"Temos assistido a uma benfiquização do Sporting"
Paulo Pereira Cristóvão, antigo vice-presidente do Sporting, é esta sexta-feira o entrevistado do Vozes ao Minuto. Um dos rostos que mais se tem oposto a Bruno de Carvalho não poupa nas críticas ao máximo dirigente leonino.
© Blas Manuel/Notícias ao Minuto
Desporto Pereira Cristóvão
Paulo Pereira Cristóvão, antigo vice-presidente do Sporting durante o mandato de Godinho Lopes, é uma das figuras da história recente do clube de Alvalade cuja personalidade mais continua a dividir opiniões. Visto por alguns como uma das poucas vozes públicas de oposição a Bruno de Carvalho, por outros como nome a eliminar dos livros de história do emblema verde e branco, o antigo polícia é esta sexta-feira o entrevistado do Vozes ao Minuto.
Com uma personalidade combativa e alvos bem concretos, durante a conversa desenvolvida com o Notícias ao Minuto, Paulo Pereira Cristóvão raramente mediu as palavras para as fazer brandas. Num tom impositivo, sem restrições de temas ou questões previamente acordadas, disponibilizou-se a falar de tudo. A entrevista foi agendada e reagendada, por necessidade de ambas as partes, e surge agora num momento de encruzilhada para o máximo dirigente leonino.
Com uma Assembleia-Geral agendada para o próximo sábado, dia 17, Bruno de Carvalho elevou a fasquia dos pontos a votação, três no seu total, para o grau da sua continuidade ou não em Alvalade. Este foi um dos temas centrais da conversa mantida com o ex-dirigente leonino. A política de comunicação do clube, o passado de Bruno de Carvalho, o futuro do Sporting ou a atuação do VAR foram outros dos tópicos desenvolvidos.
O resultado do diálogo mantido, e consequentemente da reprodução das respostas dadas, é, se o tivermos de descrever de forma rápida, duro. Por entre ataques a Bruno de Carvalho, Paulo Pereira Cristóvão não conseguiu, por vezes, manter o distanciamento necessário para não se desviar do tema sobre o qual era questionado.
Ainda assim, e tal como acordado entre entrevistado e entrevistador, o que se apresenta ao leitor é o resultado de uma longa conversa, de quase duas horas, onde tentámos que respondesse, de forma clara, aos temas que, consideramos, interessam ao Sporting e aos seus adeptos.
Durante a última semana assistimos a um ultimato de Bruno de Carvalho após uma Assembleia Geral do Sporting que não terminou da melhor maneira. Que comentário lhe merece este episódio?
Considero que o Sporting vive momentos absolutamente inusitados. Eu assisti à Assembleia e acompanhei o que foi sendo dito por aí. Entendo que isto é só o coroar de uma situação que já se vem desenrolando desde há uns anos a esta parte com Bruno de Carvalho. Relativamente ao presidente do Sporting, eu vinha até preparado para dizer umas quantas coisas... Vinha preparado para fazer não uma radiografia, mas uma ressonância magnética. Mas não seria simpática para ele. Seria bem reveladora do que representa aquela pessoa. Porém, ocorreu-me uma coisa durante este fim de semana. Todos temos as nossas epifanias, os nossos cliques. Mas houve algo este fim de semana que me fez inverter este rumo. Durante estes dias, assistimos a um episódio inusitado. Uma troca de argumentos entre Bruno de Carvalho e Pimpinha Jardim. Bruno de Carvalho dizia que tinha sido alvo de um ataque por parte dela. Eu depois vi que Pimpinha lhe tinha chamado ordinário. Não disse mentira nenhuma. É assim que ele se comporta muitas vezes. Vi o Bruno de Carvalho a associar o que tinha dito Pimpinha Jardim a algo que vinha da Segunda Circular... tentando indexar isto, de alguma forma, ao Benfica, passando por uma terceira correlação com um problema da sua vida pessoal que em breve se iria saber. Eu vi isto e fiquei um bocado alerta. A seguir vejo uma publicação dele com uma fotografia da filha cheia de champô e ele a dizer: "ninguém te vai afastar de mim", com letras garrafais. Vejo, minutos depois, no Correio da Manhã, uma notícia a dizer que a mãe lhe queria tirar a filha. Seja como for. Eu sou pai de uma menina de quatro anos, que é a luz da minha vida e o ar que respiro. Tenho mais filhos, mas um tipo ter uma filha depois dos 40 faz de qualquer um um banana. Portanto, são questões que me tocam profundamente.
Quando vejo aquele homem, vejo alguém que entendo que, neste momento, é alguém que está perturbado mentalmente, alguém que precisa de ajuda, de acompanhamento profissional. Por muito que o negue. Por muito que faça o papel de drama queen, aqueles posts sozinho na autoestrada... Por muito que quisesse fazer esta ressonância magnética, eu sou pai e fico num limbo emocional. Sem saber se Bruno de Carvalho está a ser o que está a ser em consequência de graves problemas na sua vida pessoal, ou esses problemas pessoais são consequência direta da vida que ele vive, e que é o Sporting.
O Bruno faz-me lembrar aquela velha história do filho que mata os pais e quando está a ser julgado pelo homicídio que cometeu pede clemência ao juiz dizendo que é órfão. Esta é a melhor analogia que posso fazer a Bruno de Carvalho. É aquele homem que incendeia a mata e depois diz ao juiz 'epá, veja lá que eu tenho as mãos queimadas'. Portanto, ele queima-se a ele próprio, faz de acusador e juiz de si próprio e de tudo e todos, mas eu acho que Bruno de Carvalho está perturbado. Gosto de uma boa querela retórica e não fujo a guerra nenhuma, mas estar a falar de alguém que não está psicologicamente bem, alguém que não está equilibrado na sua pessoa, estaria a cometer um crime de lesa honra de mim próprio.
No entanto, o que lhe pedia não era uma interpretação do seu estado pessoal ou emocional. Temos um lado profissional e outro pessoal. Concretamente, sobre a Assembleia Geral, que comentário lhe merece o que se passou? Tentativas de agressão, um presidente a abandonar a sala e, depois, uma espécie de ultimato aos sócios.
Um presidente não pode abandonar a sala! Já assisti a muitas assembleias, já vi agressões e por aí fora, mas jamais vi uma direção a abandonar uma reunião destas. O problema é que à volta dele, Bruno de Carvalho não tem ninguém com massa crítica que lhe diga que ele não pode fazer isto. Isto leva-nos a outro tema, que está relacionado com toda a gente que ele tem em seu torno. Esse é o problema. Ele cometeu um erro grande, que decorre da sua própria formação. É alguém que é muito mimado, que não aceita um não. Mas ele não pode transportar isso para o clube. Eu não vejo Bruno de Carvalho como um presidente. Vejo Florentino como presidente. Vejo Abramovich como presidente. O Bruno é um diretor-geral do Sporting. É um funcionário do Sporting. Vive do Sporting e não se pode comportar como dono do Sporting.
Não há perigo de Bruno de Carvalho se demitir. Não se pode demitir. A questão do 'se não tiver 75% neste ou noutro ponto, eu demito-me' ... é mentira
Mas o que leva ao abandono da AG é o facto de ter sido votado numas eleições, apresentar as mesmas propostas pelas quais foi eleito e não perceber porque estava a ser contestado. Sente que, de certa forma, ele tem um pouco de razão?
O tempo [de apresentação das propostas] é errado e não faz sentido. Mas eu percebo porque é que ele quer aprovar à pressa um regulamento disciplinar. Sabe porquê? Porque eu fui selvaticamente expulso do clube, por uns regulamentos que não existem. Se não existem, aplica-se a lei geral. Se se aplica a lei geral, ele tem 90 dias para encetar processo disciplinar. O processo prolongou-se cinco anos. Isto é do mais ilegal que pode haver. Na primeira ida ao tribunal isto cai tudo.
Bruno de Carvalho propôs uma segunda Assembleia-geral, mas com a fasquia muito alta (percentagem de votos). Acha que tem condições para continuar à frente do clube, mesmo que não tenha aprovação das propostas... mesmo que não seja votado por todos os sócios?
Vou dizer-lhe ao contrário. Não há perigo de Bruno de Carvalho se demitir. Não se pode demitir. A questão do 'se não tiver 75% neste ou noutro ponto, eu demito-me' ... é mentira. Bruno de Carvalho vai fazer o seguinte: o ponto 1 ou 2 não tem os 75%, vai fazer uma misancene, sai de cena, diz que se vai demitir. Vai desaparecer dois dias, para meditação numa qualquer montanha no Tibete, na Quinta da Conchas ou em Campolide. Vai sair de cena, deixar todos e tudo no éter. Vai voltar, passado esses dois dias, e dizer que na sequência de inúmeras pressões não podia deixar cair o poder na rua e o trabalho que foi feito ir pelo cano abaixo. Contra si próprio e a sua própria convicção, vai assumir o cargo e continuar a tomar conta dos destinos da nau sportinguista. Isto será assim porquê? Porque não tem emprego em mais lado nenhum. Antes do Sporting ele ganhava cerca de 5% do seu ordenado atual. Antes disto contava os tostões. Antes era presidente de uma fundação que foi criada por ele para o credibilizar. Desafiava aqueles senhores que têm empresas e que o apoiam a darem-lhe um emprego.
Os sportinguistas podem ficar perfeitamente descansados. Mesmo que falhe um ponto, dois ou três, vai haver sempre a tal vaga de fundo que fará com que volte,... mas contrariado. Vai voltar muito contrariado e empurrado por aquelas pessoas que não o deixam sair.
Mas acha que irá propor novas eleições? Acha que os sportinguistas vão perceber este abandono provisório e um regresso, a palavra dita por não dita?
Ele tira dois dias, dos seus 24 horas sobre 24 horas, e depois volta para dar uso ao seu poder. Ele sente necessidade de ser o centro das atenções. É manifesto, pelos tiques, pelas inflexões do queixo,... vai voltar numa grande conferência de imprensa, mas sendo 'empurrado'.
Mas os sócios vão compreender isto, este cenário que nos está a montar?
Há uns anos diria que não. Mas temos assistido a uma benfiquização do Sporting. Em algumas franjas sportinguistas vejo uma alienação do espírito crítico que reconhecia em tempos... até em pessoas que julgava inteligentes. Temos, neste momento, um grupo grande de pessoas que lhe devem favores e a quem Bruno de Carvalho deve favores. O André Geraldes gaba-se que lhe emprestava dinheiro. Agora é diretor do Sporting, apesar de ter vendido cartões do Barkclays no Vasco da Gama. A pessoa mais importante do Sporting quem é, o presidente? Falso. É um senhor que se chama Jorge Jesus. É o homem que mantém o emprego a toda esta gente. Se o Bruno de Carvalho tivesse lá o Vercauteren... onde estaria. Toda esta gente é mantida, não pela bola entrar na baliza, mas pela expetativa de a bola entrar. O Sousa Cintra foi um grande presidente, mas não ganhou nada. Mas mantinha-nos [sportinguistas] sempre na expetativa. O Jorge Jesus alimenta-nos a todos e mantém a expetativa de que o título vem. É ele que dá emprego a toda esta gente, ao Carlos Vieira, ao André Geraldes, a toda esta gente. Se o Jorge Jesus se vai embora e vem outro qualquer, caem todos como um baralho de cartas. Jesus sabe disso, e por isso se faz pagar mais caro que o campeão europeu, Zidane. É Jorge Jesus que dá emprego a esta gente toda.
Sente que toda esta instabilidade está a prejudicar a equipa e o objetivo da conquista do título?
Desde que Bruno de Carvalho se lembrou de fazer isto tivemos duas derrotas e uma vitória. Bem não faz...
Uma das derrotas é para a Taça e ainda há uma segunda mão...
Mas até aí não tínhamos perdido com o FC Porto em jogo nenhum.
Nas redes sociais o presidente do Sporting convocou várias pessoas para uma sessão de esclarecimento. Paulo Pereira Cristóvão foi um dos nomes que ficou de fora. Sente algum arrependimento?
Eu gostava de ir. Sabe porquê? Porque o Bruno foge de mim há muito tempo. Quando há um ano, no Dia dos Namorados, eu e o João Paiva dos Santos fomos a Alvalade para apresentar um pedido de auditoria, a última imagem que tenho de Bruno de Carvalho é ele escondido atrás de uns cortinados a ver-nos abandonar. Isto não é de um presidente sem medo. Um presidente sem medo falava connosco. Dizia: ‘os senhores não entram porque eu não gosto de vocês, por esta e por aquela razão’.
Por que razão acha que Bruno de Carvalho foge de si?
Porque é um cobarde. É um flop. Essa coisa do presidente sem medo é uma mentira. Ele não vai para a tribuna nos jogos fora. É um sítio difícil de se estar e nunca lá o vi em nenhum jogo. Não o vemos em reuniões da Liga. Uma coisa é estar no Facebook, escrever tudo, chamar tudo... coisa diferente é respirar o ar que estas pessoas estão a respirar ao nosso lado.
Bruno de Carvalho refere muitas vezes as pessoas atrás do teclado...
Ele é o principal visado pelas suas próprias palavras. Eu recordo que o Bruno de Carvalho, naquele interlúdio entre 2011 e 2013, tinha três ou quatro perfis falsos para difamar a direção por toda a Internet. O herói do teclado é o próprio Bruno de Carvalho. É alguém que não está bem.
Durante os últimos meses fez revelações importantes relativamente a algumas transferências do Sporting. Ficou satisfeito com os esclarecimentos do presidente do Sporting sobre o tema?
Neste momento já fui ouvido na investigação. Já fui notificado e estou sujeito ao segredo de justiça. Não o vou quebrar, nem em off nem em on. O que lá foi dito e tratado ficará no inquérito da Polícia Judiciária. O que posso dizer é que as explicações dadas por Bruno de Carvalho falaram por elas próprias. Quando ele começa por negar que determinado indivíduo tenha tido qualquer interferência em determinado negócio e no dia seguinte aparece uma procuração a esse indivíduo... É aí que ele comete o deslize de dizer que são passadas muitas procurações. É falso. São passadas muitas procurações, para diferentes mercados, para vender. Para comprar só se passa a um e foi àquele. Mas não posso entrar nessa matéria, estou ao abrigo do segredo de justiça.
As vezes que estive pessoalmente com ele, em encontros, debates,... disse-lhe olhos nos olhos: 'Você é um charlatão'. Mas disse-lhe olhos nos olhos
A sua relação com a direção do Sporting não é, como é público, a melhor. Porquê a crispação com Bruno de Carvalho? É algo pessoal ou institucional?
Em 2011, quando Bruno de Carvalho apareceu, tive o cuidado de ir saber quem era. Era um concorrente meu. Não fui violar segredos nenhuns. Quem é a pessoa, que empresas teve… Ele tinha uma coleção imensa de dívidas, de processos,... que culminou nesta coisa dos 600 mil euros do Fisco e da penhora da garagem. Na altura disse: 'este indivíduo não me parece muito credível, até para a própria banca'. Os presidentes, na altura, tinham de avalizar pessoalmente algumas decisões. No entanto, não era isso que o inibia a ele de prometer milhões para trás e para a frente. Era uma loucura.
As vezes que estive pessoalmente com ele, em encontros, debates,... disse-lhe olhos nos olhos: 'Você é um charlatão'. Mas disse-lhe olhos nos olhos. Ele baixava a cabeça e seguia em frente. Sei quem é Bruno de Carvalho, foram-me chegando coisas, de pessoas que o conhecem da sua juventude, e o que lhe posso dizer é que... é uma questão pessoal. Se há coisa que odeio são os falsos puritanos. Imagine que Bruno de Carvalho ganhava 500 ou 600 euros na fundação. Hoje ganha 10 mil. Isso, per si, não é pecado nenhum, atenção! Acho bem que as pessoas evoluam. O pecado é mentir às pessoas. Vai a uma Assembleia e diz: 'tenho uns americanos para investir 70 milhões de euros no Sporting'. O Godinho diz-lhe assim: 'amanhã, apareça no meu gabinete para discutirmos isso'. E nada. Dois dias antes de umas eleições, num debate na televisão, em 2013, disse: 'tenho, daqui a dois dias, pessoas para investirem 20 milhões'. Sabe o que disse na primeira reunião com a banca? 'Então os 20 milhões? - Não tenho. Você mentiu? - Menti'. Como quer que eu atribua credibilidade a este homem? É um mentiroso patológico, mas fá-lo com um ar sereno. Este tipo de gente eu não gosto. São os falsos puritanos. Um tipo que é malandro por ser malandro, já sabemos que é malandro.
Mas tudo o que narra é o quê? Uma espécie de oposição/perseguição pessoal? Vou relembrar alguns dos 'títulos' que já atribuiu a Bruno de Carvalho: Azevedo de Carvalho, hipócrita, mentiroso, Erdogan da Quinta das Conchas....
E é. Quer armar-se em Erdogan, mas é muito pequenino. O outro é presidente da Turquia. Bruno de Carvalho, segundo o próprio, não manda sequer na casa dele. É óbvio que muita gente vai nisto, mas também há muita gente que gosta de novelas mexicanas. Quem percebe um bocadinho de psicologia percebe que tudo em Bruno de Carvalho é ensaiado. A postura, os gestos, ... só há uma coisa que nunca consegue ensaiar, o falar com uma pessoa a olhar olhos nos olhos. Alguém que está a falar consigo e a olhar para o lado está a fabulizar. Ele ensaia tudo. Nada é espontâneo. Mas eu compreendo. É alguém que precisa do Sporting para viver e encontrou um nicho.
Mas tudo o que está a dizer é sobre o lado pessoal e personalidade de Bruno de Carvalho. Mas Paulo Pereira Cristóvão é alguma espécie de oposição a Bruno de Carvalho?
Não sou. Não quero concorrer a coisa nenhuma no Sporting.
Então qual é a sua preocupação, uma vez que não pretende concorrer a nada?
Isto vem de trás, temos de ver de onde isto vem. Tudo isto começa em 2011. A partir daí desenvolve-se uma série de ações e uma série de perseguições a pessoas que acho que já não são compagináveis no século XXI, com as quais não posso compactuar com o meu silêncio. Tudo o que posso fazer para denunciar este senhor, eu faço. Nem tudo o que sei do Bruno de Carvalho eu transmito. Porquê? Porque não posso provar e não tenho meios diretos ou indiretos para o provar, e guardo para mim.
E o Nuno Saraiva, por exemplo, que também é alvo dos seus 'ataques'...
É uma personagem interessante e explico porquê. Primeiro, gostava de saber desde quando é sócio do Sporting. A informação que tenho sobre Saraiva era que era jornalista, benfiquista da margem sul, com uma família doente pelo Benfica. Parece-me que o Nuno Saraiva é um sportinguista do novo milénio, porque a sua juventude era vermelha. Não tem mal. É um sinal de evolução. Sei que Nuno Saraiva ainda não respondeu a um repto público que lhe fiz. Quando estava para ser despedido do Diário de Notícias mandou mensagens para o atual diretor de comunicação do Benfica a pedir emprego... E Luís Bernardo indicou-o ao Bruno de Carvalho. 'Tem aqui um tipo bom para fazer este trabalho'. Nuno Saraiva vai para o Sporting. Quando é que se começa a pôr em causa a verticalidade dele? Quando passado cinco dias de conhecer Bruno de Carvalho - não estamos a falar de uma longa amizade - veem-se juras de amor, um seguidismo do Messias... Não, não! Bruno de Carvalho salvou-lhe a vida, deu-lhe emprego quando ia ser despedido. Como o Bruno deu a tantos à volta dele. Despediu muitos mas meteu lá tantos mais. Quando passados cinco dias vê um tipo que se atira para o chão por si, isto diz um bocadinho sobre essa pessoa. Por isso eu lhe chamo 'o pequeno funcionário Saraiva'. É porque ele é mentalmente pequenino. É o típico pequeno funcionário. Anda ali, 'sim, chefe, sim, chefe'. Mas fica mal, porque pessoas com um QI acima de 60 olham para aquilo e dizem que parece mal. Aquela fidelidade canina ao chefe não é própria de um diretor de comunicação.
Se formos ver, temos dois tipos, um que nos custa 200 mil euros por ano, e o Saraiva que ganha mais do que ganhava… e passam o dia no Facebook
Mas, concretamente, que avaliação faz da comunicação do Sporting?
É miserável. Se formos ver, temos dois tipos, um que nos custa 200 mil euros por ano, e o Saraiva que ganha mais do que ganhava… e passam o dia no Facebook. Estes tipos, os dois, custam aos sportinguistas 300 mil euros/ano. Damos este dinheiro a um diretor-geral e um diretor de comunicação que passam a vida a passar a mão um no pelo do outro. Um é pago para passar a mão no pelo do Erdogan. O outro para fazer desabafos que vão desde o VAR, ao Benfica, ao FC Porto, à filha na casa de banho ... Ao processo de divórcio. Isto é surreal. Que posso dizer sobre a comunicação do Sporting?
A culpa, no fundo, é dos jornalistas, que dão eco a isto. Estamos a falar de duas pessoas viciadas nisto. Deviam era trabalhar... isso é que dava jeito.
Chegou a apresentar um pedido de suspensão de Bruno de Carvalho...
É falso. É mais uma mentira de Bruno de Carvalho. Não pedimos nenhum pedido de suspensão. O que fizemos foi levar ao conhecimento do presidente do Conselho Fiscal vários factos. Factos estes que se consubstanciam em dois processos-crime que decorrem contra Bruno de Carvalho. Um por difamação e injúrias, outro por ameaças, violação de correio eletrónico e difamação qualificada. Levámos esses factos ao conhecimento do Sporting. São processos-crime que estão a correr...
Acha que o Conselho Fiscal e Disciplinar não tinha conhecimento destes factos?
Se calhar até tinha, mas não daquela forma. A partir daquele momento já não podiam dizer que não tinham conhecimento. Todos estes atos foram praticados por Bruno de Carvalho contra sócios durante o exercício do seu mandato presidente. Sabe o que se fez? Nada. É o crime de negação de justiça. É o mesmo que ser roubado, ir à PSP apresentar queixa e dizerem-lhe que não a querem aceitar. Basicamente é isto. Não pedimos a suspensão, o que dissemos foi que estavam processos a decorrer.
E qual é a sua relação com Paiva dos Santos?
É um grande amigo, um grande sportinguista e alguém que está com um processo disciplinar com base numa mentira. O Bruno de Carvalho espalhou o boato de que Madeira Rodrigues e Paiva dos Santos queriam uma auditoria, que difamaram o clube, mas que depois já não a queriam. É falso. Quer num caso, quer noutro, e tenho conhecimento próximo, o que se propôs foi pagar uma auditoria, escolhendo uma das cinco grandes auditoras e escolhendo a matéria. O que é que o Sporting responde? Vai respondendo uma série de coisas até à pessoa desistir. Primeiro: 'a matéria quem escolhe somos nós'. Hoje é público onde se queria ir. Foi negado. Depois disseram que também tinham de pagar aos funcionários do Sporting. Ao que Paiva dos Santos questiona se eles já não estariam a trabalhar ao serviço do Sporting. Paiva dos Santos respondeu que não pagaria a pessoas que não controlava o trabalho delas, e, pior, não pagaria a pessoas que já são pagas pelo Sporting. Com base nisto, Paiva dos Santos desistiu da auditoria.
Sabe quem pagou o jogo de homenagem a Iordanov? Foi Paiva dos Santos. Sabe quem pagou o futsal do Sporting durante vários anos? Paiva dos Santos. Relativamente ao João: é um grande amigo, como se fosse meu irmão, é um sportinguista como Bruno de Carvalho nunca vai ser, já deu muito ao clube e o que lhe estão a fazer é absolutamente reles. Quer a ele quer a Madeira Rodrigues.
Outro dos episódios que o fez contestar a direção do Sporting foi o reatar das relações com o FC Porto... Como tem visto a relação com os rivais?
Vou contar-lhe um 'segredo'. A primeira vez que fomos ao Dragão, chegámos lá - tínhamos 32 pontos de atraso, fomos só cumprir calendário - e fomos recebidos pela direção do FC Porto, como se faz antes dos jogos. Quando vamos para a bancada ver o jogo, o Godinho Lopes diz: 'você é um antissocial dos diabos'. Eu perguntei-lhe porquê. Ele respondeu-me que estava toda a gente a falar e eu estava calado. Eu disse-lhe: 'não há nada que eu possa fazer ou dizer que impressione esta gente. Eles levam-nos 30 anos de avanço. A única coisa que podemos fazer para os impressionar é estar calados e ouvir. Assim ficam na dúvida sobre o que estamos a pensar'. Acho que isto diz tudo. Levam 30 anos de avanço e Bruno de Carvalho ao pé do Pinto da Costa é um passarinho.
Reatar de relações através de funcionários? Friso! Funcionários
Mas faz sentido uma espécie de aliança com o FC Porto?
Eu acho que não. Veja o que a história nos demonstra. Os últimos dois títulos do Sporting foram ganhos em clima de guerra contra o mundo. Contra todos. Fizemos luto, até no Irão falaram disso. Quando nos encostamos a alguém, somos um pivot, no qual um dos outros se ancora para atacar o outro. Eu sou contra qualquer tipo de relação estratégica com um rival. Mas digo-lhe mais. Reatar de relações através de funcionários? Friso! Funcionários. Dois diretores de comunicação, que são funcionários de um clube, encontram-se num hotel e combinam um reatar de relações? São dois funcionariozecos do clube que representam as partes num reatar de relações, não são os 'donos'. Parece que têm vergonha de estar ali e apertar a mão à frente das pessoas. Está tudo errado nesta relação. No fim, quem perde é o Sporting.
José Maria Ricciardi chegou a falar numa tríade Godinho Lopes - Madeira Rodrigues - Pereira Cristóvão. A verdade é que estes nomes têm sido 'perseguidos'. Acha que houve uma espécie de purga no Sporting relativamente ao seu passado?
Eu sei o que Bruno de Carvalho está a tentar fazer. Mas também sei o que a história faz a este tipo de indivíduos. Este tipo de gente acaba sempre mal. Chame-se a lei do retorno. Eu acredito muito nisso. E tenho tido vários exemplos disso. Chame-se o que se quiser. A vida encarrega-se de dar conta deste tipo de coisas. Acredito que Bruno de Carvalho, com este tipo de comportamento, esta tentativa de eternização, vai acabar mal. Como? Não sei como vai ser, espero que o Ministério Público faça o seu trabalho de forma profícua e competente - caso da expulsão de sócio.
Com o que se gastou no futebol este ano, o Sporting tem obrigação de ser campeão e chegar à final da Liga Europa
Como tem visto a atuação de Jorge Jesus e que avaliação global faz do mandato de Bruno de Carvalho?
O Sporting, neste momento, anda a comprar modalidades. Todas as semanas compramos uma modalidade. Isto é como ir ao pronto-a-vestir. O que Bruno de Carvalho anda a fazer eu já o vi muitas vezes na história. Você vai a um sítio, compra o que já está feito, espeta-lhe com o símbolo do Sporting, os tipos vão jogar uma Taça Europeia e depois diz-se que somos campeões europeus quando eles vencem. Falta a sustentação dentro do clube. Os sportinguistas veem estes títulos e nem sabem que tinham a modalidade. Isto só serve para Bruno de Carvalho fazer uma publicação no Facebook. O que se anda a fazer neste momento é gastar muito dinheiro. Ganhar no futsal? O Sporting sempre ganhou e com orçamentos que eram 30% do que são agora.
Quanto a Jesus, como se sabe, pede, pede, pede. Com o que se gastou no futebol este ano, o Sporting tem obrigação de ser campeão e chegar à final da Liga Europa. Com metade deste dinheiro chegámos à meia-final de uma Liga Europa, a eliminar um Manchester City com orçamento de 350 milhões. Tínhamos um orçamento de 42. Perdemos com o Bilbao, mas chegámos à meia-final de uma Liga Europa. O Sporting tem plantel para ir pelo menos à final da Liga Europa e ser campeão. Porém, o que eu vejo é o Sporting em terceiro lugar, o Benfica a subir e o FC Porto a manter-se na frente. Sérgio Conceição é um treinador fantástico. Foi buscar excluídos e fez uma equipa de renegados. Ao Sporting falta o Bas Dost e fica toda a gente a tremer. Globalmente, penso que temos tudo para ganhar. Temos de ganhar. O investimento assim o dita.
Se não for campeão Jesus tem de sair?
Não sai. Se Jorge Jesus sair sai tudo o resto.
Para finalizar o tema. O Sporting é, neste momento, um clube mais estabilizado quer em termos financeiros quer competitivos. Em termos de comunicação faz sentido manter este clima de guerrilha com os rivais?
O Sporting não é um clube estabilizado porque tem um presidente que faz depender do seu estado espírito matinal o dia que o Sporting vai ter. Isto não é ser profissional. Se Bruno de Carvalho acorda mal-disposto, porque um processo não lhe corre bem ou viu alguém a dizer mal dele no Facebook, aquele dia do Sporting já vai ser um dia sem estabilidade. Por muito que nos queiram vender as coisas ao contrário. O Sporting não está estabilizado. E financeiramente não sei se estamos assim tão estabilizados. Temos as VMOC’s, andamos a adiantar dinheiro da televisão - segundo parece já vamos três anos à frente. Empurrar com a barriga para a frente não faz milagres. Bruno de Carvalho pegou numa reestruturação que já estava acordada com Godinho Lopes, não inventou nada. Temos de ser sérios. Ele que não reestruturou uma dívida pessoal à Optimus vai reestruturar uma dívida do Sporting à banca?
A verdade é que foi Bruno de Carvalho que fechou o acordo...
O negócio já estava praticamente feito com base em alguns pressupostos. Eu conheço alguns contornos desse dossier. Quando houve a primeira reunião para fechar o acordo, perguntaram a Bruno de Carvalho onde estavam os 20 milhões de euros que tinha prometido. Ele disse que não os tinha e a banca disse-lhe que, dessa forma, a sua assinatura não valia nada. O Bruno de Carvalho fez depois uma espécie de ultimato, dizendo que se não lhe abrissem as contas faria uma conferência de imprensa onde diria que os bancos queriam ficar com o Sporting. A banca deu-lhe uma oportunidade e uma trela muito curtinha. Meteram lá algumas pessoas, o Guilherme Oliveira, o Carlos Vieira, outras pessoas... para controlar.
Mas o Sporting ainda é refém da banca?
Quando vejo o José Maria Ricciardi a dizer que o Bruno é importante... O Bruno foi a melhor coisa que podia ter acontecido à banca. Faz tudo o que lhe mandam fazer. É um bocadinho hipócrita. Preocupa-se com os fundos, mas depois não quer saber dos Álvaros Sobrinho. O Mosquito já não lhe causa preocupação nenhuma. Os russos que ele tinha, que depois foram dois presos, já não lhe causam preocupação. Desde que o ordenado dele lhe caia na conta todos os meses, que o carro tenha gasolina, que a família ande de BMW sére 7... Ele teve de fazer algumas cedências, tinha de as fazer, para se manter no seu local de trabalho.
Por falar em fundos. O que achou da gestão do dossier Doyen?
Se era para construir um pavilhão assim já se teria construído há muito tempo. Outra coisa é fazê-lo com dinheiro do clube.
A dado momento houve alguém que lhe disse que gostava que Bruno de Carvalho fosse só presidente do clube. Que deixasse a SAD
Mas reconhece que era uma obra importante e que vai ficar indissociavelmente ligada a Bruno de Carvalho? Muitas direções passaram antes e não o conseguiram...
Mas quem arranjou o terreno fui eu e o Godinho Lopes. Vou dar-lhe um exemplo sobre como Bruno de Carvalho pensa nestas coisas. Ele diz que o Sporting no ano em que entrou ficou no sétimo lugar a culpa era de Godinho Lopes. Mas ele ainda teve várias jornadas para inverter os resultados. Nesse mesmo ano somos campeões de futsal. Nesse ano andou aos pulinhos a dizer que era campeão de futsal. Mas ele entrou no mesmo dia para o futebol e para o futsal. Então em que ficamos? O que importa é quem inaugura com a chave ou quem fez o trabalho anterior? Não pode é ir variando estas posições conforme o vento sopra. O sétimo lugar foi culpa de Godinho. O título de futsal foi dele. Ambas as coisas são dele porque é ele que lá está.
Quando chegámos ao Sporting também herdámos coisas de outros. Eu gostava que o Bruno de Carvalho um dia se pronunciasse sobre uma revelação que vou fazer. A dado momento houve alguém que lhe disse que gostava que Bruno de Carvalho fosse só presidente do clube. Que deixasse a SAD. Que cortasse umas fitas, fosse a umas Casas do Sporting. Era presidente do clube. E ele fez uma contra-proposta. Eu gostava que ele se pronunciasse sobre isto. Que dissesse se isto foi verdade e qual foi a contra-proposta.
Quem fez essa proposta?
Foi alguém com poder para isso. Tinha de ser.
E qual era o sentido dessa medida?
Que ele não mexesse na parte mais importante que é a parte do futebol profissional. Bruno de Carvalho é o presidente mais não-campeão dos últimos 30 anos. Bruno de Carvalho está há cinco anos e não ganhou um título.
O Sporting será sempre o que os sportinguistas quiserem. Para o bem e para o mal
Então como é que os sportinguistas o elegem com uma margem tão expressiva? É culpa da falta de oposição?
Ele teve 60%-40% na primeira eleição, com José Couceiro. Nesta teve mais. Mas o facto de ser minoria não retira razão a quem não pensa como a maioria. A psicologia de massas está muito bem explicada. Costumo dizer que a culpa deste tipo de pessoas emergirem não é delas mesmas. Eles fazem o que a natureza lhes manda fazer. É a inércia da maioria que os alimenta e os deixa permanecer nos sítios onde estão.
Mas foram umas das eleições mais concorridas de sempre...
Com as devidas ressalvas, atenção não estou a dizer que Bruno de Carvalho é Hitler, mas Hitler foi eleito. Pessoas que têm um pulso ou tendência maior para domínio sobre as massas, não só com manipulação, mas também com repressão, por norma, são eleitos. Mas a culpa foi de quem os antecedeu, que fez com que as pessoas tivessem ficado num estado de desespero. O Trump não foi eleito? O Trump é uma trampa de presidente. Depois de um Obama, ver isto até dá vontade de pôr os dedos à boca. Mas o Trump é eleito... Com Bruno de Carvalho passou-se o mesmo. Estava no local e momento certos e houve alguém com responsabilidades no Sporting, desde há muitos anos, que disse 'vamos lá dar uma oportunidade ao tipo, se não não se cala'.
Quem tomou essa decisão?
Essa pessoa confidenciou-me isso e eu prefiro que o que me foi confidenciado fique comigo. Houve alguém que lhe quis dar uma oportunidade. O que prometeu em campanha era tudo mentira. Bruno de Carvalho não tinha investidores nenhuns. As pessoas quando falam em Godinho Lopes, em Soares Franco, por aí, parece que estas pessoas tomaram o poder à força. Isto não é real. Foram sempre eleitos por estes mesmos que hoje os criticam de todas a forma. Nenhum deles tomou o poder à força. Foram eleitos. O Sporting será sempre o que os sportinguistas quiserem. Para o bem e para o mal.
Pegando nas suas palavras. Disse que a ascensão de Bruno se deve em muito ao passado que o antecede. Fez parte da direção de Godinho Lopes. Que balanço faz da direção de Godinho Lopes?
Houve um erro muito grande que eu disse logo ao Godinho no início. O Bruno é a prova viva disso com o que já disse sobre Jorge Jesus. Num clube com a dimensão do Sporting só uma coisa conta. Bola na baliza, bola fora da baliza. Se a bola entrar na baliza até o símbolo pode mudar, pode pôr-se lá uma águia e a malta bate palmas. Se a bola não entrar pode estar a fazer a mais brilhante das gestões, com o passivo perto do zero, e toda a gente se está a borrifar. No futebol tudo se resume a isto. O Godinho, na altura, não tomou isto como certo. O Bruno, esperto, apostou em bons treinadores. Foi buscar um Jardim, um Marco Silva... O Jesus não veio para o Sporting em 2012 por um triz. O Godinho ia buscá-lo a meio da época.
O que falhou?
Faltou acordo com a banca para se pagar a indemnização que se tinha de pagar ao Benfica. Se isto acontecesse, se calhar hoje estávamos a falar de uma história bem diferente. A banca não se quis atravessar porque era patrocinador dos dois. Estar a tirar a força um treinador de um lado para o pôr no outro.... eu compreendo a decisão da banca.
Mas compreende o sentimento dos Sportinguistas para com Godinho Lopes?
Não falo com ele desde 2012, não mantemos relação. Mas posso-lhe dizer uma coisa: quando nós chegamos ao Sporting os jogadores estavam a poucos dias de fazer os 60 dias sem receber e iam meter rescisão por justa causa e não teríamos ninguém para levar a Guimarães. À minha frente, o Engenheiro Godinho Lopes avalizou mais de três milhões de euros dele para pagamento de salários. Se não não teríamos ninguém para levar a Guimarães. Ainda hoje lhe devem dinheiro e não lhe querem pagar. Isto é de um homem que é incompetente, é parvo? Isto é de um grande sportinguista, um homem que queria bem ao clube. Se nem sempre agiu bem? Com certeza. Querem ver que Bruno de Carvalho agiu sempre bem? Se calhar Godinho Lopes foi gentleman demasiadas vezes. Se calhar foi demasiado brando num debate com Bruno de Carvalho. Eu costumo dizer que foi Godinho Lopes que fez nascer Bruno de Carvalho. Deu-lhe uma importância que Bruno de Carvalho não tinha. Godinho Lopes tinha toda a matéria para acabar com Bruno de Carvalho naquele dia. Não o fez porquê? Porque foi cavalheiro. Se calhar no futebol os cavalheiros não vão muito longe.
Isto explica o sentimento que os sportinguistas têm em relação a Godinho?
Foi incompetente? Podem dizer tudo, mas não podem dizer que roubou o Sporting ou que se aproveitou dos meios do Sporting.
A verdade é que quando abandona o clube havia dificuldades até para pagar as contas da água, os salários estavam em risco...
Não sei se isso é verdade, mas sei como estava quando ele lá chegou.
Mas foi um mandato que acabou por ficar esvaziado, o de Godinho Lopes...
Este tipo de demonização de quem nos antecede foi uma coisa que o Godinho não quis fazer. O Godinho tinha uma máxima que respeito: 'Não me elegeram para vir dizer mal dos que me antecederam, elegeram-me para vir resolver problemas'. Encontrámos muita coisa que as pessoas não fazem ideia. Compreendo que a estas pessoas, agora, lhes interesse a demonização dos antecessores. Mas isto é a vida deles. O Sporting, para eles, é um upgrade. Não admito que Brunos, Saraivas, Vieiras, Caeiros, Guilhermes, que digam que estão a servir o Sporting. Estão todos por interesse no Sporting. Todos a ganhar bem mais do que ganhavam antes. Todos ganharam importância desde a sua vinda para o Sporting. Estão a servir-se do Sporting para melhorar a sua vida.
Foi vice-presidente. Que legado pensa ter deixado no Sporting?
Quando cheguei ao Sporting tinha um orçamento de 5,5 milhões de euros. Mas tinha zero euros na conta. A trabalhar com dinheiro na conta somos todos grandes gestores. Então e como pagamos as manutenções, a frota, o ar condicionado? O meu diretor-geral respondeu-me: 'Vai-se vendo'.
Aceitou ser vice-presidente nestas condições?
Só soube isto depois. Teve de se improvisar. Pintou-se o estádio todo de verde. Não tínhamos dinheiro para nada então pusemos os sócios a pintar bancadas. Fomos buscar pessoas ao fundo de desemprego. Fazíamos aqueles 'jogos' dando prazos e oferecendo bilhetes.
Faltou o fosso...
O caso do fosso é curioso. A Martifer foi lá e fez um orçamento, não para os topos, que estão cheios de serviços. O orçamento rondava 1 milhão de euros. Então fizemos uma pré-inscrição para os lugares que iriam ser criados nesse espaço. Fizemos isto para tomar a temperatura aos adeptos. Íamos ganhar dois mil lugares, mas inscreveram-se 38 pessoas. Desistimos da ideia.
Outra das questões que foi levantada estava relacionada com as imagens no interior do túnel de acesso ao relvado. O que aconteceu neste caso?
Comparado com aquilo que são os posts de Bruno de Carvalho... Aquilo era um campo de flores como depois acabámos por fazer. Aquelas imagens foram postas por pessoas do público. Depois vieram dizer-nos que continham imagens nazis. As imagens eram claques a dizer "Bem-vindos a Alvalade. Esta é a nossa casa". Isto dito com ironia. Os tipos da UEFA impuseram que mudássemos aquilo. Eu respondi que iríamos fazer um campo de girassóis e durante um fim de semana mudámos as imagens todas. Ficou um campo de flores e no sistema de som metemos umas cascatas de água e passarinhos a chilrear.
Caso Cardinal? A única pessoa que naquele processo disse que foi à Madeira, de boné, para não o verem, que queimou a roupa,... foi testemunha
Outro dos casos que mais ruído gerou em seu torno foi o caso de Cardinal, de um alegado suborno a um árbitro. Quando foi conhecido o caso pediu imediatamente um pedido de suspensão de funções...
Não foi logo. Decidi que tinha de acabar o que tinha começado. Isto foi em abril e eu saí em junho.
Isso foi um assumir de culpas logo aí?
Não. Assumo o meu erro e o que fiz. Um ex-funcionário meu, que trabalhava para o Sporting, na monitorização e acompanhamento dos ativos, fez esta coisa. Quando soube que ele tinha feito o que fez, calei-me. Foi um erro.
Mas esse seu funcionário tinha instruções para fazer o que fez?
Não. Quis fazer um agrado ao Sporting e ao patrão. Posso dizer uma coisa. Fui condenado por tentativa de difamação, não por tentativa de corrupção. Eu fui condenado por ter sido o mandante da ida dele à Madeira para difamar o árbitro. Não houve tentativa de corrupção. Hoje, olhando para trás, com todo o enquadramento apresentado pelo Ministério Público ao Tribunal, se eu fosse juiz, se calhar, também me tinha condenado a mim. A única pessoa que naquele processo disse que foi à Madeira, de boné, para não o verem, que queimou a roupa,... foi testemunha. Ele confessou um crime e saiu de lá como testemunha.
Mas isso terá sido porque a Justiça considerou que ele estaria a mando de alguém...
Está bem. Mas se eu mandar alguém matar outra pessoa serão os dois arguidos. Não concordo com a sentença, é injusta, mas eu compreendo, friamente, olhando para trás, a decisão do tribunal. Compreendo que existe um racional que os levou àquela decisão. Podemos não concordar com as coisas mas entendê-las. Tenho de viver com isso. Fui eu que denunciou o caso à PJ. Acha que isto faz sentido? Quando denuncio digo que nos chegou esta informação e peço para investigar. Se o arrependimento matasse...
Outra das polémicas em que esteve envolvido esteve relacionado com a contratação de serviços para seguir jogadores...
Foi feito um grande festim relativamente ao tema e o tribunal entendeu que era uma coisa perfeitamente lícita. Fui absolvido desse caso como de tantos outros... Todos os clubes o fazem. Desde o Manchester United ao Real Madrid. Qual é o problema de saber se um jogador às 23h00 da noite está a dormir. Qual o problema de saber se ele está numa discoteca às 3h00 da manhã? Tem de se saber. Custou 20 ou 30 milhões de euros. Claro que tem de se saber. E tem de se levar o jogador para casa. Para defesa da reputação do jogador, da sua integridade, da reputação do clube e do investimento feito. Toda a gente faz isto. O Benfica tem uns aparelhos em que sabe as horas a que os jogadores dormem. Só tínhamos gente colocada em Lisboa e nos sítios de divertimento da moda para saber se lá apareciam jogadores fora de horas normais. Houve situações que se resolveram.
Este acompanhamento ao jogador de futebol faz sentido?
Faz um investimento num jogador jovem, gasta 20 ou 30 milhões e depois deixa-o perdido? Hoje toda a gente faz controle e monitorização de ativos. Mas, em tribunal, fomos absolvidos completamente de todas as acusações.
Apresentou a sua primeira candidatura em 2009. Hoje está destituído de sócio. Sente pena pela forma como foi tratado pelo clube e tudo o que aconteceu depois?
Quando me candidatei, fi-lo quando ninguém o queria fazer. Um bocadinho à semelhança do que se passou com Madeira Rodrigues. Sabia que ia perder, que ia perder por muito, mas quis fazer uma declaração de sportinguismo. Sou sportinguista desde 1973, sócio desde os quatro anos e quis fazer uma afirmação. Sou contra o unanimismo. Fizemos uma coisa correta, com cabeça tronco e membros. Não me arrependo. Fiz aquilo que o meu coração na altura me pediu e aquilo que o meu amor ao Sporting me impeliu a fazer...
Perdeu para José Eduardo Bettencourt. Que avaliação faz desse mandato, sendo que depois acaba por ser vice-presidente na sucessão a Bettencourt. Sente que, nessa altura, a relação com a banca foi determinante para o resultado dessas eleições?
O José Eduardo Bettencourt depois de ter saído do Sporting foi ter à minha empresa e tivemos a conversa que devíamos ter tido dois anos antes. Tivemos lá muitas horas. Na altura eu ainda fumava e quando saímos dessa conversa saímos porque nos tinha acabado o tabaco aos dois. Depois, quando estava como vice-presidente no Sporting, o José foi-me visitar um dia ao estádio. Tivemos uma conversa bastante franca. Pode pôr-se tudo em causa no Bettencourt menos a sua seriedade como homem e o seu sportinguismo. Se é competente ou não, se contratou bem ou não, ... isso são outras questões.
Sente que hoje o Sporting respira melhor?
Não. Em que termos?
Em termos financeiros, mais pessoas no estádio, mais sócios, pavilhão, modalidades...
O pavilhão o próprio Bruno de Carvalho se queixa. O pavilhão está às moscas. Mas quando vemos um tipo dizer que 'fundou o Sporting', que antes não tínhamos pavilhão, fico incrédulo. Não tínhamos pavilhão? Eu vi o Sporting vencer uma Taça da Taças, contra o Novara, no pavilhão velho. Era o que tínhamos mas eram os nossos pavilhões. Chega um tipo e diz que eu é que fiz e mete uma frase debaixo do leão e diz 'eu é que fiz'. Eu comparo aquilo à estátua do Saddam a cair. É a primeira coisa que vai saltar quando ele se for embora. É de um egocentrismo, de uma vaidade, que fica mal a um funcionário do Sporting. Eu odeio pessoas que ajam como se fossem donas do Sporting. O clube é dos sócios e adeptos. É um património que não é palpável nem tomável por seja quem for.
Qual é a sua relação com Pedro Madeira Rodrigues?
Não temos qualquer relação. Independentemente de tudo, louvo-lhe a coragem, e isso apenas temos de louvar a Pedro Madeira Rodrigues. Estamos num país onde as pessoas normalmente só vão à luta sabendo que ganham. Ele, sabendo que ia perder e que ia perder por muito, foi à luta. Tem de se dar valor e reconhecer o seu sportinguismo. Deu uma tareia ao Bruno de Carvalho no debate antes das eleições, tanto que o presidente do Sporting andou três dias a responder-lhe no Facebook. O Bruno é muito bom nos monólogos.
Mas acha que Pedro Madeira Rodrigues teria condições para ser presidente do Sporting?
Depois do Bruno de Carvalho toda a gente tem condições para ser presidente. Eu comparo-o um bocadinho ao Trump. Porque é que Oprah não pode ser presidente? Depois do Trump toda a gente pode. A pessoa mais importante do Sporting, como já lhe disse, é o Jorge Jesus. O Sporting atual parece uma cozinha do Masterchef. É uma quantidade enorme de aventais e políticos...
Mas sente um Sporting vivo?
O Sporting vai continuar depois do Bruno de Carvalho, depois de toda a gente. Neste momento estamos a passar uma fase Erdogan ou fase Trump, mas outros virão. O Sporting é eterno.
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