percurso escolar. Nós estamos sempre a mudar. Era importante que isto não continuasse desta forma e que pudéssemos ter políticas estruturantes duradouras que resultassem de um grande compromisso nacional. Temos exemplos de países onde as grandes mudanças curriculares têm ciclos que estão determinados – no Japão só se mudam os currículos de 10 em 10 anos.

E em Portugal?

Tudo é feito em cima do joelho, à ultima da hora sem se ter em linha de conta os impactos das decisões tomadas e infelizmente temos visto um ziguezague de políticas educativas que não podiam ter estado sujeitas a este ziguezague.

Como por exemplo?

Desde logo a organização curricular. Sabemos bem como ela tem mudado de governo para governo. E há ainda a questão da avaliação dos alunos. Temos vindo a assistir sistematicamente a mudanças nas regras da avaliação.

Houve alguma medida tomada por este ministro que o tenha desagrado de todo?

Não, não posso dizer que haja alguma medida relativamente à qual seja totalmente contra. Sou contra a inexistência de um conjunto de decisões que já deviam ter sido tomadas por este Governo relativamente a questões como a reposição da justiça entre os profissionais da Educação.

Está à frente da FNE há 13 anos. Houve algum ministro da Educação com o qual tivesse sido mais difícil negociar?

Todos os ministros têm dificuldades em negociar. O que é importante é que os ministros e os atores sociais apostem no diálogo. Podemos discordar muito, estar muito distantes mas se apostarmos no diálogo e na negociação somos sempre capazes de encontrar boas soluções.

Que nota dá às condições dos professores para exercer?

Não satisfaz.

E ao currículo escolar?

Não satisfaz

Ao comportamento dos alunos?

É muito difícil fazer uma generalização. Não quero fazer uma apreciação global porque seria injusto.

Ao ministro Tiago Brandão Rodrigues?

Não satisfaz.

Ao Governo?

Não satisfaz.

Ao Presidente da República?

Satisfaz.

Bom, parece que no próximo ano letivo haverá repetentes…

Têm que fazer provas de recuperação, devem estudar mais um pouco, fazer mais exercícios e, sobretudo, devem estar mais atentos à sua volta para poderem tomar boas decisões tomando em conta as necessidades concretas das outras pessoas.

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