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"Ver bem não significa que está tudo bem"

A propósito do Dia Mundial da Visão, a 13 de outubro, falámos sobre a relação entre diabetes e visão com Rufino Silva, médico oftalmologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e presidente da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia.

"Ver bem não significa que está tudo bem"

Entre os vários problemas que podem afetar a visão está a diabetes, doença que afeta mais de um milhão de portugueses, segundo os dados do Observatório Nacional da Diabetes. Como é tão comum, falámos sobre a relação, entre diabetes e visão, com Rufino Silva, médico oftalmologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbr, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e presidente da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia.

Ao Lifestyle ao Minuto, o professor começa por explicar que uma das consequências mais graves da diabetes é a retinopatia diabética, que pode sofrer complicações com a presença de edema macular diabético. Problema que é "a primeira causa de perda de visão, em Portugal, entre os 20 e os 70 anos".

Então, no Dia Mundial da Visão, a 13 de outubro, Rufino Silva explica este problema, as melhores formas de prevenção e tratamento. Além disto, o médico deixa ainda alguns conselhos, para a população geral, sobre a conservação de uma boa visão.

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Trata-se de uma doença própria dos diabéticos, mas é muito importante porque temos, em Portugal, um milhão e duzentos mil diabéticos e cerca de trezentos e cinquenta mil com retinopatia diabética 

O que é a retinopatia diabética? E o edema macular diabético?

Os diabéticos têm um risco grande de perder a visão e existem lesões que ocorrem na retina. Na maior parte das vezes, esta perda de visão é causada pela retinopatia diabética, uma lesão relacionada com várias alterações que surgem na retina, sendo a mais significativa a alteração da permeabilidade dos vasos que começam a deixar sair líquido para a retina e provocam o chamado edema macular. Isto é como no cérebro, não pode haver líquido fora dos vasos, se não temos o edema cerebral e, neste caso, temos o edema da retina. A retina não funciona bem com o edema. É a principal causa de perda de visão dos diabéticos e a primeira causa de perda de visão, em Portugal, entre os 20 e os 70 anos, portanto na idade em que a pessoa está a produzir. 

Notícias ao Minuto Professor Rufino Silva© DR

É importante dizer que em 90% dos casos esta perda grave de visão poderia ser evitada. Um bom controle metabólico e o tratamento atempado permitem que as pessoas conservem uma boa visão, durante toda a vida. Há muita coisa que tanto o doente, como as instituições podem fazer para prevenir esta perda grave de visão e evitar chegar a essas situações. Nomeadamente, é necessário fazer o controlo da diabetes, o rastreio ou, então, ser observado pelo médico oftalmologista. Tudo isto é de uma importância capital, porque quando não se é acompanhado, as lesões não são encontradas e não se tratam a tempo. Quando o paciente chega com perda de visão já é tarde. Às vezes conseguimos recuperar a visão perdida, mas não é igual a situações que resultam da prevenção e tratamento atempado. 

Trata-se de uma doença própria dos diabéticos, mas é muito importante porque temos, em Portugal, um milhão e duzentos mil diabéticos e cerca de trezentos e cinquenta mil com retinopatia diabética. Com perda grave de visão temos trinta mil. 

Muitas vezes as pessoas têm a retinopatia diabética, lesões já avançadas, e continuam a ver bem

Os diabéticos podem fazer algumas mudanças no estilo de vida para prevenir este problema?

É fundamental o controlo da glicemia, tensão arterial e colesterol. Assim como o exercício físico, portanto, as caminhadas de meia hora, por dia, são fundamentais. Tudo isto leva a que haja um melhor controlo metabólico e a probabilidade de virem a ter lesões na retina reduz de uma forma muito significativa. 

Entre as consequências da diabetes a retinopatia e a perda de visão é aquela que as pessoas mais temem porque cerca de 80% da informação que recebemos todos os dias chega através dos olhos. 

Quais são os principais sintomas?

Muitas vezes as pessoas têm a retinopatia diabética, lesões já avançadas, e continuam a ver bem. Portanto, regra número um, ver bem não significa que está tudo bem. Quando a pessoa começa a sentir algo já as coisas estão muito avançados. O ideal é que haja um controlo.

Um diabético tipo 1 tem que ser observado cinco anos depois do início da doença. Um diabético tipo 2 é logo a seguir ao diagnóstico ou a ida a um rastreio organizado pelo médico de família. Não pode ficar à espera de sentir algo, é a pior coisa que pode fazer. 

Quando surgem as lesões não é igual tratar alguém que começa com 70% de visão ou que começa com 10%. A última tem menor probabilidade de recuperar a visão. O ideal é fazer este seguimento e fazer o tratamento atempado.

Os diabéticos podem ver bem toda a vida se forem tratados adequadamente e fizerem uma boa prevenção.

Quando a doença está na fase mais avançada quais são os sintomas? 

O doente pode começar a notar as imagens distorçidas, dificuldade na leitura e na condução, pode notar sombras a passar no campo visual ou, em casos mais graves, pode simplesmente deixar de ver porque há uma hemorragia dentro do olho devido à retinopatia diabética. Já são casos muito avançados e quando nos chegam, nesta altura, já são situações extremas. 

Quando o problema é encontrado cedo é tratável? 

Sim e as pessoas conservam uma boa visão durante muitos anos. Os diabéticos podem ver bem toda a vida se forem tratados adequadamente e fizerem uma boa prevenção. As lesões podem aparecer, mas num diabético que está bem controlado aparecem muito mais tarde e não são tão graves. 

Quem são os diabéticos mais em risco de ter este problema?

Classicamente, nós dizemos que são os diabéticos tipo 1, porque são diagnósticos feitos antes dos 30 anos, que iniciam logo o tratamento com insulina. Existem variações mas como estes têm a doença durante mais tempo estão mais em risco - a duração da diabetes também conta muito para o aparecimento destas lesões. Pessoas com diabetes tipo 1 devem prestar muito mais atenção à necessidade de serem observados.

Já nos diabéticos tipo 2 a progressão é mais lenta, mas existe uma questão, é que muitas vezes nós não sabemos há quanto tempo é que a pessoa é diabética. Normalmente são pessoas que poderão não ter ido ao médico nos anos anteriores. Ainda nos chegam muitos diabéticos que não sabiam que o eram em fases muito avançadas da doença. 

Quais são os tratamentos mais eficazes?

A causa principal da perda de visão é o edema macular e fazemos injeção intravítreas [nome dado a injeções que são administradas dentro do olho]. São tratamentos que permitem que o edema desapareça e que a retinopatia diabética até melhor. Nos casos mais extremos fazemos cirurgiã. 

Os diabéticos não têm alta

Como é que as listas de espera, no serviço público, estão a prejudicar as pessoas com este problema? O atraso foi provocado pela pandemia ou já acontecia antes?

Durante a pandemia as listas de espera, ao contrário do que se pensava, não aumentaram, mas sim diminuíram. Isto porque os cuidados primários que encaminhavam os doentes para a sua especialidade, neste caso oftalmologia, estavam ocupados com a Covid-19. Isto trouxe um problema porque agora as formas que nos chegam são muito mais graves.

Os tratamentos, para este problema, têm de ser feitos de uma forma sequenciada e regular para que se recupere a visão. A capacidade de resposta do SNS é boa, mas obviamente pode ser melhorada, e creio que o vá ser. Não é, no entanto, tanto na questão de lista de espera, mas sim na capacidade de resposta dos serviços para atender pessoas com estas patologias e outras na área na oftalmologia. Não é tanto a questão da lista de espera, mas sim a de uma resposta atempada que deve ser mantida no tempo.

Mesmo que o tratamento seja bem sucedido é necessário continuar atento?

Sim. Os diabéticos não têm alta. Continuam com a doença, portanto, têm de ser vigiados, ao longo da vida, no que se refere também à retinopatia diabética. Algo que ocupa, portanto, um espaço grande nos recursos existentes nos hospitais, mas tem de ser assim. Porque uma coisa é tratar uma situação aguda, a pessoa tem alta e está resolvida, outra coisa é tratar doenças crónicas, em que a resposta tem de ser mantida ao longo da vida. 

O problema pode acontecer outra vez? 

Sim, o edema macular pode estar bem, assim como a diabetes, e tornar a aparecer. Portanto, a retinopatia diabética está sempre presente para quem a tem (existe uma percentagem pequena de diabéticos que não a tem). Quando necessário voltam-se a fazer os tratamentos, no entanto, em indivíduos que estão mais controlados e fazem exercício físico, a probabilidade é menor.  

Existem outros problemas que podem causar perda de visão em diabéticos?

A retinopatia é o mais comum e mais grave, mas pode haver também uma isquemia do nervo ótico, mas o fundamento é o mesmo, é o sangue que não chega lá. Os diabéticos perdem a visão pelo edema macular, mas não só, nas formas mais avançadas, também podem perder a visão porque há uma hemorragia dentro do olho.

Que cuidados é que a população, em geral, deve ter com a visão? 

Nós utilizamos a informação que recebemos no dia a dia e em tudo o que fazemos através da visão. A importância que damos aos nossos olhos e à nossa saúde ocular poderá resultar numa boa visão ou má. Há várias doenças que podem aparecer, a nível ocular, como a  degenerescência macular da idade, está associada à retina, pode ser prevenida ou tratada atempadamente. É uma doença que aparece mais depois dos 60 anos e nestes casos a prevenção passa por uma observação periódica com o médico oftalmologista. 

Nunca se deve esperar para ver mal para ir ao médico oftalmologista. As crianças, entre os dois e os quatro anos, devem fazer o rastreio de saúde visual, centralizado no médico de família, e que é excelente para evitar situações que podem durar para o resto da vida, como o olho preguiçoso. A partir daí as crianças devem ser observadas a cada cinco anos se não existir nenhuma patologia.

Depois dos 40 e até aos 55 devem ir ao médico a cada três ou quatro anos. A seguir é aconselhada uma avaliação periódica, feita pelo médico oftalmologista, mesmo que se esteja a ver bem. Por exemplo, outra doença que aparece, depois dos 40 anos é o glaucoma que também não provoca sintomas, assim como outras doenças. Entre os 55 e os 65 anos a cada dois ou três anos e a partir daí a cada um ou dois anos. Assim é possível detetar atempadamente, diagnosticar as doenças em fase inicial e começar o tratamento, evitando-se situações graves. 

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